Aquela abóbora passava dos seis quilos. Enorme, bem que poderia ser usada como molde para um globo terrestre. Que nada! Estava fadada a encher o bucho daquela família de esfomeados. Não por necessidade, mas pelo simples desejo de saciar o ímpeto de cometer crime.
Vamos logo ao enredo dessa história, que já virou mote de piadas até nos bairros vizinhos da linda Aracaju. Mas antes que cheguemos ao ocorrido na semana passada, precisamos retroagir no tempo que a dita cuja, a tal abóbora, ainda não passava de um brotinho, que nem bolinha de gude que criança brinca na pracinha.
Josemar, no alto dos seus 68 anos, casado com dona Marta, com quem dividia a casa com as quatro crias, todas maiores de 20, nenhuma acima dos 40, foi o primeiro a notar aquela protuberância presa à rama que havia sido cuidadosamente plantada, adubada e regada diariamente pelo vizinho, o Osmar. E, sem qualquer pudor, tratou logo de puxar a rama por onde pendia aquela abobrinha, que, inocente, deixou-se ser guiada por mãos tão convincentes para o lado de cá da cerca.
Enquanto Osmar prosseguia com os cuidados com a planta do lado de lá, Josemar via aquela bolinha se transformar, cada vez mais, numa grande e vistosa abóbora. De tão reluzente, a pobre coitada nem suspeitava que, mais cedo ou mais tarde, ela iria acabar numa panela com água fervendo. Talvez até virasse iguaria nas mãos de dona Marta, dependendo, obviamente, do ânimo da mulher.
Após namorar o fruto por quase cinco meses, eis que Josemar pegou uma faca na cozinha e, com um golpe certeiro, cortou o cordão umbilical da abóbora. O homem, sem qualquer culpa, carregou a abóbora para dentro de casa e a depositou sobre a mesa. Sorriu aquele sorriso de quem havia cumprido fielmente o plano.
De tão animado, Josemar chegou a sonhar com aquela belezura de abóbora. Tanto é que, na manhã seguinte, acordou com vontade de tascar os dentes nas carnes do corpulento vegetal. Mas eis que, assim que calçou o chinelo, ouviu a campainha tocar. Quem poderia ser àquela hora? Todavia, antes mesmo de continuar tentando adivinhar, percebeu que a esposa acabara de abrir a porta e cumprimentar Osmar, o vizinho.
Josemar, melhor alternativa para aquele momento, teve que dar o ar da sua graça para Osmar. Este, apesar de não gostar de pendengas, ao avistar a abóbora sobre a mesa, não resistiu e instigou o larápio com o seguinte interlúdio.
— Josemar, sabe o que representa aquela abóbora bem ali?
— Não, o quê?
— Representa aquilo que todo criminoso almeja.
— E o que é?
— A certeza da impunidade.