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Levando aos trancos e barrancos

Brasil cidadão é sonho sonhado na rabeira da igualdade social

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Mathuzalém Júnior - Foto Paulo Pinto/ABr

Após quase cinco décadas, a Constituição de 1988, um dos marcos do processo civilizatório do Brasil, assegurou formalmente a cidadania plena para todos os brasileiros. O novo ciclo democrático inaugurado pela Carta Magna, associado aos avanços sociais obtidos nos dois primeiros governos de Luiz Inácio, contribuiu para a melhoria do padrão de vida da população, especialmente dos mais pobres. No entanto, por conta de fatores diversos, o texto constitucional ainda não alcançou o objetivo de construir uma sociedade civilizada e socialmente justa. Por exemplo, o constituinte previu um regime de participação que, se fosse exercido em sua totalidade, aproximaria o país de um sistema participativo.

E qual é a diferença? Na democracia direta, os cidadãos são responsáveis pelo destino de suas cidades, enquanto na indireta são eleitos representantes para tal. Em ambos os casos, os que detêm o poder de decisão têm a responsabilidade de não deixar propostas que beneficiam o povo se perderem no meio do caminho. É o que acontece com os projetos sobre distribuição de renda. O Brasil continua sendo um dos países mais desiguais do mundo. As raízes dessa marca negativa foram ditadas pela industrialização tardia, pela curta e descontinuada experiência libertária e, sobretudo, pelo longo passado escravocrata, cujo legado foi uma massa de analfabetos sem cidadania.

O tempo passou, o mundo mudou, mas o Brasil não consegue superar o desafio de ser um país mais igualitário, perpetuando a condição de renda média baixa. Ao contrário das nações desenvolvidas, mantemos travada a ideia da transição para uma economia de renda alta. Em outras palavras, permanecemos no passado, embora achemos que somos do futuro. É claro que podemos ser. E seremos. Para isso, é necessário que nossos postulantes a cargos eletivos, particularmente o de presidente da República, se comprometam publicamente com os ideais da Declaração dos Direitos Humanos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembleia Nacional da França em 1789, reconhecida como um pacto civilizatório sem precedentes na história do planeta.

Relativamente aos direitos humanos, temos avanços significativos no Brasil, entre eles a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a Lei Maria da Penha, O Estatuto da Criança e do Adolescente e as Audiências de Custódia. Todavia, ainda estamos muito distantes da excelência, que é a republicanização dos poderes constituídos e a priorização permanente dos valores civilizatórios maiores e perenes. Os desafios são muitos. O primeiro passo deve ser uma nova reflexão do marco civilizatório da humanidade, com base na unidade global. Partindo desse pressuposto, se não pensarmos na defesa da vida, em um Estado forte, na inclusão pelo direito e pela renda, no respeito pelo multilateralismo das nações, na criação de uma cultura de paz e de boa convivência entre os diferentes e, fundamentalmente na consolidação da democracia, jamais alcançaremos os objetivos almejados.

Tema inesgotável e em permanente disputa, a democracia brasileira, após claros e sérios riscos recentes, está em reconstrução e parece bem próxima da consolidação. Democracia é sinônimo de livre manifestação, de participação dos processos e da construção de uma nação. É, também, a garantia de condição de igualdade de ensino, alimentação, transporte, locomoção e no acesso a bens e serviços produzidos pela nação ou pela comunidade em que vive. A ressurreição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva amenizou o cenário do país e praticamente enterrou o golpismo, cujo ápice ocorreu em 8 de janeiro passado e, como tragédia anunciada, só foi contido graças à indignação das forças de vanguarda. A democracia é como o direito à vida. Como diria o poeta contemporâneo, viver é o ato de amar e ser feliz.

Embora seja apenas o termo representativo de um sistema de governo, democracia é como o ar, a água e o feijão com arroz. Sem eles, não temos vida. Para que não se torne zumbi, o povo precisa lutar por condições iguais, de modo que possa conviver, pacífica e convergentemente, com a sociedade que se espera moderna e civilizada. Uma sociedade dividida entre vertentes normalmente briga por causa de políticos, quando o ideal seria brigar por igualdade de direitos em itens sagrados como a educação, alimentação, saúde, segurança e moradia. Assim como o melado e a aguardente são extraídos da mesma cana, a corrupção e os malfeitos são inerentes ao homem desse ou daquele lado. Isto quer dizer que, ao eleger seu representante, não escolha ninguém passível de adestramento. Opte sempre por quem tem consciência política e não admite ser considerado um político de estimação. Ser daqui ou dali depende da exata posição do indivíduo no tempo e no espaço. Eis a eterna relatividade do convívio.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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