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Carta da sobrinha

Detetive esbarra em cão na busca por Meia Morte

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Mal cheguei àquele bairro afastado de Aracaju, procurei informações a respeito do sujeito. Abordei um velho, que me disse que morava por ali desde antes da volta da democracia. Ele coçou o queixo proeminente, enquanto pensou por um instante.

— Antônio Carlos Gomes Freire? Não conheço, não, senhor.

— Tem certeza?

— Tenho, sim, senhor.

Saquei uma fotografia do bolso e entreguei para o homem, que sorriu aquele sorriso desprovido de um dos dentes da frente.

— Ah, bom! O senhor tá procurando o Meia Morte.

— Meia Morte?

— É como o chamamos por aqui. Mas por que é mesmo que o senhor tá procurando o Meia Morte? Ele está devendo algum dinheiro pro senhor?

— Não, não. É que uma parenta dele quer saber por onde ele anda.

— Parenta? Que parenta?

— Uma sobrinha.

— Se é sobrinha, deve ser filha de irmã ou irmão do Meia Morte.

— Irmã.

— Nem sabia que o Meia Morte tinha irmã. Pois veja como são as coisas, fui saber disso pelo senhor.

— Pois é. Sabe onde posso encontrá-lo?

— Sei, sim, senhor.

— Onde?

— Dobre aquela esquina. O senhor vai ver um barraco. Não tem erro. Tem um cachorro que não sai da porta. Tinhoso, mas não precisa assustar. O danado só late, se bem que quase me mordeu o calcanhar na semana passada.

— É vacinado?

— Sou, sim.

— Digo o cachorro.

— Num sei. Mas não precisa se preocupar. Aquele bicho não morde gente da polícia.

— Não sou policial.

— Mas parece. O cachorro não vai perceber.

Agradeci pela informação e fui até o barraco do Meia Morte. Lá estava o cachorro em frente à porta. Ele me olhou com aqueles olhos esbugalhados, mas se afastou sem me mostrar os dentes. O velho tinha razão, devo ter mesmo pinta de policial.

Não tardou, Meia Morte apareceu. Apesar de ser quase hora do almoço, o homem parecia ter acabado de acordar. Ele me perguntou o que eu queria. Entreguei-lhe a carta da sobrinha, onde ela dizia que a mãe havia falecido. Meia Morte, após ler a missiva, entrou e fechou a porta.

Ainda fiquei por ali durante um tempo, até que o cachorro voltou a se postar diante da porta. Fui embora antes que o bicho descobrisse que sou detetive particular e não tira.

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