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Divã de Poa para Brasília, com Chengulo e as netas

Desde muito cedo, ganhei gosto por estradas. É que meu pai, cheio de ímpetos, não raro, me cutucava de madrugada e me falava: “Acorda, Edu! Que tal irmos para Cabo Frio?” Ainda sonolento e, provavelmente, com os olhos cheios de remela, apenas concordava com movimentos de cabeça.

E lá íamos para a aprazível cidade litorânea ou, então, para outro destino que meu pai decidisse de última hora. Quase sempre finalzinho da noite ou madrugada adentro. Meu pai me incutiu tal hábito, como a me mostrar que a solidão nas estradas nos faz pensar na vida e sentir que há muito mais coisas além de trabalho e contas para pagar.

Pois bem, eis que, nesses dias, resolvi fazer uma viagem entre Porto Alegre e Brasília. Meus companheiros nessa saga foram o meu velho parceiro Chengulo e suas netinhas, a Bebel e a Clarinha. Isso mesmo, entulhei o carro da minha esposa, a Dona Irene, de fraldas e seguimos viagem justamente numa madrugada. Pra que tanta fralda? São da Malulinha, minha pequenina filha, que, ainda muito nova para pegar a estrada, embarcou num avião com a minha mulher.

Liguei o ar-condicionado no máximo, pois meus amigos, ao contrário de mim, são muito calorentos, o que os manteve dormindo por grande parte do percurso. E, a cada parada que fazíamos para esticar as pernas, eu percebia olhares curiosos das pessoas. Na certa, alguns deveriam pensar: “Que maluco viaja com três cachorros?”

Depois de rodarmos mais de 1.300 quilômetros, meus buldogues e eu paramos num motel de beira de estrada em Porto Ferreira, São Paulo. Estávamos cansados, especialmente o Chengulo e eu, que somos os mais vividos da trupe. O meu amigo foi se deitar e, não demorou, já era possível ouvir aquele ronco tão costumeiro aos meus ouvidos.

Tomei um banho bem quente e caí praticamente desfalecido na ampla cama, enquanto a Bebel e a Clarinha ainda exploravam aquele ambiente estranho. Não sei a que horas elas foram dormir, mas, já na manhã seguinte, as encontrei roncando sobre as minhas pernas.

Liguei na recepção e pedi café e nada mais. Aliás, café sem açúcar, pois de doce já basta a vida! Em seguida, tomei aquela ducha quente, paguei pela hospedagem e voltamos para a estrada, que já nos esperava com saudade.

Chegamos a Brasília por volta das 16h, onde encontramos a Dona Irene e a Malulinha, que nos receberam com aquele sorriso tão acolhedor. A minha esposa, com quem já viajei por inúmeras estradas por este Brasil e até para o Uruguai, olhou para mim e disse: “Edu, queria ter vindo com vocês!”

Finalmente, olhei para o Chengulo, que, apesar de cansado, também me sorriu. Não sei se essa foi a nossa última viagem juntos. Se estamos velhos para tais estripulias? Talvez. Seja como for, enquanto escrevo esta crônica, ouço o ronco inconfundível do Chengulo. E, pela cara do meu companheiro para o que der e vier, estou certo de que logo, logo estaremos de volta à estrada.

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