Mais uma vez Ciro Gomes (PDT) chama a atenção para eventos estranhos que vêm acontecendo no governo de Jair Bolsonaro. O pior, parece que não temos vida inteligente na terra, aliás, no Brasil, porque quem está no poder (Congresso Nacional, Judiciário, Ministério Público, Tribunal de Contas…) não tem comparecido para atuar ou fazer o que estão sendo pagos para fazer em nome do bem comum da sociedade. É normal alguém seguir um líder, seja rei ou presidente. No entanto, não saber distinguir o que é licito do ilícito, certo do errado, lucrativo do prejuízo e da boa-fé da enganação, nos faz pensar que vivemos num mundo de idiotas.
Como não bastasse, vai o governo ao Congresso Nacional expor a lei do Petróleo (Lei nº 9.478) e a lei das Estatais (Lei nº 13.303) para justificar que não pode intervir em um setor, onde justamente essas leis falam que o controle é sim do Governo e que a estatal, no caso a Petrobras, tem função de controle de preços, qualidade e interesse do consumidor. Agora o candidato Ciro Gomes expõe novamente coisas extremamente graves e que estão afetando significativamente a vida do povo brasileiro e principalmente a classe menos favorecida.
Me refiro a três das muitas denúncias soltadas em menos de três segundo: 1) a privatização da Refinaria da Bahia Landulpho Alves; 2) venda a preço de banana em fim de feira da Carteira de Crédito do Banco do Brasil para o BTG Pactual, criado pelo ministro da Economia Paulo Guedes; 3) e por fim, mas não sendo a última faceta “inteligente” do governo, realizada para o bem e o interesse de não sei quem, as vendas (TAG e NTS) dos gasodutos e oleodutos da Petrobras, para logo em seguida, alugá-los a peso de ouro.
Parece conto de fadas ou terror no mundo da lógica da economia e das finanças, mas é isso mesmo que vem acontecendo. O pior que no mundo da Justiça e o próprio Tribunal de Contas não têm se manifestado quanto a esses eventos, porque até agora não se viu falar em responsabilização ou destrato de compra e venda injustificada.
Quanto as fontes energéticas e sua estrutura são essas as estratégias do governo federal, que teve início no governo de Michel Temer (MDB), e se aprofundou com Jair Bolsonaro (PL), de transformar a Petrobras apenas numa empresa produtora de petróleo, saindo de negócios como o mercado de gás, das refinarias e do transporte. E até então estamos sofrendo com as consequências dessa política de preços, refletindo nos custos dos alimentos, vestuário, serviços e por todos os ramos da economia.
Já ao Banco do Brasil, o negócio com a Carteira de Crédito não seria tão suspeito se o BTG não tivesse ligações com Paulo Guedes e os lucros não estivessem projetados para lá da casa de R$ 1,659 bilhão.
Exemplos dos desmandos e descasos são muitos, como pode-se aferir nas informações abaixo, veiculadas nos últimos três anos e meio:
A Refinaria Landulpho Alves (RLAM) é a segunda maior refinaria do país. A privatização da Landulpho Alves, conforme atarde.com.br, vem causando muitos dissabores ao povo baiano, mas não foi por falta de aviso que tudo isto está acontecendo no estado nordestino. A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e o Sindipetro Bahia alertaram sobre a criação de um monopólio privado de petróleo com a venda da RLAM. Tal problema foi apontado, à época, por estudo da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, encomendado pela Associação das Distribuidoras de Combustíveis – Brasilcom.
