Do mesmo modo que, veladamente, recomendo voto contra extremos antidemocráticos, não escondo minhas restrições ao modus operandis do atual governante máximo do país. Entretanto, tenho de reconhecer – e enaltecer – a força do fanatismo em relação ao mito. A começar pelo próprio líder da seita, ninguém entrega os pontos. Pelo contrário. O barco está afundando, não há salva-vidas sequer para a tripulação, mas poucos acreditam no naufrágio. Na pior das hipóteses, a expectativa é de que todos conseguirão sobreviver comendo marisco sobre o casco da embarcação. De uma coisa, porém, o Brasil passou a ter certeza: não há mais fantasmas sob os lençóis do governo do capitão de pijama. A fantasia faz algum tempo foi perdida junto com o rumo e a noção da importância do cargo para o qual foi eleito.
Na sequência, perdeu o conteúdo (se é que um dia chegou a ter) que ainda lhe restava. Pior foi a perda do balaio de votos que jamais foram seus, mas que verdadeiramente o ajudaram na eleição de 2018. Os insatisfeitos com aquele outro candidato despertaram do sono profundo e, livres da aparente demência política, mudaram o cenário em três tempos. É a tal invocada e mal-humorada corrente de eleitores descontentes com o governo e que certamente fará a diferença em outubro próximo. Tudo isso gerado pelo exagero dos arroubos, xingamentos e ameaças, além de três anos de uma desastrada administração. Ou seja, ele mesmo protagonizou sua extinção como pretenso homem público com crédito pelo menos razoável. Se vale uma frase de consolo, a Inês é morta.
Embora o postulante à reeleição faça pouco caso das pesquisas de intenção de votos, os números desfavoráveis à sua candidatura apavoram os seguidores raiz que permanecem vivos e que, um dia, a exemplo do que já imaginou o outro extremo, acharam que o governo do capitão seria eterno. Erraram feio. De barro e sem utilidade quando trincado, o mito tanto esticou que acabou se enrolando na própria corda. Obviamente que nada está definido, mas convenhamos que não será tarefa das mais fáceis reverter uma diferença de 22 pontos percentuais, conforme demonstrado na consulta divulgada esta semana pela Quaest/Genial.
Os números não mentem. Na verdade, mostram com clareza absoluta que, enquanto um candidato sobe como balão inflado com abundância de gás hélio, o outro derrete feito gelo espalhado no asfalto quente. Tudo isso, repito, causado por ele mesmo. Produto das redes sociais, que certamente não terão o mesmo peso observado na eleição de 2018, o concorrente da situação parece estar fazendo campanha para seu oponente retirante. Produto da mídia que ele teima em querer regulamentar, o líder das pesquisas nada de braçada no mar de baboseiras produzidas pelo senhor da razão. Tudo indica que meus contemporâneos se juntarão aos mais jovens, aos mais esclarecidos, aos nordestinos e, sobretudo, às mulheres nessa campanha de recuperação do país.
A ordem é por uma nova chance contra a amarga e cavalar reincidência, a favor do fim da propagação de mentiras e, principalmente, em defesa da liberdade de pensamentos, de ideias e dos bons costumes. Mais uma vez, valho-me dos inteligentes para expressar meus instintos metade primitivos e metade otimistas. Fã incondicional do imortal Charles Chaplin, celebro como minha a declaração de que “nada é eterno nesse mundo, nem mesmo nossos problemas”. E hoje, sem margem de erro, nossos problemas têm nome, sobrenome, patente e muita criatividade para ofender o próximo. Faltou-lhe apenas preparo para governar. Pouca coisa, mas fundamental para quem se arvora a disputar cargo de tal relevância.