Críticas e elogios são questões inerentes a todo e qualquer ser humano, independentemente de classe, gênero, posição social e cargo que ocupa. Tudo é suportável desde que não haja xingamentos, ameaças e tentativas de agressão. Presidente por acaso, Jair Bolsonaro não conseguiria passar do primeiro metro de um hipotético queridômetro. Não vem ao caso. Não lembro de um representante da elite dos três poderes mais achincalhado do que o ministro Alexandre de Moraes, ora acumulando uma cadeira no Supremo Tribunal Federal com a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, a casa das urnas eletrônicas. Em escala um pouco menor, também foram vítimas dos insanos de plantão os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin. Sem a necessidade de discutir mérito, a meu ver a atuação do trio foi lapidar, além de fundamental para que o Brasil se mantivesse nos trilhos da ordem, da constitucionalidade, das leis e da democracia plena. Eles garantiram a eleição de Lula da Silva.
Contra a vontade dos patriotas de araque, Barroso, Fachin e, mais enfaticamente, o xerife Xandão conduziram as eleições presidenciais com mão de ferro, mostrando aos negacionistas e ao mundo que, mais do que inviolável, o sistema eleitoral eletrônico do Brasil é sério, limpo, inquestionavelmente acima de qualquer suspeita e, por conseguinte, imune a fraudes. Com sua reluzente calvície e sem medo de ter medo, o ministro mostrou à turma do ódio que não estava – e não está – para brincadeiras. Com todas as letras, inicialmente redigiu e publicou decisões cristalinas acerca de uma máxima que os bolsonaristas, sobretudo os raiz, deveriam ter aprendido quando crianças: se você não sabe brincar, não desça para o play. Como poucos entenderam o recado, houve a necessidade de falar mais grosso. E Xandão não se intimidou.
Absolutamente amparado nas normas do Estado Democrático de Direito, mandou prender incitadores da violência armada, silenciar blogs e alijar do contexto quem não tinha limites. Sua determinação também impediu que o gado fugisse do curral e debandasse de vez. Na hipótese menos radical, evitou estragos maiores, entre eles o descarrilamento do país, a transformação do mito em um sheik de coturno, jaquetão verde oliva e baioneta, a banalização da fome e da morte, a consolidação do Gabinete do Ódio, fomentador das desonestas fake news e, de modo mais grosseiro, o golpe que estava sendo articulado dentro e no entorno dos gabinetes palacianos. A lista de feitos de efeito do ministro Alexandre de Moraes contra os desmandos do governo que se finda é interminável.
Na linha de frente do pelotão formado para conter os ímpetos do tenente, Xandão, inimigo números Zero, Zero 1, Zero 2, Zero 3 e Zero 4 dos bolsonaristas, acabou colocado no cadafalso por aqueles que se imaginavam donos do Brasil, consequentemente acima das leis, dos bons costumes e da paz. Felizmente, a empáfia e a desordem duraram pouco. Os que não conseguiram se eleger para os governos estaduais, Câmara Federal, Senado e assembleias legislativas têm pesadelos com o futuro fora do poder. Por isso, sonham acordados e diariamente com o impeachment de Moraes e de outros magistrados que se insurgiram contra a insanidade de um governo que jamais se mostrou respeitoso ou respeitador.
Por exemplo, é impossível esquecer do deboche presidencial de quem estava morrendo por falta de oxigênio. Quem não se lembra do desmonte dos órgãos de fiscalização do patrimônio natural e do engodo do Estatuto do Desarmamento? E qual era o objetivo? Facilitar a ação de quadrilhas na destruição da Floresta Amazônica e das terras indígenas, e a compra de armas de todos os tipos por tipos fora da lei. E o orçamento secreto? No que dependia do Supremo, ele foi escandalosamente escancarado. Embora com intenções nada republicanas, a intervenção na Polícia Federal e o sigilo de 100 anos sobre questões nebulosas foi outra brincadeira protagonizada pelo quase emir Bolsonaro.
Chacotas à parte, Xandão levou a sério todas as sandices que ouviu e enfrentou. Acho que, depois de a ficha ter caído, Jair Messias também se tocou. Tanto que se calou desde que perdeu. O silêncio incomum se fez ecoar até mesmo entre os seus, isto é, os quartéis, nos quais participou de algumas solenidades nessas últimas semanas. A razão do silêncio é a preocupação com qualquer fala que desagrade ao ministro ou à Justiça. Em outras palavras, quem tem o “O” tem medo. E todos sabem da tensão de Bolsonaro quando ouve o nome de Xandão. Portanto, melhor calar-se a correr o risco de um novo (o quinto) inquérito do STF. Que os simpatizantes do presidente em fim de mandato permaneçam insanos. É um direito deles. Que pelo menos não nos apoquente. Ser livre, viver sem arbitrariedades, sem masmorras e sem o chumbo dos fuzis também é um direito nosso. Mesmo daltônico, sei que o diabo vestia verde e amarelo, mas agora veste vermelho e vai governar para todos. Xandão estará de olho.