Irene, desde menininha, demonstrava certas manias peculiares. Uma delas era a paixão pela cor verde, talvez por conta da primeira vez que avistou um inseto. Não um desses comuns, mas uma esperança. Gostou do nome e se apaixonou pela cor.
Se a garota era gamada pelo verde, nem de perto tal sentimento se comparava com a adoração que possuía diante de uma iguaria quase unânime, caso não fossem aqueles chatos do contra. Pois é, Irene tinha fixação por sorvete. E apreciava sabores diversos, mas era todo entusiasmo diante do de chocolate.
A pequena abria aquele sorriso quando o pai chegava com um pote geladinho nas mãos. Ela sabia que, não tardaria, iria se lambuzar com aquilo tudo. Quer dizer, tinha consciência de que iria dividir com os irmãos e a mãe, além de dar algumas colheradas caprichadas para o pai, sempre um guloso que nem a caçula.
O tempo foi se esticando até que a pirralha se transformou numa mulher. A adoração por sorvete, todavia, a acompanhou durante toda essa trajetória. E, apesar de já casada e até com uma filha de um ano, Irene não largava a mesma colher que recebera, ainda menina, de sua mãe. E era com ela que a agora mamãe usava para tomar sorvete.
Edu, o marido, achava aquilo muito engraçado. Tanto é que, certa vez, lá estava o casal diante da televisão assistindo a mais um jogo do time da Irene, cujo uniforme, obviamente, era verde que nem aquela esperança.
Os dois dividiam um generoso pote de sorvete de chocolate. E, entre uma jogada e outra dos craques do Palmeiras, eis que surgiu um curioso interlúdio.
— Irene, por que você só toma sorvete com essa colher minúscula?
— Edu, é pra prolongar o prazer.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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