Robin Hood e Macunaíma
Com Lula ou com Jair, se o povo correr o bicho pega, se ficar o bicho come
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Também chamada de encruzilhada política, a polarização em que meteram o povo brasileiro que só quer viver dias menos palestinos lembra a melhor das expectativas transformada em dura realidade. É a mistura de duas histórias míticas de supostos heróis da antiguidade. De um lado, o inglês Robin Hood, cuja fama era de “roubar” dos nobres para dar aos pobres. Ele teria vivido no século XII e, ajudado por amigos leais, prezava a liberdade, a vida ao ar livre e o espírito aventureiro.
Tenha ou não existido tal como o conhecemos, Robin Hood é, para muitos, um dos maiores heróis da Inglaterra. Na outra ponta, encontramos Macunaíma, um anti-herói sem nenhum caráter que sai da Floresta Amazônica e vai para São Paulo, onde enfrenta o gigante Piaimã em busca de uma muiraquitã, amuleto que recebeu de Ci, a Mãe do Mato. Escrito por Mário de Andrade em 1928, o romance da primeira fase do modernismo brasileiro mostra que, apesar de aventuras por vezes engraçadas, os “heróis” de nossa gente acabam criando um fim pra lá de amargo.
É o caso do também “justiceiro” Macunaíma, cuja moral é nos fazer acreditar que é bonito achar graça na malandragem. Aliás, o significado do nome Macunaíma (grande mal) já é algo que merece reflexão. Paradoxalmente, a noção de herói épico aplicada à personagem de Mário de Andrade teria duas vertentes: uma é a esperteza dos fãs de Robin Hood em pregar o ócio remunerado pelo Programa Bolsa Família, a outra é a necessidade dos devotos de Macunaíma em individualizar discursos e ações, consequentemente empurrando para o ralo a consciência e os objetivos coletivos.
Infelizmente, nada mudou. É só blá-blá-blá. Nos últimos anos, a política nacional foi de muita transpiração e nenhuma inspiração. É o Brasil de ontem e de hoje em três tempos, todos antigos e aparentemente imutáveis. Temos um Robin Hood eternizado e liberado pela Justiça, mas não inocentado. Paralelamente, o Macunaíma do século 21 quer porque quer recuperar o poder agindo errado para erradamente corrigir o que deixou de fazer corretamente. Como aquilo n’água, o povo fica entre eles, avaliando ambos, cada um a seu modo, como salvadores da pátria.
Jair Bolsonaro é tido como o enviado de Deus para doutrinar o povo brasileiro, apesar de, a exemplo de Macunaíma, ter se transformado em herói moderno, daqueles preocupados exclusivamente com ações individualistas. Em seus objetivos não há olhos para a coletividade. Já Luiz Inácio é visto como aquele que foi ungido para levar o país a um porto seguro, independentemente de o barco que pilota estar acima do peso e com buracos comprometedores. Pobres coitados, pois não sabem o que pensam, tampouco o que dizem.
Politicamente, Jair parece um balão japonês e, portanto, temporariamente irrecuperável. Lula da Silva, após a pane no avião, o traumatismo craniano e a falta de herdeiros, tende a ser visto como o Neymar da política: o cai cai que sempre arruma um jeito de voltar por cima. Tão trágica como as histórias de Macunaíma e de Robin Hood, a nossa nos faz chorar de rir, ao mesmo tempo em que nos faz rir para não chorar. No português mais escorreito, ou a gente bebe até cair ou cai mesmo sem beber. Ou seja, ainda que inacabada, a moral de nossa história é a de sempre: se ficar o bicho come, se correr o bicho pega.
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Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras
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