Notibras

Brasil precisa de jeito e não de força para mudar

No último dia de 2024 a pergunta que não quer calar é simples: o Brasil tem jeito? Decerto que sim. Para isso, é imperativo votar em quem age com ética, transparência e respeito, deixar de se omitir nas questões públicas e, principalmente, exigir mais seriedade e honestidade de nossos governantes e de nossos políticos. A solução do país está em nós. O primeiro passo é deixarmos de avaliar como anormais as pessoas éticas. O segundo é lutar para que o termo “Vossa Excelência” deixe de ser um palavrão. O terceiro e mais importante é mudarmos o timing do progresso. Hoje, o Brasil só progride à noite, isto é, quando os políticos estão dormindo. Isso quer dizer que, semântica ou metaforicamente, não dormir é a palavra de ordem. Portanto, temos jeito.

É claro que há muito para chorar e para se revoltar no Brasil de nossos tempos. Para sorte desse mundão de gente que habita esta nação, algo bem próximo dos 220 milhões, ainda sobram resiliência, voluntariado, solidariedade e uma baita vontade de colaborar com o próximo. O Brasil não é para principiantes, mas progride à noite. Há registros de alguns milhares de negacionistas, de divisionistas e de patriotas às avessas que usam a escuridão para tramar contra a pátria. No entanto, o contraponto é pra lá de alvissareiro. Na catástrofe climática do Rio Grande do Sul e nas recentes tragédias rodoviárias, aéreas, marítimas e ambientais, vimos e revimos seres humanos entrando na lama e se arriscando em enchentes para salvar outro ser humano ou animais de estimação.

Diante do caos que experimentamos durante o terrível período da pandemia de Covid 19, quando, felizmente, a maioria optou pela vacina, pelo menos conseguimos vencer a fase em que o país chegou a ser desenganado por todos os que pensavam no futuro. Talvez estejamos bem perto da regeneração. Torçamos para que isso ocorra simultaneamente ao fim do sonambulismo de nossos homens públicos. Torçamos para que, antes que acabem com o país, os políticos se deem conta de que não servem para nada, peçam para ir ao banheiro e desapareçam. Apesar dos improvisos e dos excessos ideológicos de parte a parte, caminhamos a passos largos para a consolidação da democracia. A menos que ocorra um cataclisma golpista, continuaremos a ser vistos pelos estrangeiros como um dos povos mais criativos do mundo globalizado.

Até o jeitinho sem pressa chama a atenção de quem nos visita. Somos uma nação extremamente rica em biodiversidade e em recursos naturais, de cultura multifacetada e fértil, de diversidades, de fartura agropecuária, com festas tradicionais, turismo de aventura e com alegria para dar, vender, emprestar e dividir com os mais radicais. O céu realmente é o limite para os brazucas. Não à toa, o brasileiro é visto diariamente como um povo que precisa ser longa e positivamente estudado pela Nasa. Eis a razão pela qual o jornalista, historiador e advogado Luís Câmara Cascudo (1898-1986) criou a frase conhecida de todos e que já serviu para numerosas campanhas publicitárias: “O melhor do Brasil é o brasileiro”.

Alguém duvida? Fora as neuras ideológicas e mitológicas, duvido que alguém duvide. Definitivamente, a população nativa é o que há de melhor neste solo desde sempre habitado pelos indígenas, mas folcloricamente descoberto pelo português Pedro Álvares Cabral. Embora muitos façam de conta que não estão nem aí, “estamos a dois passos do paraíso”. Não sei por que alguns brasileiros decidiram dizer bye bye para esta terra onde se plantando tudo dá. De forma verdadeira, sem politicagem e no compasso do samba, meu coração pulsa em verde e amarelo. Por isso, amo de Norte a Sul. O passado recente parece ter cutucado a maioria dos nativos.

O cutucão nos deu a certeza de que a verdadeira grandeza do Brasil está em nossa capacidade de se reinventar e de aprender com a própria história. Além dos sotaques, da mistura de cores e de ritmos, tem coisas que, como a jabuticaba e o açaí, só têm por aqui. Seguindo a máxima do filósofo Paulo Freire, mantenho a esperança viva como se ela fosse um ato revolucionário. Concordo com o escritor Jorge Amado, para quem somos um pouco surrealistas. Entretanto, como renunciar a uma miscigenação que nos permite aceitar o Mermão carioca, o Ô loco, meu paulistano, o Oxente nordestino, o Tchê, a Guria e a Bobiça do Sul e o Égua dos nortistas? No Ano Novo que se avizinha o que desejo é que nossos homens públicos deixem de lutar pelo progresso próprio e, quem sabe, o Vossa Excelência volte a ser apenas um pronome de tratamento. Para mudar o Brasil não há necessidade de força. Basta jeito. E jeitinho os brasileiros têm de sobra.

…………………….

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

Sair da versão mobile