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Du e Dan indicam a Foca caminho sem trevas na Zona da Mata nordestina

Os textos de Du e Dan são firmes e brilhantes como um vermelho ressecado à luz do sol ou de uma lâmpada. Os dois costumam acompanhar os escritos do Foca, um repórter que alimenta um velho sonho de ser cronista. Há momentos, porém, em que descem do telhado e se posicionam sobre o teclado do Notebook. Ansiosos, tentam direcionar o melhor roteiro para as palavras que estão prestes a surgir.

São morcegos, tataranetos do Conde Drácula, que têm a literatura como seu melhor alimento. Se dependesse deles, o Foca escreveria como Bram Stoker, o primeiro grande romancista a apresentar em minúcias a história de um centenário personagem mais encantador do que assustador; um lorde gótico que sempre ressurge em diferentes e inovadoras versões cinematográficas.

A cena se desenrola em uma velha casa de engenho nas profundezas da Zona da Mata nordestina. O teto sem forro é habitado por aranhas que tecem suas teias com a velocidade do vento que uiva lá fora como lobos anunciando uma tempestade. O ar opaco transporta o cheiro da madeira úmida e do passado enterrado nas paredes descascadas. O ranger das estruturas ecoa pela noite, como se a habitação sussurrasse segredos que ninguém mais deveria ouvir.

Mas o Foca resiste. Sua escrita é menos sombria, mais errante, como um viajante que percorre becos escuros sem um mapa. Du e Dan se impacientam. Planam sobre a tela, projetando sombras de asas longas e desiguais. O Foca sente a presença dos dois e, por vezes, se deixa seduzir pela promessa de um texto mais compacto, mais penetrante. A atmosfera de sua crônica se adensa, o teclado ganha um ritmo febril, as palavras escorrem como vinho denso, derramado por um copo trincado.

As paredes ao redor rangem. Não se sabe se pelo vento noturno ou por uma vontade oculta que se arrasta entre as fendas. O Foca não olha para trás. Sabe que Du e Dan estão lá, observando. Testemunhas e coautores, eles sugerem descrições que lembram castelos em ruínas, salões de veludo puído, olhos que brilham na penumbra. O cronista hesita. Deveria seguir por esse caminho? As últimas palavras estão presas na garganta, como se temessem atravessar o umbral da consciência.

Então, Du e Dan sibilam. Pequenos estalos ecoam pelo cômodo. Uma gota de tinta invisível pinga sobre a tela, e o Foca sente um calafrio que lhe percorre a espinha. Ele entrega-se. Permite que seus dedos dancem sobre o teclado em um frenesi inesperado. O texto ganha vida própria. Não mais uma simples crônica, mas um relicário de sombras e segredos. Algo que pulsa entre os parágrafos, algo que respira nas entrelinhas.

Quando a última palavra é digitada, o silêncio cai como um manto. Du e Dan observam, satisfeitos. Recolhem suas asas e voltam para a escuridão do teto, onde descansam à espera de um novo texto, de uma nova noite, de um novo chamado. O Foca olha para a tela. Não reconhece inteiramente o que escreveu. Mas sente que algo mudou. Talvez, desta vez, tenha finalmente tocado as sombras certas.

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José Seabra é diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras

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Esse presunçoso projeto de crônica foi inspirado em Eduardo Martínez e Daniel Marchi, editores do nosso Café Literário, e a dois mamíferos da ordem Chiroptera, que costumam visitar-me sempre que o sol se esconde lá para os lados do Sertão.

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