Poderes paralelos
Deputado alerta que Brasil caminha para dias de fúria
Publicado
emRaimundo Ribeiro*
A banda Ira! conclamou na década de 80, quando saímos de processo ditatorial, que era preciso dias de luta. E que só depois de muito tempo é que se começou a entender o que vinha acontecendo naqueles dias sombrios de um estado de exceção. E se perguntava: Como será meu futuro, como será o seu?
Vivemos atualmente um momento obscuro e perigoso na nossa história. Os candidatos a ditadores agora são outros. Não usam armas pesadas, tampouco fardas. São gravações vazias e ilegais, ternos engomados e power-points. Se vivemos dias de luta para conquistar nossa democracia, estamos muito próximos de viver dias de fúria. Tempos estranhos.
O professor Henrique Finco, doutorado em Literatura pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mestrado em Antropologia Social pela UFSC e graduado em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), fez um alerta importante.
Finco descreveu o seu sentimento ao chegar do velório do também professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, magnífico reitor da UFSC. Ele classificou como mais uma das arbitrariedades cometidas no Brasil, onde o ônus da prova passou a ser do acusado e onde proliferam linchamentos e justiceiros.
Cancellier, pessoa de modestas posses, foi preso espetaculosamente, humilhado e condenado de público, sem direito à defesa. Para pagar um advogado, o reitor estava procurando um empréstimo e tratava de vender uma moto de sua propriedade.
Segundo Finco, a indignação é grande com o que aconteceu – e o consenso é o de que além de ter atingido mortalmente o reitor a espetaculosa “Operação Ouvidos Moucos” também visou atingir a Universidade.
Quero aqui fazer minhas as palavras do professor Finco e demonstrar toda a indignação contra esses abusos de tiranos fantasiados de autoridades. Quem deu autoridade a essas pessoas para assassinarem reputações, prostituirem o processo legal e produzirem esse sentimento de injustiça e impotência na sociedade? Infelizmente estamos muito próximo do dia de fúria.
Cancellier padeceu sob o abuso de autoridade, seja em relação ao decreto de prisão temporária contra si expedido, seja em relação à imposição de afastamento do exercício do mandato, causas eficientes do dano psicológico que o levaram a tirar a própria vida.
O rumo que o nosso país está tomando é muito perigoso. É necessário respeitar o devido processo legal, e indispensável a apuração das responsabilidades civis, criminais e administrativas das “autoridades” que produziram o cadáver de um professor que combatia a tirania com flores nas mãos.
O procurador-geral do Estado de SC, João dos Passos Martins Neto, lembrou que o legado do professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo seja, em meio a tantos outros bens que nos deixou, também o de ter exposto ao país “a perversidade de um sistema de justiça criminal sedento de luz e fama, especializado em antecipar penas e martirizar inocentes, sob o falso pretexto de garantir a eficácia de suas investigações”.
A OAB-SC também repudiou publicamente a forma draconiana como se tratou Cancellier. É chegada a hora da sociedade brasileira e da comunidade jurídica debaterem seriamente a forma espetaculosa e midiática como são realizadas as prisões provisórias no Brasil, antes sequer da oitiva dos acusados.
Reputações construídas duramente ao longo de anos de trabalho e sacrifícios podem ser completamente destruídas numa unica manchete de jornal. Para pessoas inocentes, o prejuízo é irreparável. Cabe-lhes a vergonha, a dor, o sentimento de injustiça. O peso destes sentimentos pode ser insuportável.
E agora? O que farão com o cadáver do reitor assassinado por uma aliança adúltera, incestuosa e prostituta, que uniu parte de uma mídia “comercial” de comunicação e servidores públicos que deveriam combater crimes, mas embalados pela vaidade, arrogância e prepotência típica dos insensíveis e ignorantes preferem usar indevidamente poderes que não lhes foram atribuídos para, a pretexto de combater o crime, cometê-los.
Quem terá coragem de punir os assassinos do reitor?
* Raimundo Ribeiro é advogado da União aposentado, deputado distrital pelo PPS e Terceiro Secretário da Câmara Legislativa do Distrito Federal