Estão ocorrendo grandes mudanças na indústria baiana e o epicentro principal é a venda da RLAM – Refinaria Landulpho Alves para o Mubadala, fundo soberano de Abu Dhabi nos Emirados Árabes. E lê-se que não está claro qual será o impacto nos diversos setores da economia. O que está claro é que o “Mubadala”, palavra árabe que significa “troca”, é um gigante que tem investimentos em mais de 50 países, em montante da ordem de 250 bilhões de dólares, e está se mobilizando para ser, não só o maior player industrial da Bahia, mas um gigante empresarial com operações na área de petróleo e gás, logística, mineração e outras. Concretizada a compra da RLAM, o fundo árabe passará a controlar mais de 30% do PIB da indústria de transformação baiana, mas essa participação será maior, pois o Mubadala já controla também a empresa Deten Química, em Camaçari, que registra lucro anual superior a R$ 100 milhões. Ora, só isso bastaria para fazer do Mubadala o maior grupo industrial da Bahia, mas o poder dos investidores árabes pode se ampliar já que eles manifestaram interesse na compra da fatia de 38,3% do capital total (ou 50,1% do votante) da Braskem, a maior empresa privada da Bahia. Com a compra o Mubadala passará a controlar mais de 70% do setor químico petroquímico da Bahia, e será responsável por mais de 50% do PIB da indústria de transformação.
E o fundo árabe não atuará apenas na área industrial; será, na verdade, o maior grupo empresarial da Bahia. Ao comprar a RLAM, o Mubadala adquiriu uma rede de oleodutos, uma fábrica de asfalto, uma central termoelétrica e uma estação de tratamento de água e efluentes. Adquiriu também o Temadre – Terminal Portuário de Madre de Deus e vai se tornar o maior operador portuário do Nordeste, movimentando 20 milhões de toneladas com quatro terminais portuários no estado: Candeias, Itabuna, Jequié e Madre de Deus. O fundo opera terminais de Abu Dhabi, tem estaleiros e participa do controle da maior companhia de logística integrada do Oriente Médio. A subsidiária logística do grupo no Brasil, a MC Brazil, poderá movimentar cargas de terceiros no Temadre e fazer transporte de cabotagem com impacto no perfil portuário do Estado. O Mubadala explora alumínio, ouro, produz coque de petróleo e atua na área de energia em vários países. É um gigante que tem como gestor Khaldoon Khalifa Al Mubarak, um dos homens mais ricos do mundo, dono do clube Manchester City. Pois é, o poder econômico do Mubadala é grande e vai impactar vários segmentos na Bahia.
TAG e a NTS
A Petrobras está pagando cerca de R$ 3 bilhões ao ano para utilizar os gasodutos da Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG), empresa que a estatal vendeu por cerca de R$ 36 bilhões, mesmo sabendo que iria aumentar a produção, ou seja, precisaria ainda mais dos gasodutos para distribuir petróleo e gás.
A Petrobras é como o dono da casa, construiu toda a malha de gasodutos e para utilizar o que construiu paga um aluguel. O governo fedral promoveu o desmonte da estatal, vendendo partes importantes da cadeia produtiva de combustíveis no país, deixando o Brasil refém do exterior.
Para o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Subseção da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Cloviomar Cararine, a Petrobras pode gastar o que conseguiu vendendo a empresa em menos tempo ainda porque, além da produção aumentar ano a ano e a estatal precisar escoar o gás e o petróleo, tem os reajustes no preço do aluguel.
“A Petrobras produz mais de 90% do petróleo do país e é responsável por 100% do refino, ela mais produz do que exporta, e o transporte do gás é feito pela TAG e a NTS [Nova Transportadora do Sudeste], ambas vendidas. A Petrobras sabia, antes de vender as transportadoras, que iria aumentar a produção e as usaria ainda mais, e mesmo assim vendeu”.
A venda da TAG aconteceu dois anos após a Petrobrás ter privatizado a Nova Transportadora do Sudeste (NTS), subsidiária que controlava a malha de gasodutos mais estratégica do país: 2.000 quilômetros de dutos que interligam toda a região Sudeste. A Brookfield, um fundo de investimentos canadense, pagou pela empresa a bagatela de US$ 4,23 bilhões, sendo US$ 2,59 bilhões em ações e US$ 1,64 bilhão em títulos de dívida.
