Há exatos 30 anos, com a posse do então vice-presidente eleito José Sarney, que assumiu interinamente o comando do país, teve início no Brasil o período que ficou conhecido como Nova República. Naquele dia 15 de março de 1985, com a doença do presidente eleito Tancredo Neves, que havia derrotado o candidato dos militares, Paulo Maluf, no Colégio Eleitoral, o ex-governador maranhense tornava-se o primeiro presidente civil do Brasil, após quase 21 anos do golpe militar de 31 de março de 1964.
A Nova República, ou sexta República, é marcada pela redemocratização política do Brasil, depois de mais de 20 anos de um governo caracterizado pela repressão política, que se iniciou com a deposição do presidente João Goulart em 1964. Em janeiro de 1985, a chapa da Aliança Democrática, formada pelo ex-governador de Minas Gerais Tancredo Neves e pelo senador José Sarney, ambos do PMDB, vence, em eleição indireta no Colégio Eleitoral, a disputa pela Presidência da República.
Na véspera da posse, no dia 14 de março, Tancredo passa mal e é internado com sintomas de apendicite. Com a hospitalização de Tancredo, o vice-presidente eleito José Sarney é empossado na manhã de 15 de março. O então presidente da República, João Figueiredo, deixa o palácio do governo sem passar o comando do país e a faixa presidencial para José Sarney. Figueiredo recusou-se a entregar a faixa após ser alertado de que Sarney assumira como substituto de Tancredo, e não como sucessor de Figueiredo.
De 15 de março a 21 de abril, José Sarney comanda o Brasil interinamente, já que Tancredo permaneceu internado nesse período, vindo a morrer em 21 de abril, dia do mártir do líder da Inconfidência Mineira e mártir da Independência Tiradentes. Com a morte de Tancredo, Sarney assume de fato o cargo de presidente da República e honra a grande maioria dos Compromissos com a Nação firmados pela Aliança Democrática e garantidos por seu candidato, Tancredo Neves, durante a campanha eleitoral.
Entre os compromissos assumidos pela Aliança Democrática e cumpridos por Sarney, estão eleições diretas para todos os cargos, legalização de partidos políticos que haviam sido postos na clandestinidade, convocação da Assembleia Constituinte, que instituiu o Estado Democrático de Direito, e a concretização da transição democrática no Brasil. Nessa transição, o governo Sarney acabou de vez com a censura à imprensa, legalizou plenamente o sindicalismo e as grandes centrais sindicais. A transição do regime militar para o civil se deu sem derramamento de sangue e sem grandes protestos.
O dia 15 de março é considerado por cientistas políticos e por boa parte da população brasileira como um marco na história do Brasil. Para o cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) Malco Braga Camargo, é fundamental comemorar a data de hoje até para que as pessoas fiquem alertas para evitar um retrocesso. Malco entende que a transição feita na época foi a possível. “Acho que foi a possível naquele contexto. Mais importante do que comemorar os fatos da transição é lembrar os tempos sombrios [da ditadura] para que eles não se repitam, principalmente quando vivemos uma crise como a de hoje.”
Para o cientista político Murilo Aragão, a entrega do poder dos militares para os civis há 30 anos deveria ser mais lembrada e divulgada pela importância dessa transição. “É muito importante, porque são 30 anos de redemocratização. Tivemos muitos avanços, mas ainda falta avançar em muitos pontos. Estamos longe do ideal. Precisamos avançar na legislação partidária e eleitoral”, afirma Aragão.
Para o analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Queiroz, o dia 15 de março de 1985 simboliza o restabelecimento da democracia no Brasil. “Foi nesse dia que se deu a partida para acabar com o entulho autoritário, que teve início o restabelecimento dos partidos e o processo de convocação da Constituinte. São alguns marcos históricos.”
Queiroz lembra que, com a doença de Tancredo e a posse de Sarney, houve uma grande decepção do povo, porque Tancredo simbolizava todo aquele momento de esperança, renovação e, de repente, “o povo vê assumir o comando do país um ex-presidente do partido do regime militar”. De acordo com o analista político, o nível de tolerância, paciência e sangue frio do presidente Sarney foram fundamentais para a redemocratização do Brasil.
Na primeira eleição direta para a Presidência da República após a ditadura militar, em 1989, o vencedor foi o ex-governador de Alagoas Fernando Collor, que ficou menos de dois anos no poder. Após um processo de impeachment, Collor perdeu o cargo e foi substituído pelo então vice-presidente Itamar Franco. O segundo presidente no período da Nova República foi Fernando Henrique Cardoso, que foi reeleito e, depois de oito anos no poder, passou a faixa presidencial para Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-sindicalista também disputou o segundo mandato e foi vencedor.
Após oito anos como presidente, Lula transmitiu o cargo para sua candidata, Dilma Rousseff, primeira mulher a ocupar a Presidência da República no Brasil. Reeleita em outubro do ano passado, Dilma exerce há dois meses e meio o segundo mandato.
Iolando Lourenço, ABr