Santana, o moralista
Brigar por beijo de casal deixa policial no chão
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emLá estava o Santana, ostentando a arma na cintura, se achando o maior combatente do crime. Isso apesar de não ter certeza nem mesmo se teria ingerido duas, três ou meia dúzia de latinhas de cerveja, já que havia inúmeras outras no chão, tão próximas aos seus pés, que, provavelmente, iriam contribuir ainda mais para aumentar a pança, que tanto dificultava vestir as próprias calças. Ao seu lado, ligeiramente mais sóbrio, se encontrava o Limeira, seu companheiro de tantas primaveras na polícia.
Não muito longe do palco, os dois canas escutavam aquela música cheia de agudos. Até ensaiavam uns passos, mas nem a música animada conseguia fazer com que aqueles corpos disformes fossem além de alguns estalares de dedos. Todavia, se o Limeira estava mais a fim de curtir a noite, o Santana, sempre atento a tudo, apesar de quase nem sempre conseguir enxergar um palmo à frente da própria fuça, não gostou do beijo mais caloroso do casal logo ali. Foi dar uma de moralista em pleno show de rock.
— Que porra é essa?
Os dois pombinhos nem notaram a interrupção do paquiderme armado. Isso, aliás, provocou uma reação ainda mais severa do Santana, que deu um empurrão no rapaz. Este, por sua vez, olhou espantado para aquele homem barrigudo.
— Tá olhando o quê, moleque? – Santana, enfurecido, desafiou o jovem, que não devia ter mais do que 20 anos.
— Você é muito macho porque está armado!
Pra quê? O Santana, num movimento até rápido para alguém tão gordo e embriagado, pegou a pistola em sua cintura e a jogou no meio da plateia.
— Agora vem, moleque!
Coitado do Santana! Tomou um soco no meio do nariz e caiu de bunda no asfalto. O rapaz tomou a mão da amada, agora ainda mais apaixonada, e sumiu na multidão. Já o Santana, além de perder a contenda, nunca mais conseguiu encontrar a sua arma. Quanto à autoestima, não tinha o que fazer, pois, há muito, ela o abandonara.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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