Layla Andrade e Andressa Pimenta Lins
Quando escreveu que o homem, guerreiro menino, também chora, Gonzaguinha não poderia imaginar que 25 anos após a sua morte, outro homem verteria lágrimas imperceptíveis por um ato impensado – ou intempestivo. Quem chorou desta vez foi o governador Rodrigo Rollemberg. A causa, o veto inadvertido a projeto que determinava a inclusão do canabidiol na lista de remédios distribuídos gratuitamente pela rede pública de saúde de Brasília.
Ocupante de um cargo forte, Rollemberg foi tomado pela emoção. Sensível, cedeu, reconheceu um erro. E demonstrou esse seu lado eventualmente carregado de candura ao liberar os distritais da base aliada para derrubarem o veto que ele mesmo imprimiu à iniciativa do deputado Rodrigo Delmasso (PTN) que colocava o canabidiol, um produto caro, ao alcance de pacientes que não têm como pagar.
O medicamento é à base de uma das substâncias da cannabis, popularmente conhecida como maconha. Foi liberado para uso terapêutico pela Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. É empregado em larga escala, no exterior, em pacientes com epilepsia. Não há dinheiro no orçamento da Secretaria de Saúde para cobrir as despesas, justificou Rollemberg num primeiro momento. E chocou um público estimado em 200 mil pessoas – 40 mil pacientes, 160 mil familiares.
Mas o veto vai cair na terça-feira, 8, quando os deputados distritais abrirem a sessão plenária da Câmara Legislativa. Em seguida a lei será promulgada pela presidente da Casa, Celina Leão (PPS). O Legislativo vai ficar com os louros da vitória. Mas ficará registrada na história que a semente foi plantada por Delmasso, e irrigada, embora tardiamente, por Rollemberg.
Erro corrigido – O projeto de Delmasso, que logo será lei, também garantirá ao epiléptico atendimento clínico especializado pelo SUS, incluindo exames e cirurgias, se necessário, e a reserva de leitos em UTI. O primeiro passo está sendo dado. Quem sabe um passo maior surja mais adiante, estendendo o uso do canabidiol a pacientes com Parkinson, esquizofrenia, insônia e ansiedade.
Rodrigo Delmasso chegou a levar pais e mães de pacientes a uma audiência com Rollemberg. “O governador mostrou seu lado sensível. E todos ficaram sensibilizados com a postura dele, sinalizando um desejo de ver ”, lembrou o deputado.
Estudos consistentes têm demonstrado o potencial da substância em diminuir a frequência de crises convulsivas entre pacientes com doenças neurológicas graves que não respondem ao tratamento convencional. Hoje, no Brasil 600 mil crianças são portadoras de epilepsia grave, refratária aos anticonvulsivantes tradicionais.
Nesta quinta-feira, 3, ao receber Delmasso e um grupo de pessoas diretamente interessadas no assunto, Rollemberg prometeu melhorar progressivamente a linha de cuidados a pacientes neurológicos. Para isso, disse o governador, ele espera “contar com o diálogo com as famílias”. O deputado viu nisso um gesto de boa vontade. Tanto, que saiu do Palácio do Buriti assegurando que num futuro próximo Brasília “será referência na linha de atendimento a pessoas com epilepsia.”