Desgruda, carrapicho!
Complexo de Édipo, casório e depois solto no mundo
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emCarrapicho não sabia o porquê daquele apelido. Não que ficasse incomodado, pois, até onde se tem notícia, não fazia a menor ideia do significado dessa palavra. Tanto é que, quando precisava informar o nome de registro, gaguejava até que saía Juvenildo Araripe dos Santos. Mas deixemos de lado tanta complicação e voltemos para a praticidade do codinome. Carrapicho!
Assim que deu os primeiros passos, o moleque não desgrudava da saia da mãe, Laurinda. Não importava se a mulher estivesse varrendo o chão, lavando aquele monte de roupas no tanque ou mesmo indo até a esquina na venda do Onofre. Lá ia o menino agarrado que nem carrapato.
Dos seis aos 17, Carrapicho foi levado para a escola pelas mãos firmes da mãe. Ele, choroso, tentava de todas as maneiras se manter grudado, mas Laurinda, mais firme, desvencilhava as mãos do rebento das suas e o deixava entregue para não virar burro. Que estudasse, pois a vida, não raro, pode ser cruel.
Carrapicho, então aos 18, entrou na faculdade. Que orgulho para Laurinda, que ainda sofria com a dependência constante do filho, que não a queria largar.
— Arrume uma namorada!
— A minha namorada é a senhora, mamãe.
Apesar do complexo de Édipo, o rapaz acabou traído pelo próprio coração, que se apaixonou por Laura, uma moça do mesmo curso. O casal, após quatro longos anos de namoro, se viu formado e, menos de seis meses após, assumiu compromisso de amor eterno diante do padre.
Carrapicho e Laura viviam uma vida confortável. Bem empregados, salários juntados muito acima da média, poderiam passar férias anuais em qualquer lugar. Mas o marido, afeito a manter os mesmos hábitos, conseguia convencer a mulher a irem para a mesma cidade, onde se hospedavam no mesmo hotel e, graças às reservas antecipadas, no mesmo quarto.
Laura achava graça das manias do esposo, até que, certa manhã fria de junho, arrumou as malas e foi morar com Pedro, antigo colega de faculdade, que há pouco havia se separado. Quanto ao Carrapicho, desolado, caiu no mundo.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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