A menos de cinco meses das eleições presidenciais, a dúvida sobre em quem votar incomoda pelo menos metade dos 150 milhões de brasileiros aptos a ir às urnas. Dúvida talvez não seja o termo mais correto. O grande problema do Brasil hoje é que estamos entre a cruz e a espada. De forma mais clara, marchamos preocupados com o passado recente, de olho no futuro, mas acompanhando pelo retrovisor a frenética movimentação das viúvas de um período que parecia distante. A cruz e a espada são os sobrenomes metafóricos dos dois candidatos em condições de vencer o pleito que se aproxima.
Um governou por longo tempo, mas, inquestionavelmente, cometeu erros grosseiros de conduta. Também surpreendeu alguns de seus eleitores com uma soberba inexplicável para alguém do povo. Algumas dessas falhas lhe custaram a liberdade, muitos correligionários, alguns parceiros políticos, além de caminhões trucados de eleitores. Definidos pelo prefixo anti, esses votos acabaram transferidos irresponsavelmente para o adversário. Literalmente verde, inexperiente e absolutamente despreparado para gerir um condomínio, o outro dorme, acorda e sonha diariamente com a volta do arbítrio.
Uma pena termos voltado ao estágio da ausência de alternativas. Não existem mais cores, tampouco amores. Entre o medo e a esperança, o suposto anjo e o temido demônio, sobraram as dores. Nos restaram o abismo e o precipício. Poetizando o provável resultado de outubro, feliz daquele que, esquecendo as aparências, consiga eleger alguém que mostre alguma verdade. Como nossa realidade está bem próxima da ficção, provavelmente quem vencer não será pelos próprios méritos, mas principalmente pelos deméritos do outro. Foi-se o tempo em que vencia o candidato com projetos, propostas e discursos convincentes.
Hoje, associado à força, votamos contra este apenas porque aquele disse que ele roubou, que seu partido é o da boquinha. Considerando corretas as afirmações, qual a diferença entre um e outro? Tanto quanto aquele que critica, o governo terrivelmente honesto afogou-se em um mar de ilicitudes ainda não explicadas. Escudado exclusivamente em ameaças e gritos desconexos, determinados candidatos fizeram questão de esquecer do anabolizante político conhecido por voto, cuja importância é desmerecida sistematicamente pela turba do cercadinho. Para esse grupo, o voto é apenas um retrato na parede. Acham que basta um cabo e um soldado para consolidar um governo. Pode ser, mas faltará – como falta – um governante.
Também ficaram no passado os ensinamentos sobre formas de priorizar a comunhão entre as diferenças. Hoje, é clean defender torturadores, endeusar deputados federais, senadores, ministros de Estado e magistrados que desrespeitam a Constituição. Pior é a defesa de um regime que pouco produziu de bom para o país e para o povo. As viúvas do período ditatorial saíram dos buracos. Como ficaram na moita por 37 anos, é natural que tenham esquecido que tirania é o purgante natural de qualquer época e lugar. Parodiando uma resposta de Carlos Lacerda a um questionamento de Ivete Vargas, o mentor e os apoiadores do golpe são o efeito.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978