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Brasil precisa entender que há vida além de Lula e de Bolsonaro

Uma das maiores contradições da atual política brasileira, a polarização entre Luiz Inácio e Jair Bolsonaro estranhamente convive com um espectro de pulverização partidária somente vista no Brasil. São 29 legendas registradas no Tribunal Superior Eleitoral e, conforme o noticiário diário, não servem para nada, na medida em que não dispõem de nomes capazes de fazer frente à dupla que treina para o revezamento 4 por 4 (período de uma eleição para outra), de modo a se perpetuar no poder. Se servissem não estariam a reboque de pessoas com as quais estão vinculadas exclusivamente pelo dinheiro.

Sem ideias, apelo político, integrantes inteligentes, ideologia e projetos, a maioria desses partidos (na verdade quase todos) vaga e manqueja dia e noite em busca de brechas para solapar o país e o povo. Também sem conteúdo pragmático ou destinado à realização de algo produtivo, diria sem medo de críticas que nenhum deles tem razão alguma para existir. Criados e registrados para enriquecer meia dúzia de espertos, eles atuam mais como prostitutas de beira de cais do que como rufiões de boates instaladas em bairros nobres das grandes cidades.

Copiando o estilo dos mercadores da fé, não passam de sugadores do dinheiro dos contribuintes, eventualmente depositado nos cofres da viúva. O grosso da arrecadação é religiosamente repassado para os caciques. Como caixas registradoras, essas siglas também se prestam a sustentar políticos aposentados ou defenestrados da vida pública, os quais, travestidos de dirigentes partidários, de ex-presidentes da República ou de companheiros do líder, vivem às custas do robusto e extorsivo fundo eleitoral.

Conhecidos como partidos nanicos, partidecos ou legendas de aluguel, esse tipo de sigla não tem qualquer expressão nacional ou representação no Congresso, mas dispõem de “proprietários” astutos para negociar pecuniariamente espaços em coligações eleição após eleição. Foi assim que sobreviveu o falecido Levy Fidélis e sobrevive o fantasma José Maria Eymael, eternos falsos candidatos à Presidência da República. Foi alugando o partido que, em passado recente, eles e vários outros “empresários” políticos, todos reconhecidos pela Justiça Eleitoral, contribuíram para que surgissem e fossem eleitos salvadores da pátria que jamais disseram ao que vieram.

Além de excrescência eleitoral, o esquema conspira contra a ordem normal de convivência social, pois, usando a estratégia do poder econômico, os “proprietários” dessas siglas montam chapas majoritárias ou proporcionais para somar votos aos seus e, desse modo, garantir o alcance do coeficiente eleitoral. Como não há checagem formal das atividades laborais dos candidatos, não por acaso temos observado nas últimas eleições a consagração do crime organizado em plenários antes ocupados por muitos espertos, mas poucos fora da lei. É a prova de que Edson Arantes do Nascimento e Pelé nunca estiveram errados quando disseram que o brasileiro não sabe votar.

Se soubéssemos, já teríamos encontrado alguém que se preocupasse mais com o Brasil e menos com o próprio umbigo. Resumindo, precisamos descobrir que há vida política além de Lula e de Bolsonaro. Ainda sobre a contraditória polarização, fôssemos menos ranzinzas ideologicamente uns com os outros, estaríamos na ressaca do Dia da Independência, sem a necessidade de se dividir entre uma frágil demonstração de força na Esplanada dos Ministérios e uma insignificante e estulta manifestação contra um ministro do Supremo Tribunal Federal que, mesmo com alguns reconhecidos exageros, só exigiu o cumprimento da lei ao cidadão estrangeiro que originou o protesto sem nexo da Avenida Paulista.

*Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras

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