Ciência entra na guerra da maioridade penal. Infrator é impulsivo
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emCientistas da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, observaram, em um estudo recente, o motivo que pode tornar adolescentes impulsivos e infratores. Exames de neuroimagem em jovens mostraram que o córtex pré-frontal, região do cérebro ligada à tomada de decisão, ou seja, que nos faz pensar antes de agir, ainda está em formação nos adolescentes. Essa área do cérebro tende a ficar ‘madura’ somente aos 20 anos.
Por outro lado, a região cerebral associada às emoções e à impulsividade, conhecida como sistema límbico, tem um pico de desenvolvimento durante essa fase da vida, o que aumenta a propensão dos jovens a agirem mais com a emoção do que com a razão.
Esse desequilíbrio no desenvolvimento torna os adolescentes mais propensos ao risco sem medir as consequências. Os jovens são mais extremados em seus sentimentos – é só nos lembrarmos do sofrimento que foi a primeira paixão, os primeiros goles de álcool e o cigarro fumado escondido dos pais só para se sentir aceito em um grupo.
O aumento da emotividade e da impulsividade seriam gatilhos naturais para atitudes extremadas, inclusive para cometer crimes, segundo a neurocientista BJ Casey, diretora do Escola de Medicina Weill, da Universidade Cornell, que liderou o estudo. As diferenças biológicas foram observadas em exames de neuroimagem feitos primeiramente em camundongos jovens e depois em humanos por meio de testes que testavam reações no mesmo momento em que seus cérebros eram examinados em aparelhos de ressonância magnética.
“Nosso trabalho sugere que há uma rápida aceleração no desenvolvimento dos centros de emoção no cérebro durante a puberdade, enquanto o córtex pré-frontal, que regula as emoções inibindo estes centros, ainda está se desenvolvendo lentamente nos adolescentes”, diz Casey em entrevista ao UOL por e-mail.
“As observações do estudo foram de encontro com o que os criminologistas chamam de ‘curva idade-crime’, ou o nascimento do comportamento criminal, especialmente no sexo masculino, durante a adolescência, com picos em torno dos 17 anos”, ressalta Casey.
A pesquisa observou que os adolescentes costumavam tomar decisões mais arriscadas do que adultos e crianças, principalmente quando agiam em grupo. “Com o cérebro não totalmente desenvolvido, o adolescente pode ser levado a cometer decisões pouco acertadas que lhe causam problemas, mas ele não pensa nas consequências de suas ações no calor do momento, especialmente se estiver em grupo ou se sentindo ameaçado”, diz Casey.
Por ser algo que tende a mudar com o tempo, já que o cérebro continua se desenvolvendo, a pesquisadora é contra a prisão de adolescentes em casos de crimes. Para Casey, o ideal é inclui-los em programas de reabilitação para recuperá-los o quanto antes.
“O cérebro é conectado por meio de experiências, e, durante a adolescência, o indivíduo precisa de oportunidades para aprender a enfrentar os desafios sociais, intelectuais e sexuais da vida adulta de forma socialmente aceitáveis. Infelizmente, o encarceramento raramente inclui modelos adultos socialmente aceitáveis ou colegas com boa conduta social e, muitas vezes, inclui confinamento solitário. Por isso, não são pelas oportunidades na prisão que eles vão aprimorar as suas habilidades sociais de forma socialmente aceitas”, afirma.
Casey dá como exemplo seu próprio país, os Estados Unidos, onde há uma discussão para aumentar a maioridade penal para 18 anos em Estados onde ela é menor. Segundo a pesquisadora, as decisões levaram em conta a falta de provas que indiquem que a prisão de adolescentes evite a reincidência criminal.
“Adolescentes devem ser responsabilizados por seus crimes, mas o tratamento de um adolescente como um adulto é uma punição cruel quando eles têm a capacidade de regular seu próprio comportamento reduzida. A maioria dos crimes de adolescentes não são os violentos e aqueles que são geralmente ocorrem com problemas de saúde mental. Estes jovens precisam de serviços e tratamento em um ambiente seguro e que os mantenham a salvo”, diz.
No caso dos psicopatas, a coisa muda de figura. Há jovens que naturalmente são maldosos e vão cometer crimes deliberadamente se eles se mantiverem em liberdade, por isso devem ficar presos, segundo o neurocientista Ricardo de Oliveira Souza, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que pesquisa a morfologia do cérebro psicopata.
De acordo com o neurocientista, exames de neuroimagem, como a ressonância magnética, já são capazes de ver detalhes no cérebro que indicam traços psicopatas em jovens. No entanto, seu uso não é indicado no Brasil por questões éticas. Nos Estados Unidos, esses exames já são usados em alguns casos policiais.
“Existe instrumentos clínicos de diagnóstico e até de prognóstico para psicopatia com precisão de 85%. O exame de neuroimagem detectaria experimentalmente, mas não é correto usar como prova pericial, exceto em caso em que haja lesão cerebral adquirida”, afirma.
Porém, ele afirma ser necessário diferenciar criminosos comuns de psicopatas. E se for comprovada a psicopatia, essas pessoas devem ser retiradas da sociedade, segundo Souza.
“O ambiente tem modulação nas pessoas normais, mas há indivíduos que nascem maus, são os psicopatas que são 3% da população. Quando se tem esse diagnóstico é importante admitir que essas pessoas não vão se recuperar. O ideal é que elas fiquem confinadas eternamente”, diz.