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Conflitos familiares provocam disputa de guarda dos filhos

Crianças e adolescentes que vivenciam frequentemente discussões entre os pais têm mais probabilidades de desenvolver problemas emocionais, adoecer psicologicamente e ter seu processo de amadurecimento prejudicado. Isso acontece porque o processo de amadurecimento da criança depende de seus cuidadores principais e de um ambiente minimamente estável. Somos os únicos mamíferos que necessitam de muito tempo e de outro ser humano para nos desenvolvermos, sem isso estaríamos abandonados à própria sorte e, nesse caso, não sobreviveríamos.

Uma vez sobrevivendo fisicamente, precisamos sobreviver e viver psicologicamente; portanto, também necessitamos de alimento emocional: afeto, compreensão, direção e limites. Quando as brigas entre os pais são frequentes, as crianças se sentem perdidas e em estado de alerta, sendo comum começarem a manifestar disfunções que indicam que algo está errado; essas disfunções se manifestam em forma de sintomas – sono prejudicado, alimentação em excesso ou reduzida, dificuldades na escola, problemas de socialização, ansiedade constante, hiperatividade, desatenção, medo, depressão, necessidade dos pais, amadurecimento precoce, erotização precoce, entre outros.

Dotadas de sensibilidade, inteligência, percepção do clima emocional familiar e, principalmente, do seu inconsciente, essas crianças absorvem a animosidade como esponjas, arquivando sensações, sentimentos e ideias que certamente eclodirão em algum momento da vida se não forem tratadas, resultando em prejuízos na própria infância e posteriormente na vida adulta.

As pessoas não se casam pensando em se separar, mas diante de tantos conflitos conjugais, a separação pode ser vista como uma saída para alcançar alguma harmonia. Isso não significa que outros problemas não surgirão. Viver é a arte de lidar emocionalmente com os problemas, pois eles sempre estarão presentes em maior ou menor grau.

Um processo de separação judicial traz muitas angústias individuais, e quando envolve litígio, torna-se ainda mais complexo. Todos os envolvidos estão mobilizados e as crianças percebem tudo, embora não consigam nomear o que observam ou sentem. As animosidades veladas e as discussões abertas são intensamente percebidas pelas crianças, mesmo que não tenham presenciado ou ouvido nada, pois o inconsciente está presente.

Ouvir essas famílias requer sensibilidade e habilidade para compreender os conflitos humanos, não em busca de culpados, mas sim do sentido de responsabilidade de cada um pela situação atual e como poderão lidar com a nova escolha, considerando que há filhos envolvidos que precisam ser protegidos emocionalmente.

É comum observar que alguns adultos ignoram a vida mental das crianças, acreditando que elas não percebem o que acontece na família. As crianças veem e sentem tudo, apenas não conseguem compreender, o que as deixa inseguras e angustiadas.

A experiência em perícia psicológica muitas vezes revela a falta de uma parentalidade positiva baseada em confiança e segurança para a criança, que é a única forma de relação que os ex-cônjuges, agora pais, deveriam ter. Encaminhar a criança para terapia é proporcionar a ela a oportunidade de ser ouvida como sujeito em seu conflito interno, separado do conflito dos pais. É dar a ela a chance de refletir, questionar, entrar em contato com suas emoções e fortalecer-se psicologicamente para não ser fragilizada ou incapacitada pelo conflito parental. Ela fica envolvida com a situação dos pais e consigo mesma, paralisada emocionalmente e sem referência quando seus pais falham na função parental; isso a deixa à deriva, sem orientação.

Pensando nesse viés, a escuta clínica de um psicanalista ou psicólogo com compreensão da psicologia jurídica pode ser um grande alívio emocional para o desenvolvimento psicológico das crianças, promovendo a saúde mental e oferecendo novas possibilidades de crescimento saudável. Uma perícia psicológica não irá tratar os envolvidos, mas pode orientar tanto o juiz quanto os participantes sobre como lidar com os sentimentos envolvidos, o que pode ser evitado, mudado e melhorado.

Após a separação e a decisão judicial, essas famílias precisarão seguir em frente, e o caminho a ser percorrido envolve refletir sobre os conflitos individuais e familiares. Pessoas que, ao se separarem, buscam ajuda psicológica quando necessário têm mais chances de crescer em suas novas escolhas.

*Psicanalista, psicóloga. Membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro. Membro da International Psychoanalytical Association – UK. Membro da Federación Psicoanalítica de América Latina

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