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Chega de multas

Claudionora, a motorista tresloucada que enlouquece agente de trânsito e amiga

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Apesar da faixa de pedestre não ter sido uma invenção candanga, parece que por aqui virou quase uma instituição sagrada. Tanto é que pedestre, mal chega à sua ponta, os motoristas já brecam. Quer dizer, nem sempre é assim, o que provam alguns acidentes, ainda mais quando o condutor do veículo está distraído ou, então, o transeunte acha que nem precisa sinalizar para atravessar a rua.

Pois estava eu saindo de casa para mais um dia de labuta, quando a Claudionora, colega de trabalho, me avistou e buzinou. Quase pulei de susto, pois estava degustando as poesias de “A verdade nos seres”, livro do talentosíssimo Daniel Marchi.

— Mulher, quer me matar?

— Claro que não, Salete. Só quero te dar uma carona.

Mesmo conhecendo a notória inabilidade da minha amiga ao volante, aceitei o convite, ainda mais porque os ônibus na capital gostam de fazer doce para darem o ar da graça. Meia hora no ponto é nos dias de sorte, pois a espera costuma ser muito mais dolorosa.

E lá fui eu com a cara e a coragem me sentar no banco do passageiro do possante da Claudionora, cinto de segurança e reza em dia. Tudo parecia incrivelmente bem, como se a motorista tivesse abandonado todas aquelas loucuras ao volante. Ledo engano, como, para meu desespero, pude constatar no meio do trajeto. É que a minha colega, talvez distraída por algo alheio à minha percepção, quase atropelou uma senhora na faixa de pedestre. Por sorte ou intervenção divina, a velha se safou sem nem um arranhão sequer. No entanto, eis que surgiu, não sei de onde, um guarda.

— Minha senhora, além de quase atropelar aquela pedestre, a senhora está sem cinto.

— Seu guarda, por acaso o senhor sabe se eu posso usar cinto?

Pego de surpresa, o sujeito ficou desconcertado e acabou pedindo desculpas para a louca da minha amiga. Você acredita nisso? Pois foi o que aconteceu. Mas a coisa não parou por aí, pois a Claudionora, artista das boas, começou a chorar, o que parece ter compadecido o coração do guarda.

— Minha senhora, por favor, me perdoe. Não foi minha intenção causar tamanho transtorno. Se a senhora quiser, pode encostar ali para se recompor. Posso até arrumar uma água com açúcar, se a senhora assim o desejar.

As lágrimas corriam pela face da Claudionora, que aceitou a proposta do homem da lei. Ficamos paradas por uns cinco ou dez minutos, até que, finalmente, fomos embora. Mas não pense você que acabou por aí, pois a minha amiga ainda teve a desfaçatez de trocar telefones com o guarda, que, afinal, era um tipão.

Quando já estávamos quase chegando ao trabalho, a Claudionora parecia ter trocado o drama pela comédia. Olhei para ela e pude ver aquele sorriso estampado no seu rosto.

— Claudionora, você tá bem?

— Ué, tô! Por quê?

— É que pensei que você estive tendo um treco lá atrás.

— Treco que nada, Salete! Só não queria ser multada novamente. Ufa, escapei por pouco!

……………………

Eduardo Martínez é autor do livro 57 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’

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