Notibras

Café vira canto da sereia para papo de pombinhos

Otimista ao extremo, Stella não se deixava abater por contratempos, por maiores e mais cabeludos que fossem. Nada parecia abalar a confiança daquela mulher, que enfrentaria o que fosse necessário para atingir seu objetivo, que, naquela semana, era tomar um sorvete de casquinha com o moço bonito, que a atendia diariamente no balcão da padaria da esquina.

A mulher estava acompanhada da Arlete, sua amiga de longa data, com quem guardava raras semelhanças e quase todas as diferenças. Talvez, por isso mesmo, as duas se davam tão bem na maior parte do tempo. Não que isso fosse uma verdade absoluta, como também estava longe de ser uma flagrante invencionice.

Arlete, sejamos sinceros, guardava uma pontinha de inveja da quase irmã, mas nada que passasse de mera admiração por qualidades que enxergava em quase ninguém além da outra. A maior delas, provavelmente, era a audácia. Sim, isso mesmo! Audácia! Afinal, de nada vale o otimismo se não acompanhado da gana de ir atrás do que se deseja.

Na manhã seguinte, Arlete encontrou Stella com um sorriso maior do que a cara ali sentada à mesa do canto na padaria onde o bonitão trabalhava. Por que tamanha felicidade àquela hora? O relógio ainda teria que percorrer um longo caminho até dar 8 horas. Será que havia conseguido seu intento? Não era possível, haja vista, na noite anterior, tê-la acompanhado até seu apartamento, onde pediram uma pizza e assistiram a um filme até tarde.

Arlete se lembrava que havia ido embora quando já era quase meia-noite. No entanto, antes que pudesse questioná-la, eis que o balconista se dirigiu até a mesa ao lado, onde serviu um casal de idosos. Em seguida, o rapagão se virou e lançou um sorriso para Stella. Depois, ele retornou para o balcão, enquanto, finalmente, Arlete, mais curiosa do que nunca, quis saber o que estava rolando.

— Ele me convidou para tomar sorvete mais tarde.

— Como assim? Do nada?

— Hum. Usei um antigo ensinamento da minha saudosa vovó.

— O que você aprontou, Stella?

— Pedi um café.

— Não entendi. Um café? E o que tem isso a ver?

— Amiga, café torna tudo possível!

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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