Beatriz Bulla, Fabio Serapião
Há cerca de dois meses o empresário Joesley Batista entregou à Procuradoria-Geral da República (PGR) quatro áudios. De acordo com os procuradores, no arquivo estavam a conversa com o presidente Michel Temer, um diálogo com o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) e dois encontros com o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), apontado como interlocutor de Temer.
Procuradores que participaram da negociação de delação da J&F dizem ter avisado a Joesley que, a partir daquele momento, nada mais poderia ser feito sem a participação do Ministério Público
No acordo, definiram que seriam realizadas ações controladas a fim de tentar comprovar o cometimento de crimes. Entre estas ações, novas gravações. As captações ambientais foram autorizadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, segundo os investigadores.
“Não é ilegal (fazer uma gravação), mas a partir do momento em que isso é comunicado à PGR e o crime está em andamento, é preciso fazer de acordo com os termos da lei”, afirmou um investigador que participou das negociações, em caráter reservado.
Fachin e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tiveram ao menos quatro encontros na fase final do acordo dos irmãos da JBS, segundo a agenda oficial do magistrado. Um deles, no dia 2 de maio, quando o ministro autorizou a abertura de inquérito contra o presidente da República. A autorização foi mantida em sigilo.
Para investigadores, a parte mais grave dos relatos envolvendo o presidente é a indicação de Rocha Loures como seu interlocutor e, posteriormente, o recebimento de dinheiro pelo deputado em troca de influência em áreas do governo.
O pedido de abertura de investigação de Temer foi encaminhado pela PGR quase um mês antes da assinatura dos acordos de delação, procedimento incomum na Lava Jato. A razão para isso era o fato de que havia a suspeita de que crimes estivessem ainda acontecendo. Por isso, justificam procuradores, a rapidez com que todo o procedimento foi feito no caso JBS.
Joesley e Wesley Batista e o diretor da J&F Ricardo Saud assinaram o pré-acordo de delação em 7 de abril com a PGR. O acordo final foi assinado em 3 de maio e homologado por Fachin no dia 11.
Acordo – As multas individuais estabelecidas no acordo são de R$ 110 milhões para Joesley Batista e mais R$ 110 milhões para o irmão, Wesley. Saud irá pagar R$ 2 milhões. Agora, a empresa precisa fechar seu acordo de leniência com o Ministério Público Federal, que tenta cobrar R$ 11 bilhões da J&F pelos crimes cometidos.
Investigadores consideram alta a multa individual estabelecida aos irmãos JBS, comparando com o que foi estabelecido para Marcelo Odebrecht, por exemplo. Os termos do acordo do herdeiro do grupo Odebrecht permanecem em sigilo, mas fontes com acesso ao caso apontam que a multa paga por Marcelo é de R$ 70 milhões. A Odebrecht e a Braskem negociaram, na leniência, pagar R$ 6,8 bilhões.
De acordo com procuradores envolvidos no caso, em termos de efetividade de provas, a delação da JBS é a mais contundente da Lava Jato. Lembram que no caso da Odebrecht, por exemplo, a empresa tentou o quanto conseguiu obstruir as investigações e entregou apenas fatos passados.
Por isso e pelo fato de os executivos da JBS concordarem em participar de ações controladas – consideradas de alto risco, pois fatos criminosos são gravados -, os delatores recebem uma pena mais branda. Eles não precisarão ficar na cadeia e a PGR abriu mão de denunciá-los à Justiça.
Refúgio – Em razão do risco e dos personagens envolvidos – a alta cúpula política do País -, os delatores podem permanecer no exterior. Joesley e Saud estão nos Estados Unidos. Durante as negociações, o diretor era o que demonstrava estar mais preocupado com riscos à sua segurança pessoal.
Apenas sete pessoas do grupo, entre elas os dois irmãos, participaram da delação. Número baixo, se comparado aos 77 delatores da Odebrecht. Mas os delatores da JBS devem entregar, pelos termos do acordo, em até 120 dias, uma lista de conselheiros, empregados e prepostos que também possam colaborar com as investigações do Ministério Público Federal.
A forma de organização da empresa, no entanto, é diferente da Odebrecht. Nos depoimentos à PGR, Joesley relata que tinha por hábito resolver, ele mesmo, questões da empresa.
Para investigadores, a JBS mostrou ter uma cultura de empresa mais concentrada no chefe, enquanto a Odebrecht profissionalizou em um setor o pagamento de propinas – o Setor de Operações Estruturadas.