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Engolido por ele mesmo

Bolsonaro ressuscita Lula, se perde e fica em modo desespero

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Mathuzalém Júnior* - Foto Antônio Cruz

Diz um velho ditado que não se pode prever ou antecipar o que sairá da cabeça de juiz, da barriga de mulher grávida e do bum bum de neném. Interessante e bonitinha, essa máxima ainda pode ser aplicada em uma série inimaginável de situações. Entretanto, em relação à política ela está absolutamente superada. As eleições de 2018 e as de 2022 são a prova de que o povo também se equivoca. Em 2018, Bolsonaro surgiu do nada, se cacifou com uma ação extemporânea e ganhou uma disputa em que o adversário se portou como verdadeiro poste. Passados quatro anos e, após um governo de nada vezes nada, o cenário é diferente de tudo que já foi visto na terra descoberta por Cabral.

Luiz Inácio ainda não é pule de dez. No entanto, contra um esquema pesado, grotesco e violento, deve vencer a corrida presidencial com relativa folga. Nas mesas de bares, filas de banco e redações de jornais, TVs, rádios e sites, as discussões e ações são no sentido de avaliar os números para saber se a vitória ocorrerá no primeiro ou no segundo turnos. Pelo menos é esse o indicativo de todas as pesquisas de intenção de votos, inclusive aquelas requisitadas e bancadas pelo governo. Esse panorama de otimismo e de positividade pode até ser exagerado, mas, quer queiram ou não, é real e já resultou em luzes amarelas e vermelhas por todo o entorno dos palácios do Planalto e da Alvorada.

Exageros à parte, a verdade é que, incontestavelmente, o contexto é novíssimo. Há um ou dois anos, o quadro era terrivelmente triste e amplamente negativo para o petismo, principalmente para o lulismo. O que mudou ou o que fez mudar o horizonte? Pergunta fácil, reposta rápida. Quem gerou essa nova perspectiva e refez a cena política nacional foi o próprio Jair Messias Bolsonaro, também conhecido por mito nos cercadinhos fanatizados e dominados pelo ódio, cujo bem maior foi ressuscitar Lula. A maior prova dessa afirmação é a nova posição dos ministros aposentados do Supremo Tribunal Celso de Mello e Joaquim Barbosa. Antigos e ferozes algozes do PT e de Lula, ambos são os novos fãs do ex-presidente. E sabem por quê? Porque assumidamente não “tragam” o atual mandatário.

Caso se confirme a provável derrota, Bolsonaro será o principal responsável pelo fracasso eleitoral do governo em que Deus acima de tudo foi somente um bordão sem graça, sem nexo e sem qualquer religiosidade. Ou seja, perderá para ele mesmo, que, desnecessariamente, transformou um Ser Supremo em discurso sem nenhum virtuosismo. Pelo contrário. Em síntese, o usuário do slogan não dispõe de méritos suficientes para elevar o nome de Deus a uma altura que ele (o usuário) jamais alcançou. Voltando ao resultado eleitoral, se Lula da Silva ganhar – e tudo indica que isso vai acontecer – o tenente presidente terá de humildemente assumir a culpa pelo revés. Se não assentir, estará provado que não estava preparado para disputar, governar ou tentar a reeleição, muito menos para perder uma contenda que esteve ganha durante longo período.

O Brasil e o mundo não têm culpa do seu despreparo. Quando tudo parecia contribuir para a perpetuação de Bolsonaro no poder e do bolsonarismo como conceito político, eis que o grande público descobre o que a família, o petit comité e os bastidores palacianos já sabiam há séculos: o lado antissocial do presidente sempre encobriu seu despreparo para a função de líder de uma nação continental, diversa e com idiossincrasias que ele nunca procurou conhecer. Em resumo, acabou sendo mocinho e vilão do mesmo filme. O brasileiro que apostou em mudanças em 2018 está cansado e torce por variantes definitivas. O país não se sustenta mais com meia sola.

Pior é aturar um presidente com adjetivações pra lá de negativas. Lamentável afirmar, mas como aceitar como líder um cidadão antidemocrata, unilateral, violento, ameaçador e carregado de soberba, grosseria, tirania, despotismo, homofobia, racismo, misoginia, entre tantas outras citações? Se serve como consolo, vale registrar que a queda nem sempre é ruim. Às vezes, ela ensina que aquele não era o caminho. Mais enfático, é lembrar que a derrota deveria ser nosso mestre, não nosso coveiro. Parafraseando o professor Leandro Karnal, “O fracasso é um quarto confortável. O sucesso é um quarto desafiador”. É hora de mudar. Mudemos para impedir que cheguemos ao inferno.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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