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De matador fardado a senador sem nexo, PM paulista e Congresso têm de tudo um pouco

Com a imagem emoldurada e menos embaçada do que a de Jair Bolsonaro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, já tem o discurso pronto para a convocação de uma provável futura CPI do Congresso para investigar a covardia e os abusos em série da Polícia Militar paulista. Sem a necessidade de negociação prévia com a assessoria de imprensa, certamente ele dirá a deputados e senadores governistas que sua tropa de “patriotas” fardados e armados só está cumprindo o dever cívico de acabar com a parte que eles consideram mais desprezível da sociedade brasileira: os pobres, os negros e os ladrões de sabão e de iogurte.

Aos moribundos, mas ensandecidos parlamentares bolsonaristas, Tarcísio e seu secretário de Segurança, o deputado federal Guilherme Derrite, deverão informar (de pé e em continência) que as vítimas da matança oficial foram todas identificadas como comunistas, esquerdopatas e lulistas. Por isso, mereceram ser mortas a sangue frio ou jogadas no fundo dos córregos de esgoto. Obviamente que serão aplaudidos pelos senadores sem nexo, entre eles Jorge Seif (PL-SC), e pela verdadeira escória social, aquela que protege homens-bomba, golpistas de meia tigela, terroristas amadores e afanadores assumidos do dinheiro público. Tudo via PIX.

Para ilustrar, Jorge Seif é o senador que, além de defender, ironizou o macabro gesto do PM bandido. Segundo o parlamentar, o meliante (?) deveria ter sido jogado de um penhasco e não de uma ponte. Como cidadão que tem ojeriza pela maioria do Parlamento, digo ao senador que, caso a lei determinasse que todo suspeito fosse jogado de um penhasco, faltariam penhascos para suas excelências. Diria mais. Se o senador em questão estivesse na lista, poucos brasileiros sentiriam sua falta. Curioso, mas, considerando os ricos como sonegadores contumazes, o segmento social que o bolsonarismo combate e mata é justamente o que para impostos em dia, consequentemente o que mais contribui para encher os cofres dos governos federal e estaduais, principalmente o de São Paulo.

É com o dinheiro suado das minorias que os maus policiais que usam a farda e o revólver do Estado para matar são regiamente pagos. Normalmente em “legítima defesa”, eles matam e somente após o enterro é que perguntam o nome, endereço e a filiação partidária do indigitado. Cobrados pelo Ministério Público ou pelos organismos que prezam pelo cumprimento da lei, os comandantes, subcomandantes e os demais defensores da barbárie da PM paulista não se fazem de rogados. Objetivamente corporativos, eles repetem o mantra dos cruéis: “São erros pessoais e pontuais. Esse tipo de conduta constrange a corporação. Não é que ensinamos”. E daí? Nada de punição.

No máximo, os amiguinhos fardados do senador catarinense somem temporariamente das ruas. Voltam depois que a poeira se dissipa e, na primeira incursão em uma comunidade de gente humilde, novamente batem, xingam e matam pelas costas. Reincidente, o policial que jogou o rapaz da ponte já foi indiciado por matar um motoqueiro com 11 tiros. Mais uma vez em “legítima defesa”.

A pergunta que o senador não faz a si mesmo, mas os PMs devem fazer aos PMs, é a mesma em qualquer parte do Brasil: “Com quantos pobres se faz um rico?”. Pouco importam as respostas, na medida em que a justiça interna impõe matar sempre em legítima defesa e em nome da liberdade, da pátria e da família.

Os familiares enlutados e órfãos que se danem. Não podem nem mesmo procurar a Polícia para fazer um BO. A queixa pode significar prisão sem direito a fiança. Morro de curiosidade para saber o que está escrito no regimento interno da PM paulista e no de todas as demais? Quem sabe algo como Nós é a puliça. Nós num mata. Nós só atira e joga ponte abaixo. Quem mata é as mão de Deus. Pode ser alguma coisa muito pior. Talvez “Aos ricos, o favor da lei, aos pobres, o rigor da lei”.

E tome-lhe pau porque, embora seja um país onde os pobres morrem de fome de balas perdidas dos perdidos policiais militares, os ricos morrem de medo dos pobres.

Eis a razão pela qual o rico tenta de tudo para impedir o pobre de votar. E se o pobre consegue votar ou ele vira comunista ou acaba vítima preferencial dos que adoram fazer escolta armada para quem tem muito dinheiro, com destaque para o senhor Jorge Seif, um exemplo vivo da boçalidade parlamentar. E pouco importa a origem da riqueza. Imaginem Tarcísio de Freitas na Presidência da República. Provavelmente, Bolsonaro seria o ministro da Justiça e Jorge Seif o corregedor-geral das PMs do país. Como Deus não dá asas às cobras, essa possibilidade é utópica. O mais hediondo é a certeza de que, fardados ou não, com mandatos ou não, os “patriotas” odeiam os filósofos que teimam em afirmar que um dia todos serão iguais. Torço para que nesse dia o senador que adora demonizar os corretos e a se solidarizar com bandidos fardados esteja sentado do lado direito do capetão.

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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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