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Brasileiro está P com demora do dia D e hora H

A picada da esperança ou a ordem unida do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, finalmente está marcada para o dia D, mais precisamente na hora H. Só faltou ao ministro gritar descansar para milhões de brasileiros cansados com a indefinição oficial e ainda confirmar o ano do início da vacinação em massa da população desesperançosa. Convenhamos que a quase precisão do titular da pasta da salvação, o general da logística, bate de frente com a imprecisão do restante governo, notadamente com a do presidente da República, que, por duas tacanhas razões, não sabe e não quer saber quando a vacina estará à disposição dos hospitais e postos de saúde.

A primeira é o antecipado biquinho contra a imunização. O segundo – e mais grave – é não admitir dividir com ninguém essa primazia. Prefere manter o macabro título de coveiro. Lamentável a brincadeirinha presidencial, que, em razão da inércia e da tranquilidade com a vida alheia, dispõe de mais de 204 mil cadáveres debitadas em sua conta política. É um direito da família Bolsonaro não querer ser imunizada. Entretanto, em qualquer país sério e preocupado com o bem estar geral, é um dever do administrador principal zelar pela saúde do povo, independente de cores partidárias ou simpatias ideológicas.

É pensar covardemente quando se deliberadamente uma campanha sanitária em picuinha eleitoral. Seria cômico não fosse trágico ficarmos lembrando diariamente que corremos o sério risco de sermos a última nação do continente a alcançarmos o dia D. Tudo por causa de uma beligerância cega e estúpida que obriga a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a cobrar dados sem nexo do Instituto Butantan, cuja ação é bancada pelo governo de São Paulo, hoje comandado pelo principal adversário do bolsonarismo nas eleições de 2022.

A exemplo do futebol, onde a bola pune o mal jogador, o mundo e especialistas em vidas humanas, não perdoam erros . Nessa quarta-feira, a organização não governamental (ONG) de direitos humanos HRW (Human Rights Watch) divulgou seu Relatório Mundial 2021 e não poupou o Messias do Planalto, que recebeu um capítulo inteiro. A ONG acusa o governo Bolsonaro de “sabotar” os esforços contra a Covid-19, aumentar o desmatamento e reduzir a transparência governamental.

Potencialmente soberano e soberbo, portanto alheio às críticas, no mesmo dia o presidente, em conversa com apoiadores – nunca com o povo – ironizou a eficácia da Coronavac, vacina de origem chinesa e que vem sendo desenvolvida e fabricada pelo Instituto Butantan, isto é, pelo governador João Dória. Não importa quem seja o fabricante. Importante é termos a vacina e, por enquanto, é a única de que dispomos concretamente. Dando ares de veracidade ao relatório da Human Rights, Bolsonaro passou a quarta-feira recebendo deputados, preocupado exclusivamente com a campanha de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara. Às favas a vacina.

Voltando à pegadinha do ministro da Saúde, que levou à lona um imponente e ex-suposto articulista de TV, o textual de Eduardo Pazzuelo gerou vários memes, alguns grosseiros e outros muito engraçados. Ao meu zap zap chegaram vários. Um deles, sem autoria, revela que é chegada a hora de os críticos do governo se penitenciarem e admitirem que está tudo resolvido e organizado. Informa que a vacinação no Brasil será, segundo o ministro, no dia D, na hora H, no mês M, do semestre S, do ano A. Acrescenta que a vacina será aquela, feita por um laboratório e que os primeiros serão vacinados antes, ficando os últimos para o final. Finaliza afirmando que quem receber dose única não precisará receber a segunda.

Obviamente trata-se de uma brincadeira de quem está cansado das pilhérias do governo. Poderia incluir na comicidade do caos que o aumento de óbitos não deve gerar pânico, pois eles se referem apenas aos que não sobreviveram. Diria ainda o autor desconhecido que o governo fará o que for necessário, exceto se houver motivo de força maior, menor ou igual. Lamentavelmente desinformado sobre o que o povo espera dele, Pazuello parece suficientemente inteligente para não seguir à risca todas as ordens do Planalto. Ainda mais relevante seria evitar a mesma arrogância de Bolsonaro nos ataques à imprensa.

Não conheço o ministro, mas acredito em sua seriedade, embora menospreze sua subserviência ao presidente de patente bem inferior. Deve assustá-lo o título constitucional concedido ao ocupante da melhor cadeira da Presidência da República, o de chefe supremo das Forças Armadas. Chefe sim, comandante não. Ainda na ativa, o general Pazzuelo tem idade para continuar comandando soldados, cabos, sargentos, oficiais, regimentos, divisões e, provavelmente, comandos. Basta ser profissional de logística, não se curvar às ordens estapafúrdias e desprovidas de vontade pública e ouvir colegas que experimentaram e saíram ilesos dos limites dos desmandos.

Como acreditar em um cidadão que fala cobras e lagartos do medicamento que pode eliminar o Covid-19 – inclusive fazendo campanha pública contrária ao experimento – e impõe sigilo de até 100 anos sobre seu cartão de vacinação? Estranho. Se quer esconder, obviamente existe o cartão e está devidamente preenchido pelas doses contra isso ou aquilo. Talvez até a do pezinho. Melhor seria evitar especulações. Só pode ser o biquinho contra João Dória. Nesse caso, sem qualquer ilação, nada mais pavoroso do que ciúme de homem. Vacina não é barganha, saúde não é política e vidas têm de ser preservadas. Que chegue logo o dia D e a hora H. O povo, que não aguenta mais blá blá blá, já está P com o negacionismo.

*Wenceslau Araújo é jornalista

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