Apostem no imposto
Comunicação tira tijolo da ‘casa’ de Lula e deixa um furo no Pé de Meia

Depois de sair da prisão e chegar à presidência, talvez Lula sonhasse em dar a volta por cima e terminar seu terceiro mandato com popularidade recorde. Acontece que, faltando pouco mais de um ano para as eleições, as pesquisas indicam exatamente o contrário. Enquanto o Instituto Genial/Quaest mostra um aprofundamento do quadro de desaprovação, que chegaria a 56% dos entrevistados, o AtlasIntel mostra um quadro de estabilidade em patamares baixos de popularidade. Por enquanto, os efeitos eleitorais não parecem catastróficos, já que Lula lidera as pesquisas em todos os cenários para 2026.
Porém, a confiança no presidente já foi afetada. A justificativa de que não seria possível fazer mais devido às sequelas de quatro anos de Bolsonaro não cola no eleitorado. A explicação mais óbvia é que a inflação está solapando as bases de apoio do Planalto. É verdade, mas o pessimismo da população é maior do que os problemas econômicos. Cai por terra também a ideia de que se trata basicamente de um problema de comunicação.
Afinal, há uma percepção generalizada sobre a incapacidade do governo em resolver os problemas do país e o sinal é que 81% dos entrevistados pela Genial/Quaest esperam uma mudança de rumos até 2026, incluindo aqueles que apoiam o governo. Outra notícia preocupante é a percepção sobre os programas sociais. O mais valorizado continua sendo o Bolsa Família, seguido da isenção do Imposto de Renda, Farmácia Popular e Minha Casa Minha Vida. Já o Pé-de Meia, que deveria ser uma das vitrines da atual gestão, é pouco lembrado, e um terço dos entrevistados afirma não ser impactado por nenhum programa social.
Ou seja, com exceção do Imposto de Renda, que se aprovado tem o potencial de alavancar a popularidade, pois 59% do eleitorado concorda em sobretaxar os super-ricos, o governo tem dificuldade de criar qualquer coisa nova que tenha impacto real na vida da população. Em compensação, a violência é o problema mais citado pelos entrevistados, e que o governo pretende enfrentar com uma PEC da Segurança Pública de impacto duvidoso, já que a maior responsabilidade recai sobre os Estados.
Sitiado
A insistência do governo em apostar na comunicação como mecanismo para sair das cordas se deve também ao fato de que as margens de manobra do Planalto são bem escassas. Se com o Congresso a relação está bem mais tranquila do que no reinado de Arthur Lira, por outro lado, é verdade também que a base governista, sempre pouco confiável, ainda não foi testada na nova gestão. Possivelmente, a prova de fogo será a tramitação da isenção do Imposto de Renda, casada com a taxação dos super-ricos, e que está sob relatoria de Arthur Lira.
Apesar das escaramuças do passado, a escolha do ex-presidente da Câmara foi vista com bons olhos pelo Planalto, que sabe dos desejos de Lira de estar no palanque de Lula para chegar ao Senado. Na economia, a deserção de Gabriel Galípolo não só fez com que o governo perdesse a chance de baixar juros, como cada aumento da Selic está consumindo quase R$4 trilhões dos recursos públicos para garantir a farra dos banqueiros. A Faria Lima, óbvio, está felicíssima com Galípolo. Aliás, o rigor que o mercado financeiro e o BC tanto pregam com as contas públicas não se aplica quando os negócios são privados. Veja lá o Banco Master que pintou e bordou no mercado financeiro sem ser incomodado pelo BC, e vai ser salvo da quebradeira, comprado pelo estatal BRB, numa movimentação que indignou até o ultraconservador Estadão.
Além dos problemas nacionais, Lula ainda tem que lidar com a presença de Donald Trump na Casa Branca. No tarifaço global, o Brasil recebeu uma taxação de 10% e ainda mede qual será o tamanho do estrago e qual a melhor reação. Por hora, o ataque enseja um suspiro nacionalista, com a tramitação de um projeto de reciprocidade econômica no Senado e a nova campanha do Planalto, O Brasil para os brasileiros, ainda que a tônica da resposta brasileira continue sendo a negociação.
O pior é a possibilidade de que o ato de Trump desencadeie uma inflação global, mortal para uma economia dependente como a nossa. Sem forças neste terreno, o governo poderia apostar em uma saída a quente e contar com as ruas para recuperar o fôlego. Mas, apesar de que o breque dos apps demonstrou que tem mais gente com disposição para a luta, a baixa adesão aos atos contra anistia, a perspectiva de um 1º de maio sem a CUT e com a volta dos sorteios de prêmios pelas outras centrais é sinal de que a base de apoio do governo também tem os seus problemas.
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Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile escreve o Boletim Ponto para o MST
