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País desgovernado

Brasil ford-se sem oxigênio, sem luz e sem vergonha

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior*

O que será do Brasil sem a Ford? Se houver governo, continuará existindo e chamando a atenção do mundo por suas riquezas naturais, pelo grande mercado consumidor que representa e, sobretudo, pelo volume de água e de oxigênio que ainda tem de reserva e que, no futuro, poderá servir para mata a sede e garantir a respiração de milhares de milhões de pessoas em todos os continentes. Esse é o motivo da briga das principais lideranças mundiais com o presidente Jair Bolsonaro, que defende o salve-se quem puder. Na verdade, deixamos de ser o pulmão do mundo justamente no Amazonas, onde falta oxigênio para manter vivos os manauaras infectados pela Covid-19 e esquecidos por Pai Zuello. Brincadeira.

Esse imbróglio com os países desenvolvidos é muito antigo. Novo é a nossa incapacidade de proteger um bem de valor imensurável e, que brevemente poderia nos render polpudos dividendos. Pior do que brigar é rejeitar ajuda de países economicamente viáveis. Não sabemos como fazer e não aceitamos ajuda de quem sabe e tem como fazer. É o que dá querer governar para familiares e meia dúzia de seguidores ferrenhos e dispostos a morrer de sede e sem ar. Que morram em paz. Tudo em nome de uma soberania que, caso pesquisemos detalhadamente, descobriremos que perdemos faz séculos. Talvez nunca a tenhamos.

Medir forças com tem tutano em vez de fel na cabeça e no coração é tempo perdido. Por isso, os presidentes de grandes nações decidiram nos esquecer. Preferiram o medo à pólvora seca anunciada recentemente pelo capitão. Não sei se é o caso da montadora Ford, que abandonou o Brasil, mas permaneceu no Uruguai e na Argentina, onde o câmbio ainda é mais sensato, ou seja, o dinheiro por lá é mais barato. O problema – ou a solução – é que fabricarão de lá e nos venderão cá mais em conta. Não sou economista e jamais pensei aventurar-me pelos números, mesmo de brincadeira. Ocorre que a ocasião faz o ladrão. De tanto ouvir quem entende traçar um quadro sombrio, resolvi esticar minha corda mental para ver se chegarei à máxima de que a Ford é só uma empresinha a deixar o Brasil.

Pensei rápido e conclui a desnecessidade de atingir o ápice da loucura e afirmar, como o presidente Bolsonaro, que, apesar dos 100 anos em solo brasileiro, a Ford já foi tarde e não precisamos mais dela. Claro que precisamos. E muito. Se não pelo peso da empresa e pelos milhares de empregos que gerava, quem sabe para recuperar os milhões de reais transferidos à indústria pelo BNDES à época dos governos do PT. Fundamentalistas do bolsonarismo usaram as redes sociais para espalhar que haviam escolhido o ex-ministro petista Jaques Wagner para cobrar os valores. Ao que parece, quem emprestou foi o governo brasileiro. Se o atual ocupante do Palácio do Planalto e seus ministros não têm essa competência, será perfeitamente lógico um pedido de ajuda à turma do PT.

Desagradável imaginar essa hipótese, mas é de fácil entendimento. Para muitos, melhor quem fez e levou do que quem leva e nada faz. A verdade é que o mercado brasileiro estava estagnado e piorou após a pandemia. Éramos grandes, mas, a exemplo de outras praças, nos apequenamos diante do vírus, cujos malefícios continuam sendo minimizados por quem tinha a obrigação de maximizá-lo. Não devemos ter dúvidas de que virá a recuperação. Também não duvidemos de que a crise ultrapassará este governo Bolsonaro. Tomara que não haja um próximo, pois corremos sério risco de perder a competitividade que nos resta. O alerta da maioria é que a saída da Ford acende o alerta da necessidade de reduzir o Risco Brasil, mecanismo que expressa a probabilidade de insolvência de um país frente aos investidores estrangeiros.

Não tenho esse conhecimento. O que sei é que estamos sem oxigênio no Amazonas, já ficamos sem luz no Amapá e sem dinheiro para manter vivos os que precisam comer durante a pandemia. O pior é que agora estamos sem vergonha. Memes de lá, memes de cá. A semana foi recheada deles na rede. De um lado, a vetusta indicação de Wagner para cobrar a dívida. De outro, as pilhérias do tipo “Era só Fiesta com Lula e Dilma”, “O povo tinha vida Del Rey”, “Fusion churrasco toda hora”, “O Focus da elite era acabar com isso”, “Fizeram a classe média Ranger os dentes”, “Até minha tia Verona bateu panelas lá no Pampa onde vive”, “Agora ela Courier atrás de emprego”, “Votou no Bolsonaro então Ford-se ! Ka Ka Ka Ka.

Não tenho simpatia pelos extremismos do PT, muito menos pelos do bolsonarismo. Entretanto, não nego que, na dúvida, voto nos memes menos tresloucado, no mais engraçado, no menos feudal, consequentemente no mais democrático. E aí, embora reconheça a ranhetice das duas correntes, melhor escolher quem elegeu e sumiu junto com seu poste, negou – e nega o que fez , apanhou, foi expurgado, preso, solto, continua negando, mas, justiça seja feita, nunca acusou a imprensa de conivente ou culpada de suas cagadas. Positivo disso tudo é que, sem qualquer conotação sarcástica, lembro um querido amigo baiano, para quem as cacas do governo federal decretaram o fim do mito de que militares são mais preparados e honestos que os civis. Claro que há exceção, mas voto com o relator. Tenho dito.

*Mathuzalém Junior é jornalista profissional desde 1978

 

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