Brasil viveu com Médici anos de chumbo em pleno período dos anos dourados
Publicado
emJosé Escarlate
Escudado nas ações da AERP, o presidente Médici procurava utilizar o radio e a televisão para, segundo ele, fazer o “jogo da verdade”. Mas além de ter que enfrentar as ações dos terroristas e da oposição, contida pela censura e ameaças, o governo se viu às voltas com o sequestro, pelos Tupamaros, do cônsul brasileiro em Montevidéu, Aloysio Dias Gomide.
Os Tupamaros eram membros do Movimento de Libertação Nacional, compondo um grupo de guerrilha urbana do Uruguai. Desde 1960 vinham atuando com assaltos a bancos e negócios com armas. Depois, passaram a distribuir o dinheiro roubado e comida aos pobres, ganhando o apoio do povo. Essa campanha teve um revide forte das Forças Armadas uruguaias. Muitos desses guerrilheiros foram presos ou mortos. Outros, fugiram para o Brasil.
O belo e histórico estádio Centenário, de Montevidéu transformou-se em prisão, até que um golpe militar, em 1973, tirou do poder o presidente Juan Maria Bordaberry. O Uruguai foi mais um país da América Latina a ceder seu governo aos militares, fechando o circuito do Cone Sul – Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. Em 1985, restabelecida a democracia, os Tupamaros viram seu grupo legalizado e hoje integra a coalizão governamental Frente Amplio. O primeiro guerrilheiro Tupamaro a ocupar a presidência do Uruguai foi José Mujica, que assumiu em 1 de março de 2010.
Além do cônsul brasileiro Aloysio Gomide, também fora seqüestrado pelos Tupamaros o norte-americano Dan Mitrione que, segundo sua embaixada, era funcionário da Agência Internacional para o Desenvolvimento, a USAID. Os terroristas, contudo, afirmavam ser ele um agente da CIA infiltrado naquele organismo e que era especializado em novas técnicas de investigação, incluindo a tortura como método de interrogatório. O governo americano entrou de corpo e alma na busca de seu servidor. Todos os pontos de Montevidéu eram vasculhados por 25 mil soldados uruguaios que buscavam Mitrione.
Paralelamente, Médici também fez pressão pela preservação da vida do diplomata brasileiro. Uma semana depois, outro norte-americano, Claude Fly, um técnico agrícola, era seqüestrado pelos Tupamaros na capital uruguaia. Meses depois, era libertado. Em fevereiro, Aloysio Gomide também ganhou a liberdade. Dan Mitrione, porém, foi justiçado por um tribunal tupamaro dia 10 de agosto. Numa rua do centro de Montevidéu, seu corpo foi encontrado dentro de um carro, com dois tiros na cabeça, um no peito e um nas costas. Ele estava amordaçado e com as mãos amarradas.
A morte de Mitrione deixou o Uruguai perplexo. Mas em verdade ela representou uma derrota para os Tupamaros que, a partir daí, perderam a simpatia da opinião pública uruguaia e internacional, não logrando êxito no seu intento, que era a libertação de 150 prisioneiros que mofavam nas celas do estádio Centenário. Por conta desse episódio, o clima na embaixada americana, em Brasília, era dos mais tensos. A segurança imposta pelos fuzileiros americanos, os mariners, que faziam a segurança da legação era cada vez mais rigorosa. Tudo era revistado e os obstáculos para a entrada de carros, maior.