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Dona Irene manda apostar na fé e a Ponte do Adeus fica para trás

Há alguns anos, a minha mulher e eu tivemos uma pequena fazenda no interior de Goiás, onde passávamos vários finais de semana e feriados curtindo a natureza e os animais que criávamos. Foi uma época muito aventureira, onde passamos por cada situação, que eu teria que montar um catálogo apenas para contar todos os acontecimentos. Mas, enquanto isso não acontece, aqui vai uma história bem curiosa.

Pois bem, lá estávamos a Dona Irene e eu retornando de mais um tempo na roça. Nessa época tínhamos uma camionete bem velha, que chamávamos de Manoelito. Já era noite, quando percebemos um enorme engarrafamento na estrada, que depois soubemos tinha sido provocado por um acidente. A minha mulher, esperta como ela só, observou que logo ali muitos veículos estavam tomando um desvio de terra para fugir do trânsito completamente parado.

Criamos coragem e seguimos o fluxo, mesmo não tendo certeza para onde aquilo iria nos levar, ainda mais porque tudo logo ficou muito escuro, e uma chuva relativamente forte só piorou a situação. Mas continuamos firmes, já que, apesar de velho, o Manoelito possuía tração nas quatro rodas e era bem confiável, ainda mais em estrada de chão. Estávamos muito mais preparados para aquele desafio do que aqueles carros de passeio que acompanhávamos.

Apesar dos solavancos, íamos resistindo bravamente, até que percebemos um pequeno engarrafamento à nossa frente. Todavia, aos poucos, os veículos voltaram a se mover, mas não com a velocidade de antes. É que havia uma ponte, aliás, ponte é uma maneira meio imprecisa de nomear aquele pequeno amontoado de madeiras sobrepostas sobre um riacho que ficava a mais ou menos três metros da pista. Seja como for, todos os veículos, um a um, haviam conseguido transpor aquele perigo, que, no nosso caso, nos parecia muito maior, haja vista o Manoelito pesar quase o dobro daqueles automóveis. Isso me fez parar diante daquela tal ponte, onde tive que verificar se as rodas da camionete estavam mesmo alinhadas com as madeiras, pois, caso não estivessem, a queda seria certa.

Tudo parecia certo quando, de repente, ouço a porta da Dona Irene se abrir e a vejo descendo do Manoelito. Ela simplesmente olhou para mim e disse:

— Vá na fé!

A minha esposa conseguiu atravessar a pé a tal ponte e, toda confiante como aqueles caras com aquelas bandeirinhas nos aeroportos orientando os aviões, me mandava atravessar. Não sei como consegui, mas o Manoelito transpôs aquele obstáculo, mesmo que as madeiras rangessem mais que cachorro bravo.

A Dona Irene, toda molhada por conta da chuva, abriu a porta e voltou a se sentar ao meu lado e me deu um doce beijo na boca. Nem sei se aquela pinguela tinha nome, mas ela a batizou de Ponte do Adeus.

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*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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