De quem é a responsabilidade pela tomada de importantes decisões que envolvem as crianças, como o consumo de fast food, dos pais ou da indústria alimentícia? Há muitas respostas para essas perguntas. Há quem pense que a indústria pode promover os produtos o quanto quiser e pelos meios que julgar mais efetivos porque a escolha de dar ou não os alimentos é dos pais. Mesmo que isso envolva a utilização de campanhas publicitárias animadas com caixinhas divertidas e a venda casada de brinquedos e alimentos de baixo teor nutricional e altos percentuais de sódio, açúcar e gordura.
Na minha opinião, faltam informações de qualidade para que os pais possam fazer uma escolha mais correta. Pode parecer óbvio que o consumo de fast food é nocivo aos pequenos, mas não é claro para todo mundo. E são justamente essas as pessoas que irão comprar toda a coleção de brinquedos vendidos pelas grandes redes. Fazendo com que seus filhos consumam os alimentos vendidos por elas semanalmente, criando um hábito para o resto de suas vidas.
É nesse contexto que o Programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, lança hoje nas redes sociais a campanha Abusivo Tudo Isso. A organização social cria programas que buscam garantir condições para a vivência plena da infância. Criado em 2006, o programa Criança e Consumo divulga e debate ideias sobre as questões relacionadas à publicidade dirigida às crianças e aponta caminhos para minimizar e prevenir os malefícios decorrentes da comunicação mercadológica.
A campanha propõe a assinatura de uma petição com denúncia para a Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça, com cópia para o SAC do McDonald’s, que trata dos principais argumentos pelos quais a prática da empresa de anunciar e comercializar brinquedos com o intuito de promover seus produtos alimentícios para crianças é abusiva, ilegal e deve acabar. Ainda, estimula que os participantes compartilhem a mobilização, de forma a alcançar um número maior de cidadãos.
“Nós recebemos, o tempo todo, mensagens em nosso site, redes sociais e e-mail de pessoas indignadas com as estratégias publicitárias abusivas direcionadas às crianças por essa rede de fast food. E a denúncia deste cidadão nos inspirou a criar uma ferramenta para que reclamações semelhantes cheguem a um órgão responsável por sua fiscalização. Queremos que as pessoas saibam do seu poder de mobilização e denúncia e que a empresa tome conhecimento do descontentamento gerado por suas ações”, explica Ekaterine Karageorgiadis, advogada e coordenadora do Criança e Consumo.
Já existe consenso, entre especialistas, de que a comercialização de brinquedos por redes de fast food estimula o consumo excessivo e habitual de produtos alimentícios com altos teores de sódio, açúcar e gorduras, sendo extremamente prejudicial à saúde das crianças. A obesidade infantil e as doenças crônicas associadas são um problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Sem uma mudança de hábitos e práticas de mercado, em menos de uma década a obesidade pode atingir 11,3 milhões de crianças brasileiras.
Além disso, o fato de esses brinquedos serem exclusivos e colecionáveis faz com que a criança seja diretamente incentivada a consumir muitas “promoções” no curto espaço de tempo em que são oferecidas. Depois de conseguir o primeiro brinquedo da série, em geral, a criança quer completar a coleção e o apelo para que mãe, pai ou responsável compre os demais itens pode gerar estresse familiar.
Não à toa, o ministro do Superior Tribunal de Justiça, (STJ), Herman Benjamin, em julgamento de caso sobre publicidade direcionada a crianças, afirmou: “significa reconhecer que a autoridade para decidir sobre a dieta dos filhos é dos pais. E nenhuma empresa comercial e nem mesmo outras que não tenham interesse comercial direto, têm o direito constitucional ou legal assegurado de tolher a autoridade e bom senso dos pais”.
Vale lembrar que as famílias brasileiras se posicionam majoritariamente contra a publicidade direcionada a crianças, especialmente quando se trata de venda casada de brinquedos com produtos alimentícios não-saudáveis. A iniciativa é uma tentativa de dar voz à população no seu desejo de defender a infância.