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Dengue, febre amarela e esquistossomose

Brumadinho pode fazer de Minas grande hospital

Publicado

Autor/Imagem:
Leonardo Augusto e Lígia Formenti

Estudo divulgado nesta terça-feira, 5, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) alerta para a possibilidade de ocorrência de surtos de doenças como dengue, febre amarela e esquistossomose como consequência do rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte. O risco de doenças teria como causa alterações no meio ambiente pelo impacto da lama que desceu do reservatório.

Segundo o pesquisador Christovam Barcellos, titular do Laboratório de Informação em Saúde do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz, a degradação do leito do Rio Paraopeba, poluído pelos rejeitos, e de seu entorno vai produzir alterações significativas na fauna, flora e qualidade da água, como perda de biodiversidade, mortandade de peixes e répteis.

“A bacia do rio Paraopeba é uma área de transmissão de febre amarela e um novo surto da doença não pode ser descartado. É urgente a vacinação da população”, disse.

O trabalho mostra que, em um primeiro momento, aproximadamente 34 mil pessoas são potencialmente afetadas pelos rejeitos escoados na tragédia. “O desastre trouxe mudanças no bioma e as consequências dessas alterações para saúde da população que vive na área afetada poderão ser sentidos a curto, médio e longo prazo”, afirmou Diego Xavier, do Obsevatório de Clima e Saúde da Fiocruz e um dos coordenadores do trabalho.

No caso da esquistossomose, o risco ocorre, conforme o estudo, principalmente se for levado em consideração que grande parte do município de Brumadinho e municípios ao longo do Rio Paraopeba não é coberta por sistemas de coleta e tratamento de esgotos.

Com o rompimento de sistema de esgotos e água causado pelo acidente, a situação pode se agravar ainda mais. Daí a necessidade de se fazer obras emergenciais para construir ou reparar os sistemas já existente. “A transmissão de esquistossomose é facilitada pelo contato com rios contaminados por esgotos domésticos e com presença de caramujos infectados”, afirmou Barcellos.

“Assim como aconteceu após do desastre de Mariana em 2015 após o rompimento de uma barragem de Fundão, também sob responsabilidade da companhia Vale, os impactos ecológicos da lama de rejeitos pode atingir centenas de quilômetros”, diz o estudo.

O trabalho da Fiocruz lembra que a área afetada pelo desastre de 2015, em Mariana, foi uma das mais atingidas pelo surto de febre amarela, um fenômeno que pode ter sido agravado pela degradação do ecossistema aquático e das margens do Rio Doce.

“Um novo surto de febre amarela na região de influência do Rio Paraopeba não pode ser descartado, coincidindo com o período de verão e outono, quando a transmissão do vírus em áreas silvestres e rurais é mais intensa”, completam os pesquisadores da Fiocruz no relatório.

A lama que atingiu o Rio Paraopeba está contaminada por metais pesados. Laudos divulgados por órgãos da vigilância mineira já identificaram a presença de altos níveis de mercúrio, cádmio e chumbo. Em entrevista ao Estado na semana passada, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, observou que população atingida será acompanhada por longos períodos. O cádmio é cancerígeno, o mercúrio provoca alterações irreversíveis no sistema nervoso. Há ainda a necessidade de se monitorar gestantes, pois metais pesados podem provocar alterações no feto.

A equipe da Fiocruz ressalta ainda que o acidente pode agravar o estado de saúde de pessoas que já apresentam doenças crônicas, que exigem acompanhamento constante de profissionais de saúde. O trabalho realizado pelo observatório mostra que o acidente não atingiu unidades básicas ou hospitais da região.

“Mas muitas pessoas que trabalham nesses locais tiveram parentes atingidos pela tragédia, estão envolvidos em buscar parentes e, óbvio, nessas condições não há como prestar um atendimento adequado de atenção à saúde.” Sem assistência a problemas como hipertensão e diabete, há um aumento do risco para casos de acidentes vasculares cerebrais (AVC) ou enfarte.

“Isso já foi visto em outros episódios. Houve um aumento de casos de AVCs na região atingida pela enchente em Santa Catarina, em 2008 e depois do acidente nuclear na cidade japonesa Fukushima, em 2011.”

Há ainda a necessidade de se reforçar a assistência à saúde mental. Todas as famílias atingidas pela tragédia serão cadastradas pelas equipes de saúde e acompanhadas. Há um alto risco para desenvolvimento de problemas como depressão e ansiedade.

O trabalho da Fiocruz foi feito a partir da análise de base de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Agência Nacional de Águas (ANA) e Datasus.

“É preciso criar uma estratégia de resposta, para reduzir os riscos que população atingida enfrenta e para a reconstrução da qualidade de vida a médio e longo prazo desse grupo”, disse Xavier. O estudo da Fiocruz observa para o risco sistêmico das barragens no País – são 24 mil, das quais 600 relacionadas às de mineração e cavas exauridas. “É urgente a criação de um sistema de resposta”, completou.

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