Acostumados a longos passeios pelo governo Sarney e a rolezinhos sem compromisso pelas gestões de Collor, FHC, Lula, Dilma e Temer, os integrantes do Centrão nunca tiveram tanto poder como têm agora com Jair Bolsonaro. Além do comando da Câmara e do Senado, são “donos” de pastas importantes financeira e politicamente, entre elas o Ministério do Trabalho. A última – a Casa Civil – é responsável pela articulação política com o Congresso, atua na coordenação de ações do governo com outros ministérios e compõe, ao lado do ministro da Economia, a Junta de Execução Orçamentária. Ou seja, melhor só uma Coca-Cola gelada e um hamburguer com ovo e sem salada. Ainda é pouco, mas a chegada do senador Ciro Nogueira (PP-PI) à lojinha da Casa Civil abre caminho para a legenda ampliar seus robustos e cada vez maiores tentáculos pela Esplanada dos Ministérios.
Ao lado de Arthur Lira (PP-AL), Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), Ciro Nogueira deverá protagonizar um toma lá dá cá jamais visto neste país. E o objetivo não será outro senão tirar proveito político dessa dependência do governo Bolsonaro. Por exemplo, o custo será alto para que o presidente da Câmara faça ouvido de mercador para a centena de pedidos de impeachment sobre sua mesa. A contrapartida terá de ser maior do que já é. Pode até ser que a pressão popular consiga sensibilizá-lo. Entretanto, tudo dependerá dos acenos do Palácio do Planalto. É vergonhoso, mas faz parte do jogo. Como disse nosso famoso Justo Veríssimo, “o povo que se exploda”.
É vero. O povo, o eleitor, o Brasil e o futuro da nação são apenas meros detalhes no contexto das vantagens pessoais. Como afirmou o próprio presidente da República, firmar a coalizão, sinônimo de entregar “a alma do governo” ao Centrão, é para garantir a governabilidade. Tomara que ele consiga pelo menos concluir sua administração com algum êxito. Velhos conhecidos dos eleitores brasileiros, os deputados e senadores do bloco estão sempre como adidos, embora normalmente hajam como se efetivos fossem. No português dos congressistas, é ruim “não é problema nosso”, mas se é bom “vamos faturar”. Simples assim para um grupo com graduação, mestrado, doutorado e especialização no quesito meu pirão primeiro.
Novo sócio majoritário do governo de Jair Bolsonaro, o Centrão é, na verdade, um balcão de negócios. E, infelizmente para todos nós brasileiros, não é de hoje. Para eleger Arthur Lira presidente da Câmara foram fundamentais os votos do PSD, MDB, DEM, PROS, PSC, Avante e Patriotas. Associados à velha política e ao fisiologismo, a maioria faz questão de se autodenominar independente. Todavia, não passam de um agrupamento de siglas conservadoras que atuam conforme seus próprios interesses. Jogam o jogo da política nacional, mas, em síntese, nada mais interesseiro do que o Centrão. Apesar disso, é preciso fazer chegar ao presidente da República o recado de que o apoio do bloco não é sinônimo de estar livre para se arvorar como dono do mundo.
Na política e no Brasil tudo tem limites. Emparedado pelo Tribunal Superior Eleitoral, investigado pelo Supremo Tribunal Federal, limitado no Congresso Nacional e cada vez mais ameaçado pela falta de apoio popular, o presidente da República sabe que só o enlace com o Centrão não basta. É imperiosa a divisão de toalhas, sabonetes e escovas de dentes, sob pena de o abraço de tamanduá ser desfeito antes de uma nova pesquisa de intenção de votos ou logo após a próxima manifestação pela ruas e avenidas do país. É tudo uma questão de tempo.
*Mathuzalém Jùnior é jornalista profissional desde 1978