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Disputa por verba coloca os movimentos dos sem-teto de São Paulo em lados opostos

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Pablo Pereira

O Movimento dos Trabalhadores Sem-teto (MTST) não é um movimento social que faz pressão somente por habitação. É um movimento político, que luta pelo socialismo e que, embora critique a atual política econômica do governo federal, está engajado na defesa do mandato de Dilma Rousseff por considerá-la ameaçada pelo pedido de impeachment em discussão no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF).

A avaliação, feita na semana passada pelo principal líder nacional do MTST, Guilherme Boulos, minutos antes da maior manifestação do ano a favor de Dilma, na Avenida Paulista, deixa clara a posição do movimento que batalha pela manutenção e ampliação do acesso às verbas do Minha Casa Minha Vida (MCMV).

Com novas áreas à espera de recursos do MCMV, como Novo Pinheirinho (Santo André), Dona Deda (Campo Limpo), Nova Palestina (zona sul), o MTST já conta com terreno da Copa do Povo, em Itaquera, comprado da Viver Incorporadora, que tem prevista a construção de 2.650 unidades. O dinheiro, segundo o Ministério das Cidades, já está destinado à Associação de Moradores do Acampamento Esperança de Um Novo Milênio, do MTST. A bagatela de R$ 201,4 milhões pode chegar até R$ 307,4 milhões com o acréscimo, por unidade, de R$ 20 mil do programa estadual Casa Paulista, e mais R$ 20 mil do programa municipal Casa Paulistana, da Prefeitura.

“Mas isso ainda é só plano. Não existe esse dinheiro”, diz Boulos, explicando que o único empreendimento concluído e entregue do MTST é o Condomínio João Cândido, no Taboão. Ali, o aposentado José Ferreira da Silva, de 67 anos, mora com a mulher, Maria Costa Gomes, de 70 anos, em um apartamento de 63 m², assoalho de azulejos brancos, portas adaptadas para necessidades especiais, com três dormitórios, sala, cozinha, área de serviço, sacadinha em prédio com elevador.

Um cálculo feito na Secretaria Estadual da Habitação, em planilhas de 2012 e 2015, mostra que o MTST já recebeu R$ 81,3 milhões pelo MCMV Entidades no Estado. “O MTST não recebe um centavo porque o dinheiro é repassado direto para o dono do terreno”, rebate ele.

Segundo a secretaria, há uma lista de 29 entidades com recursos para habitação, totalizando R$ 307,7 milhões. E o MTST, sozinho, segundo os dados, detém um quarto dos recursos para construção de 3.944 unidades. “Além do João Cândido, o único recurso liberado foi o do Copa do Povo, comprado por R$ 28 milhões”, afirma Boulos.

O Copa do Povo foi ocupado pelo MTST em maio de 2014. Era uma zona de produção industrial (ZPI), que proibia a construção de residências. Uma lei municipal foi criada para que a área pudesse entrar no programa. “Curiosamente, foi o vereador Police Neto (PSD), que teve até boneco queimado pelo MTST, que negociou a alteração que beneficiou o movimento”, disse um especialista em habitação da Câmara.

Oposição – A política de atuação do MTST, além das práticas de pressão, como invasões de prédios e terrenos (públicos ou privados) para usá-los como ferramenta da militância contra estruturas de governo, intensificada na capital nos últimos três anos, começam a sofrer forte oposição na periferia.

“Nós não concordamos com os métodos do MTST”, diz Rosalvo Salgueiro, dirigente do Movimento Terra de Deus, de São Miguel Paulista, zona leste. Ligado ao PSDB e com acesso livre ao governador Geraldo Alckmin (PSDB), Salgueiro é hoje um contraponto ao MTST na disputa que ocorre nas periferias da capital e região metropolitana por terrenos para construção de casas pelas regras do MCMV Entidades.

Por esta modalidade, que já tem 848 entidades habilitadas no Ministério das Cidades, associações de moradores e movimentos sociais “concorrem” pelo dinheiro com incorporadoras e podem obter recursos para os próprios empreendimentos, financiados pela Caixa.

“Nós não concordamos com invasão dos terrenos e nem com o uso dessas áreas como prioridade no MCMV”, declara Salgueiro, um dos articuladores da criação de uma lista única de áreas para acesso aos recursos dos programas MCMV e da Casa Paulista, o programa estadual. Essa medida já foi aprovada em novembro no Conselho Estadual de Habitação e deve começar a ser aplicada em 2016. Pela regra da fila, apoiada por exemplo pelo secretário estadual, Rodrigo Garcia, os projetos de habitação no Estado terão de seguir critérios claros.

Primeiro, estar entre projetos do CDHU que estão migrando para o MCMV, com prioridade pelo sistema de chamamento. Depois, obedecer a ordem dos que já estão credenciados na Caixa, que seriam entre 7 mil e 8 mil unidades, além de projetos que já estão em análise.
Só aí estariam habilitados a receber a contrapartida de R$ 20 mil do Estado por unidade por meio do Casa Paulista, alcançando os R$ 96 mil aplicados na construção por unidade – o governo federal aporta R$ 76 mil. Já o MTST não quer nem saber de criação de lista. “Se o governo de São Paulo fizer isso, vai paralisar a construção de habitação”, diz Boulos. “Aí vamos acampar no Palácio”.

Tensão – Para o dirigente dos Sem Terra de Deus, o MTST “atropela” outros movimentos de moradia operando em Brasília e “indicando gente para o setor de habitação da Caixa, que aprova os projetos do MTST na frente dos de outros”. Salgueiro afirma que Boulos tem acesso direto ao Planalto porque é ligado ao PT. “Temos hoje dois blocos no movimento popular: um, que se diz socialista, alinhado com o PT e o governo federal. É nesse que está o Boulos”, diz. “Nós estamos no outro bloco, o dos social-democratas.”

A tensão entre os movimentos em São Paulo, acirrada pelo clima de desgaste dos governistas e reforço da oposição ao PT não é de agora. “Nós tínhamos um terreno no Embu, o João Paulo 1.º, que era CDHU, destinado para nós. Eles (do MTST) foram lá ocupar a área que era nossa”, diz Salgueiro. “Peguei o nosso pessoal e tiramos eles no pau”, arremata o líder dos sem-teto dos tucanos

No MTST, quando se trata de críticas a Salgueiro, a conversa é desconversar. “Nós não brigamos com outros movimentos”, diz um dos dirigentes de uma associação do movimento.

estadao

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