Jéssica Alves, Nathália Larghi e Anna Carolina Papp
A nova regulamentação que permite o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) como garantia adicional para o empréstimo consignado – aquele descontado diretamente da folha salarial – é mais uma ferramenta para que o trabalhador troque uma dívida cara por outra mais barata. Porém, especialistas questionam as consequências da iniciativa no longo prazo e divergem sobre a sua atratividade para os bancos, que ainda estudam as novas regras divulgadas pela Caixa Econômica Federal.
Pela medida, que libera os bancos para firmar convênios com empresas, o trabalhador poderá utilizar como garantia do empréstimo 10% do saldo de seu FGTS. Em caso de demissão, a instituição financeira poderá reter 100% da multa rescisória. A taxa máxima de juros é de 3,5% ao mês, e o prazo para pagamento, de 48 meses.
Maurício Godoi, professor da Saint Paul, explica que a novidade pode ser um bom negócio porque um cliente que está atrasando o pagamento de uma dívida ou não consegue honrar as prestações pode optar por pegar um consignado para liquidar o débito e pagar um juro menor do que o de outras modalidades, como o cheque especial. “É vantajoso para o banco porque ele não estava recebendo e vai passar a receber.”
No entanto, um dos principais obstáculos que as instituições financeiras podem enfrentar é o alto custo operacional. A análise do perfil do trabalhador, do salário recebido, da empresa e do FGTS faz com que a operação seja mais trabalhosa e cara. Aliada ao juro baixo, essa burocracia tornaria essa linha pouco atrativa para os bancos.
“O trabalho que o banco vai ter não faz frente a essa taxa. Antes de conceder o crédito, vai ter de saber quanto você tem para calcular a garantia. O processo só ficaria mais simples se tivesse uma automatização”, explica Marcelo Prata, consultor e fundador do Canal do Crédito.
Por outro lado, a baixa taxa de juros incentivaria mais pessoas a optar por esse tipo de crédito, o que faria com que o banco lucrasse em cima do número de empréstimos. “Em um momento de recuperação da economia, quanto mais crédito a instituição ceder, mais ela ganha no volume, e não na taxa”, observa Juliana Inhazs, professora da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap).
Os bancos ainda estudam como viabilizar as novas regras. Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e Caixa, que juntos detêm cerca de 80% do total em crédito consignado, ainda não começaram a operar a nova modalidade. Em nota, o Bradesco afirmou que “oferecerá a linha tão logo o sistema operacional entre as partes envolvidas esteja apto”. O Santander afirmou que oferecerá a linha, mas que ainda não há detalhes sobre as condições, que dependem das regras estabelecidas pela empresa no convênio com o banco. Itaú, Caixa e Banco do Brasil afirmaram que estão avaliando as novas regras e os ajustes operacionais.
Poupança forçada – Apesar de facilitar o pagamento de dívidas mais caras, uma das principais preocupações dos especialistas em relação à nova modalidade é que ela compromete o que pode ser a única poupança de muitos trabalhadores brasileiros. Juliana, da Fecap, explica que, se o mecanismo for usado em massa agora, no futuro, muitas pessoas estarão com a renda comprometida. “É como se estivéssemos pegando o recurso do futuro para que elas tenham mais hoje”, pondera.