Desde então, a NTS vem acumulando lucros e receitas recordes às custas da Petrobras, que agora precisa alugar a preços de mercado os dutos que antes lhe pertenciam. Em média, a estatal gasta R$ 1 bilhão por trimestre com aluguel de dutos. Ou seja, em menos de quatro anos, já terá pago à Brookfield todo o valor que arrecadou com a privatização da NTS.
Negócios do BB/BTG Pactual
O ministro da Economia Paulo Guedes e a direção do Banco do Brasil devem explicações à sociedade sobre a estranha entrega de uma carteira de crédito de R$2,9 bilhões da empresa pública para o BTG Pactual. Segundo relatório da Controladoria-Geral da União (CGU), feita em novembro deste ano, o BB realizou a operação, feita em 2020, sem fazer um “planejamento estruturado” e “sem as devidas justificativas” de mercado. Na época a transação causou estranheza em muita gente, até porque Guedes é fundador do banco BTG (o “G” da sigla é de Guedes).
A operação é no mínimo estranha e só beneficiou o banco privado. “Causou muita estranheza o fato de o BB ceder uma carteira de crédito tão valiosa, avaliada em R$2,9 bilhões e todo mundo sabe que Guedes foi fundador e sócio do BTG Pactual”, disse o diretor do Sindicato, José Henrique.
Para a CGU, “o banco realizou uma operação piloto de cessão sem um plano diretor que a balizasse, sem demonstrar conhecer o mercado onde está se inserindo, tomou decisões sem as devidas justificativas e com um processo de gerenciamento de riscos superficial”, concluiu o relatório da Contralodoria Geral da União.
“Nem o mercado engoliu a forma com que a direção do Banco do Brasil entregou de bandeja uma carteira tão valiosa para uma empresa do setor privado.
A venda de uma carteira de crédito do Banco do Brasil, avaliada em R$ 2,9 bilhões, para o BTG Pactual por apenas R$ 371 milhões continua sendo notícia. Desta vez, foi pauta da Revista Fórum. Segundo a reportagem, um analista do mercado financeiro disse que a carteira tem potencial de recuperação de 70%. Além disso, a maior parte dela é composta por financiamentos imobiliários adquiridos por ex-funcionários do próprio BB, que deixaram o banco em PDVs nos anos 1990 e 2000. Em caso de inadimplência, imóveis podem ser tomados para quitar os empréstimos. Segundo a Revista Fórum, “se a avaliação de 70% de recuperação feita por essa fonte se concretizar, o BTG vai receber R$ 2,03 bilhões ao final, ou R$ 1,659 bilhão a mais do que pagou pela carteira”.
Em nota à Fórum, o Banco do Brasil informou que “os créditos cedidos referem-se a operações que estavam inadimplentes, em média, há mais de seis anos. Do total, 98% já estava lançado em prejuízo e os 2% restantes contavam com provisões. Além disso, trata-se de um portfólio de operações ajuizadas, com processos judiciais iniciados há até 15 anos”.
“O BTG Pactual pagou pouco mais de 20% do que valia a carteira. Por si, isso já seria motivo de investigação. Se acrescentarmos a informação de que o BTG foi fundado por Paulo Guedes, a quem o BB está subordinado, e agora essa informação de que 70% da carteira pode ser recuperada, a situação fica ainda mais grave para os responsáveis pela transação”, ressaltou o coordenador da Comissão de Empresa dos Funcionários do Banco do Brasil (CEBB), João Fukunaga.
A Revista Fórum diz ainda que a mesma fonte do mercado financeiro revelou que o BTG está de Olho Grande em outras duas carteiras de crédito do BB, de cerca de R$ 1,6 bilhão cada, que atualmente estão sob os ativos da Previ, o fundo de previdência dos funcionários do banco.
Há sujeira demais. E os tapetes são poucos para cobrir tudo isso.
*Advogado, pós-graduado em gestão financeira, integrante de diversas comissões da OAB/Seccional DF