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Brahma, primeiro entre os hindus, é esquecido como quem ‘bebe uma’

A transição do ‘profissão repórter’ (tomando emprestado programa-título do Caco Barcellos) para um futuro cronista que insiste em manter o hábito de sentar-se defronte a um teclado, tem muitas vantagens. A principal delas é tempo para navegar pela internet e assistir séries históricas (muitas delas baseadas na História) que apresentam cenas de ação com viés mitológico. Descobre-se, a partir daí, que a mitologia é um mundo à parte. Como os cenários que podemos desenhar a partir dos hindus – com crenças que, Ele me permita, até Deus duvida. Então, vamos lá.

Para quem não conhece, pode-se dizer, com a certeza de uma ciência exata, que nas profundezas da mitologia hindu, há um universo repleto de histórias fascinantes que tecem a tapeçaria do tempo e da existência. A cada manhã, o Sol nasce no horizonte como uma promessa de renascimento e esperança, refletindo o eterno ciclo de destruição e criação que é o cerne do mundo mitológico.

Imagine um reino celestial onde os deuses dançam ao som das vibrações do Universo, e os demônios, com suas formas grotescas e corações cheios de desejo, tramam para conquistar o mundo dos mortais. Nesse vasto cosmos, existe Shiva, o destruidor, que espalha passos em sua dança cósmica de destruição. É o Tandava; não apenas um movimento físico, mas uma pulsação que ressoa por toda a existência. Um lembrete de que o fim é sempre o prelúdio de um novo começo.

Ao seu lado, Parvati, sua consorte, simboliza a energia divina da criação e do amor. Juntos, eles representam o equilíbrio perfeito, o yin e o yang, o masculino e o feminino. Não muito distante, vemos Vishnu, o preservador, aquele que mantém o Universo em harmonia, dormindo sobre as águas infinitas, protegido pelo seu fiel servo Shesha, a serpente cósmica. Vishnu é o deus que se manifesta de diversas formas, como Krishna e Rama, para restaurar o Dharma, a ordem cósmica, quando o caos ameaça dominar.

E há Brahma, o criador, que com seus quatro rostos, observa todas as direções, testemunhando o passado, o presente e o futuro simultaneamente. De sua mente surgem os Vedas, os textos sagrados que contêm o conhecimento necessário para a vida. Brahma, porém, é muitas vezes esquecido nos rituais e oferendas, um lembrete irônico de que até o criador pode ser negligenciado pela própria criação.

Mas, talvez, o mais intrigante seja a jornada de cada alma individual, simbolizada pela épica batalha do Mahabharata e a busca pelo conhecimento em textos como o Bhagavad Gita. Nesses escritos, encontramos Arjuna, um guerreiro cheio de dúvidas e medos, parado no campo de batalha de Kurukshetra, incapaz de decidir entre a lealdade à sua família e seu dever como guerreiro. Nessas situações, Krishna, seu guia divino, lhe revela a verdade última: a alma é eterna, além do corpo físico, e o verdadeiro propósito da vida é cumprir o próprio Dharma sem apego aos frutos da ação.

Essa filosofia ressoa como um eco distante em nossas próprias vidas modernas. Quantas vezes nos encontramos parados no campo de batalha da vida, hesitantes entre o que é certo e o que é fácil? Quantas vezes buscamos respostas fora de nós mesmos, quando a sabedoria eterna já reside dentro de nossos corações, esperando ser despertada pela voz suave de um guia interno?

A mitologia hindu, observa-se, não é apenas um conjunto de histórias antigas; é um espelho que reflete nossas próprias lutas, medos e aspirações. Ela nos convida a dançar com Shiva na tempestade da vida, a descansar com Vishnu nas águas da serenidade, a criar com Brahma nas infinitas possibilidades do agora, e a amar com Parvati no sagrado espaço do coração. Descobre-se, com isso, que a mitologia hindu nos lembra que somos todos parte de um grande drama cósmico, onde cada ato tem um papel a desempenhar, cada emoção uma lição a ensinar, e cada vida um pedaço da grande tapeçaria divina que é o Universo.

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