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Da alegria ao esquecimento do planeta

Covid e Lázaro deixam Brasil de calças na mão

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior*

Países sérios, governados de modo sério e com maioria da população preocupada com o semelhante começam a deixar para trás os dias de horror decorrentes da pandemia de Covid-19. O vírus ainda é tratado com a devida seriedade nos Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália, Holanda, Espanha, Portugal, Rússia e Bélgica, entre muitos outros. Entretanto, como os mandatários entenderam a letalidade do novo coronavírus e o povo respondeu bem às determinações oficiais, os índices de infecção e de mortalidade estão controlados, com percentuais aceitáveis para qualquer doença infectocontagiosa. Regras mais amenas, liberação dos nativos para uma vida próxima da normalidade, alegria nas ruas e o sorriso estampado no rosto das pessoas são consequências naturais.

A maioria desses países caminha com celeridade para decretar o fim das restrições de controle da disseminação do vírus. O mundo ainda não está livre da doença, mas alguns governantes europeus, como os da França, Holanda e a Itália, já dispensaram o uso das máscaras faciais ao ar livre, liberaram os cafés e autorizaram a presença de torcedores nos estádios. Enquanto isso, do outro lado do Atlântico existe um país continental que permanece empacado na mesmice de pessoas com tarefas cada vez mais cristalinas: a busca do poder acima de tudo e usando Deus acima de todos. Apostar no “quanto pior melhor” é a tática dos que defendem, almejam e não abrem mão da perpetuação.

Esse país já foi o do jeitinho e da alegria, mas hoje não passa de uma nação esquecida pelo restante do planeta e avaliada como “praga” pelo mundo moderno. E não é para menos. Próximo de ultrapassar à marca de 500 mil mortos e, com beneplácito do governo, o Brasil continua na Idade da Pedra da medicina. Embora cientistas internos e externos afirmem, atestem e comprovem o contrário, a recomendação intervencionista não foi alterada. O presidente da República, alguns ministros, determinados militares, pouquíssimos médicos e apoiadores fanatizados e emburrecidos insistem no ineficaz e inútil tratamento precoce, cujos sinônimos são os medicamentos cloroquina, ivermectina e hidroxicloroquina, alguns comprovadamente ótimos para lombrigas e vermes menos agressivos.

Nesse mesmo Brasil, faz longos nove dias boa parte da população de duas importantes cidades está paralisada acompanhando a caçada a um psicopata que matou cinco pessoas e feriu outras tantas. Além de helicópteros, drones e equipamentos de última geração, são mobilizados cerca de 300 policiais civis e militares na busca de um único assassino. Via telejornais, o país assiste a todos os capítulos dessa perseguição solo e pode compará-la com o que quiser. Vimos e nos assustamos com o micro, mas ainda não movemos todas as palhas para evitar o pior no macro. Torcemos pela prisão de um homicida responsável por cinco mortes e, pelo menos temporariamente, esquecemos de crucificar ou responsabilizar uma pessoa (ou um grupo de pessoas) que não foi capaz de evitar 17,6 milhões de infectados e 493,6 mil óbitos.

Por tudo isso, não devemos criticar o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), para quem o bandido Lázaro Barbosa de Souza “vem fazendo as polícias do DF e de Goiás quase como bobas”. Entendo o esperneio do governador goiano Ronaldo Caiado, um dos maiores aliados do presidente Bolsonaro. O que não dá para entender é a tentativa de esconder inoperâncias com discursos ultrapassados e bajuladores. É mentira que um único fora da lei está driblando 300 policiais armados até os dentes faz nove dias? Pode ser uma analogia desproposital entre a doença que enfrentamos e a ineficiência das forças de segurança. No entanto, claro que há algo errado com uma polícia que costuma ser feroz apenas quando os abordados são inofensivos e indefesos cidadãos pobres ou de cor.

Essa polícia que chega atirando nos morros e agride um negro que se exercita ao ar livre é a mesma que leva um “baile” de um ex-presidiário com salvo conduto da Justiça para voltar às ruas e matar. Portanto, Ibaneis dessa vez não disse nenhuma besteira. O governador apenas deu eco à voz de milhões de brasileiros que também não encontram razões para que a Covid-19 continue fora da pauta do governo federal. É o resultado de nossa capacidade de mudarmos situações ou tratá-las de forma diferente. Faltam agendas positivas para os que perambulam pelo Palácio do Planalto. Não penso como os argentinos, que, mesmo na penúria quase absoluta, ainda se acham europeus. Todavia, 57 anos depois, bem que poderíamos mostrar alguma seriedade a Charles De Gaulle. Como? Tratando o vírus como ele deve ser tratado, vacinando e devolvendo ao povo a alegria que lhe é peculiar e, quando possível, prendendo Lázaro Barbosa, que, a exemplo do vírus, vem deixando o Brasil com as calças na mão.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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