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Sacanagem oficializada

Decreto do deus estabelece a barbárie e a ignorância no Brasil

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior* - Foto de Arquivo

A profecia está cumprida. E muito antes do que imaginavam as pessoas de bem. O santo do pau oco desceu à terra e, por meio de uma canetada, decretou o vale tudo entre nós. Também incluiu mais dois mandamentos à Bíblia Sagrada, terrivelmente diferente da que é lida por representantes de segmentos religiosos impregnados de similares de Barrabás. Aliás, o malfeitor liberado em lugar de Jesus Cristo se materializou na Praça dos Três Poderes, menos de 24 horas após ter sido condenado por ameaças a ministros do Judiciário. Pois agora, além de ameaçar qualquer um, fica decretado que o brasileiro de qualquer estrato social pode se insurgir contra as instituições e descumprir lei judicial.

Foi o que fez o réu confesso perdoado por sua excelência, denominado a partir de agora o novo deus do mundo. Prerrogativa do presidente da República para extinguir a condenação de uma pessoa, o instituto da graça não é só uma decisão surreal. É um deboche, um tapa na cara de todos os cidadãos cumpridores de leis, principalmente daqueles que tentavam (ou teimavam) em ver alguma seriedade no reino dos céus comandado pelo deus supremo do horror. Pior foi o chute no saco dos ministros do Supremo Tribunal Federal que, bonzinhos ou judas como quem os acusa, condenaram um parlamentar que não honra os votos de seus eleitores.

Como desde essa quinta-feira (21) também me acho resguardado pela “inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição”, posso afirmar que está decretada a sacanagem no país. Considerado uma “notícia de extrema importância para nossa democracia e liberdade”, o perdão ao deputado musculoso, mas sem tutano, condena o Brasil à barbárie, à selvageria, à estupidez, à incivilidade, à ignorância. Será o verdadeiro bundalelê. Nas entrelinhas, o decreto presidencial estabelece em seu artigo justificador que a República de Bananas agora é oficialmente uma terra sem lei.

Está implícito que só será considerado fora do tom xingamentos à mãe, tida e havida como santa, independentemente de seus eventuais afazeres extramuros. Não bastasse um mandatário desprovido de condições técnica, emocional e política para governar uma nação de 203 milhões de pessoas, os eleitores sensatos, corretos e do bem serão obrigados a reconhecer e tolerar como normal a presença de desqualificados no Congresso Nacional. Descontados os que não sabem o que estão fazendo nas duas casas de leis, são muitos. Infelizmente a maioria.

Inspirado na canção Águas de Março, de Tom Jobim, talvez seja o momento de eu mesmo decretar: “É o pau, é a pedra, é o fim do caminho. É um resto de toco…É um caco de vidro…É a noite…É a morte”. E o que dirão os paladinos da moralidade? Como reagirão os arautos da honestidade? Já disseram e já reagiram. Certamente em nome daqueles religiosos que cultuam um deus diferente do meu e da maioria do povo, o pastor Silas Malafaia – sempre ele – e os propagadores do caos atacaram André Mendonça, o ministro terrivelmente evangélico, apenas porque ele (o novo ministro do STF) foi um dos dez votos que condenaram o indefensável diputado (com i mesmo).

Como já escrevi neste espaço, estamos entregues às baratas. Difícil entender, mas fácil imaginar como a mente doentia da turba defensora do quanto pior, melhor ainda consegue descansar serenamente após mais um ataque mortal à democracia. É fácil imaginar e mais fácil ainda responder. Para eles, o povo que se exploda. Literalmente, estão cagando para o Brasil. E viva a sacanagem! Para sorte dos bons, um dia a casa cai. A pergunta que pode ser antecipada é a seguinte: em caso de derrota nas urnas, no tapetão e nas ruas, quem perdoará o mito? Só o Deus verdadeiro saberá.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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