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Eleitor deve fechar os olhos a marketing, bestas e empáfia

De volta às origens, aos costumes e aos fatos que não saem da cabeça de quem vive a menos de quatro quilômetros da Praça dos Três Poderes, sou instado por um de meus parcos leitores que, após anos de relativa tranquilidade econômica, entramos em “recessão técnica”, com dois trimestres seguidos de retração. E o que diz o superministro da Economia, o popular “Posto Ipiranga”? Nada de proveitoso. Apenas desculpas esfarrapadas e mentirosas. A última delas é que a projeção dos analistas é exagerada e que a subida em “V” já aconteceu. Que raio é esse de V”? Conforme meu “seguidor”, o trapalhão adorado pelo mercado deve estar tentando justificar as razões pelas quais não consegue evitar ser reconhecido nas ruas, aeroportos e afins como o maior mico que o mito já produziu em dois anos e 11 meses de governo.

Aliás, por falar no mito, que é de barro, reitero que o respeito pelo ser humano não me impede de abominar o contraditório e insosso político, tampouco de lamentar sua imerecida e vacilante ascensão. Também não me acho impedido de afirmar que qualquer um dos nomes postos à mesa da disputa pela Presidência da República é melhor, tem mais cacife e muito mais preparo do que ele. Divididos, talvez a maioria não disponha de votos suficientes para calar o fanatismo dos que se mantêm fiéis ao bolsonarismo, especialmente os que batem ponto no cercadinho do Palácio da Alvorada. Nesse caso, sobrariam, além do próprio presidente, o ex-presidente Luiz Inácio e provavelmente o ex-juiz Sérgio Moro na briga pelo segundo turno, que é a eleição de fato.

A menos de um ano da eleição presidencial, a realidade que se apresenta não é nada alvissareira para os jardins e aposentos palacianos. Dia a dia, Luiz Inácio amplia sua já consolidada vantagem e Moro se fortalece no terceiro lugar, tirando votos do governador João Dória, do ex-ministro Ciro Gomes e do próprio Bolsonaro. Ou seja, não será nenhuma assombração o surgimento no segundo turno de alguém de fora da fermentada polarização. Por enquanto, a busca de Moro pelo principal cargo do país está limitada ao discurso anticorrupção. Tudo é parte de um marketing planejado por quem sabe que sua única chance é abrir espaços na direita festiva e na ultradireita raivosa, segmentos que foram determinantes para a vitória de Jair Bolsonaro em 2018.

O magistrado que um dia foi ministro e acabou condenado pelo Supremo Tribunal Federal virou profissional. Luiz Inácio nada de braçada e sem coletes salva-vidas no caudaloso rio da política nacional. Até alcançar o mar, as ondas certamente aumentarão de tamanho. As pesquisas de intenção de votos são pra lá d vantajosas, mas ainda não são definitivas. Diz um velho novo ditado que o jogo só termina quando acaba. E é verdade. Já vi grandes escretes e políticos renomados perderem a partida e as eleições nos acréscimos da prorrogação. Alguns chegaram a erguer a taça de campeão ou sentar-se na cadeira de eleito.

Tudo é possível, mas parece improvável na disputa que se avizinha. Luiz Inácio pode não ser o candidato dos sonhos de muitos eleitores que não engoliram alguns desatinos recentes da turma de vermelho. No entanto, é o que de melhor se apresenta na luta da esperança contra o ódio que se instalou no bananal denominado república. Somente ser for eleito é que saberemos se ele será melhor do que foi um dia. Sérgio Moro é uma incógnita. Ouço sempre que, como juiz, ele foi um “ótimo” ministro. Ilustrando a piada, vale registrar que, na ausência de um governo sério, o mais reles opositor acaba aparecendo como paladino da moralidade. Ainda longe de se mostrar como curinga no baralho eleitoral, Moro vai usar o combate à corrupção como mantra no rádio e na televisão.

Como no Brasil se compra do Pão de Açúcar ao Cristo Redentor, pode ser que funcione. De qualquer maneira, não podemos negar que o ex-juiz talvez seja hoje a maior aposta do bolsonarismo revoltado e decepcionado com as movimentações político-ideológicas do mito. Esse expressivo grupo menos beligerante resolveu mudar, a começar pela reação ao rótulo de gado. Sobre Jair Bolsonaro, o Brasil já sabe tudo e mais um pouco. Seja lá quem for, particularmente deverei optar pelo postulante com votos suficientes para vencer o marketing da seriedade e derrubar a arrogância do mito e a empáfia de seus seguidores.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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