De volta à labuta, o Congresso Nacional precisa fazer serão (hora extra no jargão do servidor público) para tentar convencer a sociedade de sua utilidade como instituição séria, respeitada e, acima de tudo, honrada. Apenas como justificativa para a narrativa, lembro a tese atribuída ao imperador romano Júlio César para cobrar fidelidade de sua então esposa, Pompeia Sula: “À mulher de César não basta ser honesta, tem de parecer honesta”. Por analogia, o Parlamento brasileiro tem a obrigação de mostrar aos responsáveis por sua “manutenção” que, apesar da periódica falta de vistoria, não é uma casa de shows como aquelas que diariamente põem em risco a vida de milhares/milhões de frequentadores.
Em síntese, é preciso acabar com os rumores, hoje muito mais efetivos do que a efetividade das duas casas produtoras de leis. Na retomada dos trabalhos, um dos primeiros passos para a mudança de conceito é analisar (e aprovar) com mais rapidez os projetos de interesse da Presidência da República, consequentemente do contribuinte. É a hora, por exemplo, de o Centrão mostrar que está fechado com o Brasil e contribuir com o presidente Luiz Inácio, ajudando a aprovar mais facilmente a Proposta de Emenda Constitucional da Reforma Tributária, o Arcabouço Fiscal e os projetos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), das Fake News e do Desenrola Brasil.
Aprovada na Câmara em 7 de julho passado, a Reforma Tributária, após décadas em tramitação, deve ser concluída até outubro, conforme expectativa do relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM). Muito mais do que uma resposta aos eleitores metafisicamente céticos em relação à Câmara e ao Senado, priorizar esses itens pode representar um novo fôlego para os “velhos” parlamentares, principalmente para aqueles recém-inseridos no contexto político apelidado de “Geni”. As pedras devem cessar – pelo menos serem reduzidas – caso os congressistas esqueçam temporariamente as rusgas ideológicas e ofereçam ao país um sistema tributário capaz de tornar o Brasil uma nação menos injusta.
Cabe, portanto, ao Senado ratificar o fim de um dos mais complexos, nocivos e regressivos sistema de impostos do mundo. Facilitador da concentração de renda e da pobreza nacional, o atual modelo tributário pune terrivelmente os contribuintes de menor poder aquisitivo e suaviza perenemente a vida dos abastados. Sempre eles na crista da onda. Na medida em que os pobres são obrigados a arcar com o ônus da tributação, é natural que a situação se agrave, considerando que historicamente somos desiguais. Só para ilustrar, em 2019 o Banco Mundial (World Bank Gini Index) informou que o Brasil ocupa a nona posição na lista dos maiores concentradores de renda do planeta.
Reveladores, os dados do Banco Mundial são a prova de que a estagnação econômica exige mudanças rápidas no sistema tributário. A depender da capacidade dos senadores de jogar no lixo quaisquer falácias demagógicas, fisiológicas e ideológicas, o Brasil pode experimentar em breve uma nova e consolidada via de crescimento, inclusive e sobretudo com mais empregos e renda para o trabalhador brasileiro. Com a Reforma Tributária, poderemos chegar mais próximos do Primeiro Mundo, onde o cidadão tem amplo conhecimento sobre o que recolhe de impostos aos cofres públicos.
Enfim, eis o momento ideal para que os congressistas, particularmente os senadores, mostrem aos 203,1 milhões de brasileiros uma disposição perdida no tempo. A hora é agora. Os tempos de digressão, incertezas e de vergonha têm de estar com os minutos contados. Em Brasília, a época é dos ipês amarelos. Que eles tragam esperança em dias melhores. Embora o atual presidente da República queira incluir o pobre no Orçamento, é bom que se diga que a Reforma Tributária não é do governo, de Lula, muito menos do Congresso. Ela é da sociedade e dessa forma deve ser analisada. É fundamental que a chaga da desigualdade seja cicatrizada rápida e definitivamente. Para isso, nós, os brasileiros que serão beneficiados com a proposta, temos de acreditar que os velhos e novos congressistas assumirão o papel designado à mulher do imperador e deem a César o que é de César.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978