Em julho, as cidades de Niterói e Rio de Janeiro, respectivamente, estão recebendo o Coro da Camerata Antiqua de Curitiba em dois concertos imperdíveis que prometem reviver a música antiga e celebrar os 95 anos de um de seus nomes mais ilustres, o maestro Roberto de Regina, fundador do grupo coral. Sob a regência de Mara Campos, também diretora musical do grupo curitibano, os concertos serão realizados no dia 20 de julho, quarta-feira, no Teatro da UFF (Niterói) e, no dia seguinte, dia 21, na Sala Cecília Meireles, na Lapa. “Estes concertos serão realizados com emoção e muita gratidão por seu legado de conhecimento, prática e inspiração – potência e partilha de uma vida dedicada à música antiga em nosso país”, destaca Mara Campos.
Sobre o seleto repertório dedicado ao maestro De Regina, a regente destaca que o programa “propõe um itinerário musical variado em que a polifonia vocal é condutora(..) Partimos da música renascentista ibérica e francesa, cuja vitalidade, humor e refinamento espelham o temperamento, a desenvoltura e a criatividade do trabalho autoral de Roberto nesta modalidade tão diversa e generosa da música ocidental dos séc XV – XVI – a canção”. Em sequência, o grupo apresentará a emblemática “Music for a while” (H. Purcell), “que nos conduz através da música barroca para a genialidade e totalidade de J. S. Bach em seu moteto “Lobet den Herrn” – obra dentre tantas do grande compositor que Roberto muitas vezes conduziu com identificação e plenitude”, destaca. Encerrando o programa, “Alleluia”, de Jake Runestad, que reflete “a circularidade de nosso itinerário neste programa e nos leva a revisitar o ponto de partida, para que a música antiga reverbere em nossos dias, transcendendo assim nossa condição temporal com o propósito da celebração”, conclui.
Nascido no Rio de Janeiro em 1927, Roberto de Regina é um dos maiores cravistas brasileiros, responsável pela construção do primeiro cravo brasileiro e pela gravação dos dois primeiros discos de cravo e música antiga no país, além do primeiro grupo de música antiga. A partir dos anos 1960, foi um dos grandes responsáveis pela disseminação do instrumento no Brasil, como regente ou solista. Além de influenciar musicalmente as gerações seguintes, sua atuação como luthier ampliou as possibilidades de acesso para os futuros instrumentistas. Em 2014, o maestro reafirmou a importância do grupo curitibano como um dos trabalhos de maior importância em sua carreira. “Durante muito tempo a Camerata Antiqua foi o único grupo no Brasil a se especializar na música antiga. Fizemos gravações e o grupo foi firmando seu nome no país(..) Esse grupo me deu a chance de dar grandes voos na música, regendo algumas das maiores obras da humanidade”, lembra. (Jornal Gazeta do Povo,2014).
Embora seja amplamente reconhecido como um dos maiores cravistas do Brasil, com 26 álbuns e 5 DVDs gravados, Roberto de Regina possui também outras facetas menos divulgadas: é médico anestesista – profissão que exerceu durante anos, paralelamente à música – e exímio artesão. Sua coleção de miniaturas, reunidas desde a infância, estão expostas em um museu aberto ao público, para visitas agendadas. Chamado de Museu Ronaldo J. Ribeiro, situa-se em sua própria residência, um sítio em Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro. O nome é uma homenagem ao administrador do sítio. Boa parte das miniaturas é confeccionada pelo próprio músico. Destaques da coleção: uma maquete de uma cidade europeia fictícia, com teatros, cinemas, igrejas e bondes; automóveis antigos e aviões (inclusive o 14 Bis, de Santos Dumont e a Kitty Hawk, dos Irmãos Wright); embarcações como a Barca do Sol (usada no funeral do faraó Quéops, em 4500 A.C.) e a esquadra de Pedro Álvares Cabral; catedrais e castelos, como o Krak des Chevaliers, localizado na Síria.
Professora, gambista e especialista em música antiga no país, Kristina Augustin reforça a importância dos concertos em Niterói e no Rio: “Roberto de Regina é um dos maiores nomes da história da Música Antiga no Brasil (…) um homem de múltiplos talentos, inspirou a formação de novos conjuntos e influenciou de forma decisiva várias gerações de músicos que hoje atuam no cenário nacional e europeu”
A trajetória desta lenda viva da música barroca brasileira irá virar um documentário, dirigido por Luiz Eduardo Ozório e produzido pela OZ Films e coproduzido pela Multiphocus Filmes e Janeiro Filmes. “É um filme artístico, com uma narrativa de cinebiografia. Estamos usando apenas luz de velas na iluminação para manter a atmosfera barroca”, conta o diretor. “O Cravista” será produzido em formato híbrido e as filmagens em Guaratiba já começaram. O lançamento está previsto para 2023.
Fundado em 1974, como parte da Camerata Antiqua, desde o início de suas atividades, o Coro da Camerata Antiqua de Curitiba destacou-se pela originalidade e leveza na interpretação da música renascentista e barroca. Essa proposta intensificou-se a partir de 1982, sob a regência de seu fundador, o maestro Roberto de Regina, e de experientes regentes convidados do cenário nacional e internacional. A sólida formação musical de seus cantores transformou o grupo em uma das referências da música vocal no Brasil. Ao abordar diferentes vertentes, com a incorporação da música contemporânea e estreias de peças escritas para o grupo, o Coro adquiriu a característica de transitar com autoridade por um vasto e eclético repertório. Próximo de completar cinco décadas de existência, no seu histórico figuram nomes de regentes titulares e convidados que contribuíram de maneira significativa e conduziram o grupo a um trabalho de excelência. Desde 2015, Mara Campos é a regente titular e diretora musical. A partir de 2016, sob sua direção artística, o Coro passou a realizar a “Semana de Canto Coral” dedicada desde a primeira edição ao compositor Henrique de Curitiba, tornando-se desde então, um importante evento para o Canto Coral no Brasil. Atendendo à convites, o grupo realizou importantes turnês pelo Brasil, Estados Unidos e Europa.