Missão F3
C4 Cactus, o jeito gostoso (mas nem tanto) de dirigir um Citroen
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emJornalista saindo à caça de segredos faz parte da rotina. Vez por outra, voltamos da perseguição com fotos de carro disfarçado. Mas tem dia que a caça ganha. Repórter dirigindo veículo antes do lançamento é caso raro. Mas aconteceu. E com o Citroën C4 Cactus.
Participamos de uma avaliação pouco usual, com carros “zebrados”, batizada pela Citroën de “Missão F3”. “F3” é o código interno do projeto C4 Cactus, utilitário-esportivo que a marca francesa irá lançar na metade do segundo semestre, no Brasil. O Cactus chega para brigar com Honda HR-V, Jeep Renegade e companhia. “Missão” é como a empresa define os testes de rodagem.
O modelo passa pelos últimos ajustes, antes de receber o “ok” e entrar em linha de produção, na fábrica de Porto Real, sul do Rio de Janeiro. Os carros que dirigimos foram montados na linha, mas de forma ainda manual, sem a cadência normal de produção seriada. Por isso, devem ser aprimorados até o lançamento.
Nessa fase, a empresa costuma “colocar o cliente dentro do projeto”. A ideia é captar não apenas as impressões dos técnicos, mas as sensações dos usuários comuns. Por isso, são convidados funcionários de diversas áreas da montadora, incluindo Recursos Humanos, contabilidade, etc.
Pois foi em uma dessas “missões” que assumimos o volante de quatro unidades, cada qual com alguma diferença no ajuste (relação de câmbio, motor, suspensão, etc.) ou no combustível. Uma delas estava abastecida com gasolina pura, um acerto específico para a Argentina.
O roteiro foi pela região do Vale do Paraíba e serra da Mantiqueira, na divisa entre São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Não foi possível fazer fotos. As lentes dos celulares foram tapadas com adesivos. A própria Citroën forneceu as imagens, mas não liberou nenhuma foto do interior, que é a grande diferença do modelo nacional para o europeu. C’est domage.
Neste teste fora do convencional, jornalistas perguntaram pouco e responderam muito. Ou melhor, perguntamos muito, mas ficamos sem respostas. Os técnicos da Citroën estavam ansiosos para saber o que os jornalistas haviam achado de cada uma das unidades. E, quando questionávamos algo, a resposta era quase sempre um “ainda não podemos falar sobre isso”…
Na ausência de respostas dos técnicos da Citroën, passamos a “ouvir” tudo o que o Cactus tinha a nos dizer. E aqui vai um resumo de o que podemos esperar dele.
Por fora, o C4 Cactus nacional será praticamente idêntico ao modelo francês. A única diferença perceptível é o rack no teto do modelo nacional, inexistente no europeu. As linhas são modernas. O conjunto ótico é separado em três blocos: luzes diurnas de LED bem estreitas na parte superior, formando um belo conjunto com o logotipo da marca. Os faróis principais ficam abaixo delas, e as luzes auxiliares, na parte inferior.
As portas têm protetores com ar (airbumps), marca registrada do modelo. A primeira versão do carro, lançada na Europa em 2014, tinha bolsas de ar maiores, mas após a reestilização elas diminuíram de tamanho. O modelo nacional adota o novo padrão.
O Cactus brasileiro teve o interior simplificado em relação ao europeu, que, a propósito, é bem vanguardista: tem duas telas flutuantes no painel, uma à frente do motorista, com os instrumentos, e outra central. Como o porta-luvas tem abertura para cima, o air bag do passageiro fica no teto. Nada dessas excentricidades típicas da marca estará no “nosso” Cactus, que tem interior convencional.
O Cactus deverá ter uma vida menos espinhosa do que a do “primo” Peugeot 2008, SUV com o qual divide a plataforma (MP1). O 2008 tem um ótimo motor (1.6 turbo THP, de 173 cv) e um bom câmbio (automático de seis marchas). O problema é que eles não andam no mesmo carro. O motor turbo está disponível somente com transmissão manual, enquanto a caixa automática casa somente com o motor 1.6 aspirado, de 122 cv (etanol).
O Cactus reuniu ambos, e, como era de se esperar, o desempenho agrada. As respostas são tão boas que já é possível prever que o SUV da Citroën será um dos mais rápidos da categoria, senão o mais rápido. Além da agilidade, as trocas de marcha são suaves. Não há aletas para mudanças no volante, mas, como o carro ainda está em fase de finalização, teoricamente ainda há tempo de instalá-las. Se o carro chegar sem elas, não foi por falta de pedidos.
Todas as unidades do nosso comboio estavam com rodas aro 17 e pneus 205/55. Os modelos mostraram boa estabilidade nas estradinhas sinuosas da região, e um rodar confortável. A direção elétrica também agrada, assim como os freios, a disco nas quatro rodas. Resta saber se esse conjunto estará em toda a gama Cactus (“não podemos dizer ainda”, eles disseram).
Quanto aos assistentes de direção, há sistemas que alertam sobre saída involuntária de faixa e também risco de colisão frontal. Em ambos os casos, porém, os dispositivos apenas alertam: não corrigem a direção (no caso de mudança de faixa) nem freiam (no caso de veículo à frente).
O Cactus tem interior revestido de plástico rígido, sem muita textura trabalhada. Passa impressão de simplicidade. O porta-luvas desce de uma vez, quando aberto. Não há apoios de mão no teto, e os espelhos nos para-sóis não têm iluminação.
A partida é feita por botão, e o comando giratório que seleciona o tipo de terreno (grip control) é o mesmo do Peugeot 2008. Como os concorrentes, o Cactus tem tração dianteira.
O quadro de instrumentos digital é igual ao do sedã C4 Lounge, e, portanto, simples e um pouco confuso. As barras que indicam a forma de condução (econômica ou não) crescem para cima e para baixo simultaneamente, para indicar gasto de combustível. Não é uma sinalização muito lógica.
O ar-condicionado é digital, mas com regulagem única e sem saída para a parte de trás, onde também não há porta-copos.
Reclamamos do fato de haver apenas uma entrada USB. Carro novo com somente uma entrada desse tipo parece aquelas casas antigas, com uma tomada por cômodo. Pedimos mais. No lançamento, saberemos se eles ouviram.
Quanto a preços, obviamente nenhuma pista. Mas é possível prever que a empresa adotará tática semelhante à empregada no mais recente modelo da marca, o C4 Lounge: versões bem equipadas e de topo de linha competindo com as intermediárias da concorrência. Nessa linha, é possível esperar preços a partir de R$ 75 mil. Caso contrário, a vida pode se complicar. A Citroën está apostando todas as fichas no Cactus. Depende demais de um SUV de bom volume de vendas. Sem preço competitivo, ela também corre o risco de ficar sem resposta.