Parceiros de inúmeras caçadas noturnas, aqueles dois felinos, barrigas devidamente forradas com dois graúdos ratos, faziam a mais que merecida sesta debruçados sobre o telhado de uma das casas da região.
— Você viu?
— O quê?
— Ih, já vi que tá comendo mosca.
— E eu lá sou gato de comer mosca, Frodo?
— Anúbis!
— Hum. Pelo que me recordo, aquela sua dona só te chamava de Frodo.
— Nunca tive dona. Sou das ruas, Farofinha.
— Que mané Farofinha! Amon!
— Hum. Ué, mas e aquele gordão do boteco da esquina?
— O que tem ele?
— Só ouço o gordão falando: “Cadê o meu Farofinha?”
— Ele é um bobalhão. Nem desconfia que fui eu que comi o canário dele. Até hoje o sujeito fica assobiando na vã esperança de um dia o bicho voltar.
— Hum.
— Que foi, Anúbis?
— Tava gostoso?
— O canário?
— É.
— Muita pena e pouca carne. Nem deu pro cheiro.
Os dois voltaram a olhar a rua. Nenhuma palavra, até que o silêncio foi interrompido por uma voz conhecida.
— Frodo! Frodo! Froooooodoooooo! Cadê você, meu fofinho?
Era a moradora da casa da esquina. Nisso, os dois gatos se encararam por um instante, até que Anúbis se espreguiçou e saiu se equilibrando pela mureta até ganhar a calçada. Se ele olhasse para trás, perceberia o sorriso sarcástico do amigo.
Amon ficou por ali por mais algum tempo, até que começou a se sentir entediado. Bocejou, espreguiçou-se e, num salto elástico, chegou à calçada. Caminhou em direção oposta à do amigo até se esbarrar nas pernas do dono do boteco.
— Farofinha, seu danado! Por onde tem andado? Vem cá, que tenho uma sardinha pra você, meu moleque.
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