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Cardozo considera acusação mentirosa; Wagner revela o tom de indignação de Dilma

Rachel Gamarski, Igor Gadelha e Carla Araújo

O ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, fez uma forte crítica à delação premiada do senador e ex-líder do governo no Senado, Delcídio Amaral. Cardozo acusa o senador de ter mentido na suposta delação e ter construído sua tese de delação “por vingança, para sair da prisão”. “Tivemos, no conjunto em que eu e a presidente somos citados, um conjunto de mentiras”, disse após transmitir o cargo a Wellington Lima e Silva.

O ministro tentou desmentir as acusações feitas por Delcídio, a respeito de uma suposta negociação entre o governo e um ministro do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que está presente na delação. “Quando Delcídio foi preso, o voto que ele cita como negociado não havia sido dado”, afirmou.

O novo advogado-geral da União frisou ainda que a delação premiada de Delcídio foi uma ação de retaliação. “Delcídio, se fez delação, é porque queria ter saído da prisão e queria atingir algumas pessoas. Delcídio estava inconformado por ter sido preso e pelo governo não ter agido para tirá-lo da prisão”, destacou.

Cardozo negou ainda que Delcídio tenha conversado com Dilma sobre o ministro do STJ. “É evidente que é mentira que a presidenta teria se reunido com ele sozinha para tratar desse assunto. Tenho certeza que isso não aconteceu. Isso é desejo de vingança em relação à Dilma Rousseff”, afirmou.

Entre outros argumentos usados por Cardozo, o ministro afirma que “é fácil falar de fatos que aconteceram quando se faz uma delação premiada” e diz que “se governo tivesse negociado para nomear, pessoas que Delcídio queria que fossem soltas já estariam soltas”. Cardozo negou ainda que tenha ido a Santa Catarina se reunir com autoridades como acusa a revista IstoÉ sobre a delação premiada de Delcídio.

Cardozo afirma ter entrevistado os candidatos ao STJ e ter recebido Delcídio por diversas vezes em seu gabinete. “O essencial que ele tocava era: nós temos que ver o que está acontecendo na Lava Jato, os réus estão sendo obrigados a fazer delação premiada”, disse Cardozo.

O ministro afirmou que Delcídio solicitou que ele, Cardozo, falasse com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Para Cardozo, a presença diária de Delcídio em sua sala era para a “sua própria sobrevivência”.

Indignação – No Planalto, o chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, afirmou que a presidente Dilma Rousseff está “muito indignada” com o acordo de delação do senador Delcídio Amaral e o vazamento do conteúdo da declaração dele à revista IstoÉ. “(A presidente) está com a mesma indignação que eu, talvez até mais que eu, porque envolve diretamente o nome dela”, afirmou.

“Ela está preocupada porque eu acho que é uma coisa totalmente fora de qualquer padrão. Uma delação que eu não sei se foi, pelo que eu sei, não foi homologada, que envolve ministros e, principalmente, a figura da Presidência da República. Aí, está totalmente de cabeça para baixo”, afirmou.

Wagner afirmou ainda que “tem muita poeira e pouca materialidade” no acordo de delação e comparou o vazamento ao escândalo da Escola Base, da década de 1990, em que os donos do colégio de São Paulo foram inocentados anos depois de denúncias de abuso infantil.

“Eu prefiro ser objetivo, fático. Esse fato é intolerável numa República e num Estado Democrático de Direito. Se faz um linchamento público, seja de quem for, para depois alguém dizer: ‘É, não valeu, não vale nada'”, afirmou. Ele disse ainda que é “um absurdo completo” a execração pública para depois alguém provar que algo está diferente.

“Tocaram fogo na escola, tocaram fogo na família, tocaram fogo nas pessoas, para dois anos depois dizerem: ‘Ih, não é nada disso’. Então, não dá, gente. Eu acho que isso aqui é um absurdo completo”, disse. Wagner, que se reuniu com Dilma e com o ex-ministro da Justiça e novo chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, para definir uma estratégia de reação do Poder Executivo, também levantou suspeitas sobre a veracidade das informações de Delcídio, mas preferiu não “adjetivar” se as razões do acordo de delação seriam uma espécie de vingança.

O chefe da Casa Civil declarou ainda que o suposto acordo de delação “tem muita inconsistência” e que o senador do PT de Mato Grosso do Sul “é o delator, ele é a testemunha, ele é tudo”. “Na minha opinião, tem muito pouca materialidade”, acredita. Após a divulgação do acordo de Delcídio, a administração federal tem tentado desqualificar as falas dele, alegando que o senador tem mentido.

Desde que deixou a prisão, Delcídio afirmava que não faria acordo de colaboração premiada, pois “reescreveria” a história “sem revanchismo”. Perguntado se Cardozo poderia ter conhecimento do acordo e por isso ter deixado o cargo, Wagner rebateu dizendo: “Vocês sempre pressupõem que a gente conhece de tudo”. “O que mudaria a gente tirar ou deixar o José Eduardo Cardozo, até porque ele foi pra AGU, ele continua ministro?”, questionou.

Wagner também evitou comentar a possibilidade de o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é inimigo público do Executivo, estar por trás do vazamento. “Não, aí eu não tenho e, até gosto porque eu não tenho uma cabeça conspirativa, eu prefiro dizer o seguinte: o fato é inaceitável, que alguém pegue algo que vale ou não sei se vale, bote em qualquer órgão de imprensa”, acha.

O chefe da Casa Civil julga que o acordo de delação que estava sob sigilo da Justiça não poderia ter sido vazado e que “estão receptando informações”, mas que não caberá ao Ministério da Justiça investigar os vazamentos. “No caso, não tem o que o Ministério da Justiça apurar porque só teve a delação”, admitiu. “Se couber a alguém é a própria Procuradoria-Geral da República (PGR)”, completou, ressaltando que a gestão federal mantém “relações harmônicas e respeitosas com os outros Poderes”.

Repúdio ao abuso – Sem citar o nome do senador Delcídio Amaral, Dilma Rousseff divulgou  nota criticando o vazamento de suposta delação premiada do petista e disse que “esses expedientes não contribuem para a estabilidade do País”. “Se há delação premiada homologada e devidamente autorizada, é justo e legítimo que seu teor seja do conhecimento da sociedade”, afirmou no texto, ressaltando que, para isso, é necessária a autorização do Poder Judiciário.

A presidente disse ainda que os vazamentos seletivos de delações estão sendo utilizados para fins políticos. “Repudiamos, em nome do Estado Democrático de Direito, o uso abusivo de vazamentos como arma política”, escreveu.

A presidente destacou que todas as ações do seu governo “têm se pautado pelo compromisso com o fortalecimento das instituições de Estado”. Ela também reforçou os trabalhos de combate à corrupção e que disse “os vazamentos apócrifos, seletivos e ilegais devem ser repudiados e ter sua origem rigorosamente apurada, já que ferem a lei, a justiça e a verdade”.

“Em meu governo, a lei é o instrumento, o respeito ao cidadão é a norma e a Constituição é, pois, o guia fundamental de nossa atuação. Por isso, à luz de nossa lei maior defendemos o cumprimento estrito do devido processo legal”, escreveu Dilma.

 

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