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Fechando o cerco

Caso Covaxin põe impeachment na porta do Planalto

Publicado

Autor/Imagem:
Mário Camargo, Edição

Depois de tomar conhecimento, pelo deputado Luiz Miranda, de supostas negociatas no Ministério da Saúde para a compra da vacina indiana Covaxin, o presidente Jair Bolsonaro deveria de imediato – como supôs equivocadamente o parlamentar – levar o caso ao conhecimento do seu ministro da Justiça, a quem caberia, no instante seguinte, acionar a Polícia Federal para proceder investigações. Mas, como agiu diferente (teria acionado diretamente o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello), Bolsonaro se vê agora alvo de uma artilharia pesada. Pode ter cometido crime de prevaricação, por exemplo, e não precisa nada além disso para entrar na mira de um processo de impeachment.

Esse é o entendimento de juristas, transmitido em depoimentos ao Estadão. Aliás, sobre depoimento, o clima deve ser intenso nesta sexta, 25, em Brasília, com as anunciadas presenças de Luiz Miranda e de seu irmão Luiz Ricardo na CPI da Covid. Provas do alerta ao presidente não faltam, a começar pela troca de mensagens do deputado com um ajudante de ordens da Presidência da República.  A primeira versão do governo foi de que a PF foi acionada. Mas na Polícia Federal, é o que se apurou, ninguém tem conhecimento de investigação dessa natureza.

Todo esse imbróglio levou o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), a pedir informações ao diretor-geral da PF, Paulo Maiurino, para saber se Bolsonaro entrou em contato para solicitar que as suspeitas de irregularidades fossem apuradas. As informações são de que o governo empenhou (destinou, sem poder usar para outro fim) 1 bilhão 600 milhões de reais para a compra da vacina da Índia. Aziz, porém, não teria recebido a resposta da PF até a noite desta quinta, 24. Foi a vacina mais cara comprada pelo governo e a única a ter um intermediário nas negociações.

O Código Penal explica o crime de prevaricação como o ato de “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício” em benefício próprio. Acácio Miranda, mestre em Direito Penal pela Universidade de Granada, na Espanha, avalia que caso seja confirmada a falta de interesse em solicitar a instauração de investigação de possíveis atos de corrupção na estrutura do governo, Bolsonaro – ou Pazuello – prevaricou.

“O presidente da República não tem o poder investigatório, mas ele deveria obrigatoriamente conduzir a documentação para a Polícia Federal investigar”, diz Antonio Gonçalves, pós-doutor em ciência jurídica pela Universidade Nacional de La Matanza, na Argentina. Ele ainda sustenta que, em última instância, a função de solicitar abertura de investigação criminal é de Bolsonaro, e não de Pazuello. A análise não é partilhada por outros juristas.

Para Matheus Feliveni, doutor em direito penal pela Universidade de São Paulo (USP), não há base jurídica para imputar crime de prevaricação ao presidente, pois não estaria dentro de suas funções de ofício investigação. No entanto, ele avalia que Bolsonaro pode incorrer no crime de condescendência criminosa – quando um gestor público deixa de responsabilizar ou não leva à autoridade competente crime cometido por seus subordinados.

O jurista Antonio Gonçalves vai além: “uma coisa não exclui a outra. Nesse caso, pode haver uma cumulação na tipificação”. Segundo ele, Bolsonaro pode ter prevaricado e sido condescendente com o crime. Os três especialistas julgam haver margem para que o presidente seja enquadrado na Lei 1079/1950, relativa aos crimes de responsabilidade que levam ao impeachment – caso fique comprovada a ocorrência dos crimes.

Quando em posse do cargo, o presidente da República não pode ser julgado por crimes comuns descritos no código penal. Ele responde apenas a crimes de responsabilidade. Sendo assim, Feliveni vê margem para que Bolsonaro seja enquadrado nos incisos V e VII da lei do impeachment, que falam, respectivamente, da probidade administrativa e do legal emprego dos recursos públicos.

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