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Chuva salva Silva, que parou e deixou o xixi descer

Às vezes, os olhares inquisidores são extremamente castradores. Se somos jovens, a pressão costuma ser bem maior, mas chega-se a certa idade e, então, olhamos para dentro de nós, buscamos o nosso eu, nos importamos conosco, somos simplesmente nós mesmos. O que é o mundo? O que todo mundo tem a ver com nossos atos? Atos falhos? Bugalhos? Às favas!

As nuvens foram chegando como que não quisessem muita coisa. Uma a uma, todas foram se aglomerando no céu, antes praticamente onde só se via azul, tornando-o cinza, quase negro. Bum! Caiu aquela água toda, pegando muita gente desprevenida. Gente se amontoando sob as marquises para se proteger da chuva, os carros espalhando a água que ia se acumulando ao lado das calçadas. O trânsito já caótico ficou praticamente intransitável. Bi-bi! Fom-fom! Priiiiiiiiiii! O guarda de trânsito tentava, inutilmente, colocar ordem no caos.

Silva acabara de deixar Elizabeth, sua namorada, em casa, quando se deparou com o espetáculo da natureza afligindo as pessoas nas ruas e avenidas, nas calçadas sob as marquises ou dentro de algum comércio. Ele não estava com pressa, mas não quis se deter como muitos transeuntes. Arriscou-se no temporal.

O velho foi caminhando, vencendo os metros. Sua bexiga, talvez pela idade avançada, só começou a dar sinais de que estava repleta quando praticamente chegou à rua. Não quis retornar ao apartamento da amada apenas para urinar. Continuou caminhando, logo estaria em casa, pensou.

Quando alcançou a primeira esquina, suas roupas já estavam mais molhadas do que se estivesse dentro de uma piscina. A bexiga apertava tanto, que incomodava, doía, cada passo era um tormento. Silva pensou em entrar em algum bar e despejar todo aquele líquido amarelo que carregava, mas preferiu continuar. E foi o que fez.

Segunda quadra vencida, a bexiga castigava mais e mais a teimosia do velho. Ele talvez não resistisse por mais alguns metros. Preferiu continuar, a despeito da torrencial enxurrada. Velho teimoso que era, prosseguiu!

Quando já ia chegando à terceira quadra, parou diante do sinal de trânsito. Os carros buzinavam, os transeuntes duelavam seus guarda-chuvas na tentativa de não se molharem tanto. O velho parou por um instante. As roupas totalmente molhadas, inteiramente coladas ao corpo.

Pensou, pensou. Pensou! Afinal, quem perceberia? Certamente só ele, e, mesmo assim, por causa da diferença de temperaturas. Concentrou-se. Parado ainda, olhava para os lados, enquanto o quentinho seguiu o seu caminho natural. Que alívio!

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