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Bola ou búlica

Direita cresceu, mas precisa de atores para ir ao palco presidencial

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Mathuzalém Júnior - Foto Antônio Cruz/ABr

Do mesmo modo que as chances de reverter uma vasectomia são remotíssimas, quase nulas, a probabilidade de Jair Bolsonaro obter sucesso e reverter a inelegibilidade que lhe foi imposta em julgamento histórico do Tribunal Superior Eleitoral é inferior a zero. Embora analistas e juristas simpáticos à causa bolsonarista e, por isso, suspeitos, insistam em mostrar caminhos para a reversão, qualquer leigo em imbróglios eleitorais sabe que todas as tentativas de mudar o quadro serão infrutíferas. Não à toa, Ricardo Nunes (MDB), candidato à reeleição na capital paulista, preferiu ficar só na disputa contra Guilherme Boulos (Psol) e Pablo Marçal (PRTB).

Escolha acertada. Comprovando a tese de que, melhor sozinho do que mal acompanhado, Nunes ganhou mais ou menos no primeiro turno e deverá vencer com folga no segundo. Um de seus maiores aliados, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) não terá a mesma sorte caso resolva enfrentar Luiz Inácio nas eleições presidenciais de 2026. Com Jair Messias inelegível, ele ainda é o melhor nome para concorrer, sem igualdade de condições, com Lula. Supostos aliados, Ronaldo Caiado (União Brasil), Romeu Zema (Novo) e Ratinho Junior (PSD), entre outros menos votados, são café pequeno, algo como traques de festas juninas em dias chuvosos.

Para Tarcísio, é bola ou búlica. Apesar do inquestionável avanço da direita nos municípios, o ringue da eleição para o Palácio do Planalto naturalmente envolve lutadores mais credenciados. Como o sarrafo é bem mais alto, o DNA político de periferia é insuficiente. Gritos histéricos no rádio e na televisão, missas em ação de graça, quermesses em igrejas ou feijoadas sem paio não elegem presidentes. Radicalizar o discurso, latir em coretos ou em cima de trios elétricos também não transformam o pet da cidade em ídolo nacional. É preciso coragem, força, ideias e propostas no mínimo iguais àquelas com as quais convivemos.

São poucas, mas são as que temos. Comparadas às que não tivemos, são demasiadas. Resumindo, muita água ainda vai rolar sob as pontes da direita e da esquerda. No entanto, avaliando o hoje e o agora, mesmo que Tarcísio de Freitas se fantasie de capitão, perderá feio para Lula da Silva, provavelmente o candidato dos que defendem a democracia. Fosse ele, eu esperaria 2030, disputaria e ganharia fácil mais um mandato de governador São Paulo em 2026. Ele e boa parte do Brasil acham que Lula não é mais o mesmo. Verdade nua e crua.

O atual presidente envelheceu, vem acumulando derrotas para a direita do Congresso, mas não se pode descartar a força de um cidadão que ocupa pela terceira vez o cargo mais alto da República. No cenário atual, mais relevante é a ausência de alguém capaz de afirmar e confirmar que o governo Lula é pior do que foi o de Bolsonaro. Ou seja, ruim com ele, pior sem ele. Caso Tarcísio de Freitas decida dar um tiro no próprio pé e partir para o cadafalso, a hipótese mais óbvia é de que ele marche como soldado ao lado do capitão. O risco do governador ficar a reboque é grande.

Jair Messias certamente não perderá a oportunidade de dar botinadas nas partes íntimas de Luiz Inácio, como fez durante toda a campanha de 2022. Perdeu pelos abusos e pelo que deixou de dizer de interessante aos ouvidos do eleitor pendular. É cedo, mas até o momento a direita vencedora das eleições municipais não dispõe de atores de peso para peitar Lula no palco presidencial. Portanto, nacionalmente deverá morrer na praia, pois falta aos seus densidade, carisma e conhecimento do país. Se depender de Bolsonaro, ele será o adversário de Lula. Diante dessa impossibilidade real, resta às lideranças da direita atentar para a máxima de Nelson Rodrigues sobre um dos maiores clássicos do futebol brasileiro: “A morte não é desculpa para deixar de ver o Fla-Flu”.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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