No sertão, chuva não é só água — é festa, é reza atendida, é assunto pra render no terreiro por uma semana. E São Pedro atendeu as preces do nordestino, abriu as torneiras do Céu e a água começou a pingar sobre o solo árido.
Até então, estava um calor de rachar mamona. O chão parecia frigideira, e o sol, um cabra abusado, passava o dia todo no céu sem tirar um cochilo. Até as galinhas estavam se abanando com as asas, e o jegue de Seu Zé, coitado, aprendeu a fingir de morto pra não puxar carroça.
Mas aí o céu começou a fechar devagarinho, como quem não quer nada. Nuvem preta chegando de mansinho, e a gente já com aquele aperreio bom no peito. Mainha largou a vassoura, gritou: “Menino! Vai buscar as bacias, que vai chover!” E o menino, que tava pelado correndo no quintal, nem discutiu. Criança nordestina sabe que quando a chuva vem, é como festa de Natal.
Primeiro foi um pingo, depois dois. Quando deu o terceiro, foi uma carreira de gente pra dentro de casa e outra pra fora. Tinha quem queria se molhar, tinha quem queria salvar o varal. E o cachorro latindo pro céu, como se fosse ele o responsável pelo aguaceiro.
Nos últimos dois dias choveu grosso, daquele jeito que faz o barro grudar até na alma. A terra respirou aliviada, e o cheiro de chão molhado invadiu tudo. No rádio da cozinha, Luiz Gonzaga tocava baixinho, como quem também agradecia.
Seu Raimundo, que não dava um sorriso desde a seca passada, abriu um sorriso do tamanho do açude que agora começava a encher. “É chuva de molhar até pensamento ruim”, ele disse, rindo e tomando café com farinha. E Dona Maria, com a mão na cintura, já planejava plantar feijão, milho e, se sobrasse um tiquinho de fé, até esperança.
Porque no Nordeste, gente, chuva é mais que água. É perdão do céu, é abraço de nuvem, é vida que volta por teimosia. E o sertanejo, esse cabra danado de forte, já sabe: com um bocado de paciência e outro de fé, tudo volta a brotar.
E enquanto chove, o povo canta, dança e faz promessa — porque se tem uma coisa que nordestino sabe, é celebrar até quando o céu chora.