Muitas perguntas, poucas respostas
Empresas livram a cara com ações antirracismo
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emHá uma desconexão entre o que está acontecendo neste momento. Na esteira da morte de João Alberto Silveira Freitas, a fabricante de bebidas Ambev cobra o Carrefour por “medidas imediatas e efetivas” dando o pontapé inicial para as empresas transformarem o anti-racismo em um exercício de relações públicas.
Pessoal, essa mensagem de apoio da Ambev está mais próxima da obrigação do que do compromisso de conduzir qualquer mudança significativa.
Caso contrário, eles podem ter pensado em pelo menos garantir que essa mensagem parecesse diferente. Na pressa de mostrar que não são silenciosas sobre o racismo, fatalmente algumas empresas oportunistas irão começar a encher os feeds sociais com os mesmos chavões de “pensamentos e orações” em preto e branco que se fundirão em uma bolha amorfa.
Certo, algumas dessas mensagens de marca que irão aparecer são mais ponderadas do que outras, mas, no final das contas, todas dizem a mesma coisa da mesma maneira. É essa ignorância dos efeitos do racismo que faz as mensagens de muitas dessas empresas parecerem vazias.
Para empresas que pensam em lucrar e se alinharam com a cultura negra, seu público está observando como eles lidam com essa situação.
Precisamos ir além das declarações de ‘ficar com você’, que só ganham nos círculos de marketing, para uma ação tangível e significativa para pessoas de cor. Algumas marcas e categorias não têm uma conexão tradicional com a cultura negra ou seu público não é predominantemente composta por pessoas de cor.
No mínimo, esses são os comparadores que deveriam educar suas audiências sobre a realidade do privilégio branco, em vez de divulgar declarações genéricas ou não dizer nada.
As empresas também estão pensando em longo prazo como ação de curto prazo e se mostrando um verdadeiro aliado da causa. No entanto, o ativismo não é exaustivo e há mais maneiras pelas quais elas podem continuar a ajudar nessa luta. Me permitam descortinar mais sobre esse tema, no qual, escrevendo esse artigo nesse sábado, me deparo constantemente, colado por mim desde ontem na tela do meu computador essa citação:
“Eu sou apenas um; mas ainda sou um. Não posso fazer tudo; mas ainda posso fazer algo; e porque não posso fazer tudo, não me recusarei a fazer o que posso fazer.” Edward Everett Hale,
Essa citação adquiriu um novo significado para mim nas últimas horas. E tenho me perguntado:
O que posso fazer?
O que todos os CEOs podem fazer?
Que ações podemos realizar?
Enfrentar o racismo estrutural no Brasil e em outras partes do mundo requer muito mais do que uma promessa, preencher um cheque ou emitir uma declaração. Isso é um começo, mas realmente requer compreensão, empatia, honestidade, amor, e então ação.
Como todos vocês, estou profundamente entristecido pela morte brutal de João Alberto Silveira Freitas. Meu coração está com todos da raça negra durante esses tempos intermináveis, especialmente aqueles que experimentaram pessoalmente a desigualdade racial em suas próprias vidas e na vida de suas famílias e amigos.
Durante minha carreira profissional incentivei projetos de diversidade e Inclusão nas empresas sobre como impulsionar mudanças positivas. E colegas de trabalho compartilharam histórias pessoais de enfrentamento do racismo em suas vidas.
Dor, raiva, frustração, cansaço …. Essas palavras foram ditas repetidamente por meus colegas na ocasião. Achei comovente ouvir essas histórias da experiência negra, sabendo que colegas com quem trabalhei de perto e suas famílias continuavam a encontrar racismo, preconceito, medo e injustiça.
Na época tive que me perguntar: o que posso fazer como líder?
Afinal, a liderança inspira outras pessoas a acreditar e permite que essa crença se torne realidade. Liderança nunca é sobre você, mas começa com você, e você nunca pode melhorar uma equipe ou uma organização a menos que primeiro melhore a si mesmo.
Pessoal, o enfrentamento do racismo estrutural não pode ser terceirizado ou delegado. Essa mudança deve partir de cima, com comprometimento e intencionalidade. Uma vez que os líderes tornem seguro para os outros falarem, as ideias de como afetar a mudança borbulharão de dentro. Mas então a mudança e a ação devem ser conduzidas de cima para baixo.
Ninguém, creio eu, nasce para odiar. Em vez disso, acho que é exatamente o oposto; nascemos para amar. Mas com o tempo, podem se formar preconceitos, até mesmo inconscientemente. Ninguém quer admitir isso, mas todo mundo tem preconceitos em algum grau. A menos que tomemos consciência e tenhamos coragem de enfrentar nossos preconceitos, correremos o risco de ficar em silêncio e perpetuar o problema. Este é um momento de honestidade e ação.
Aqui estão alguns pensamentos imperfeitos de um CEO imperfeito, que talvez eu possa ter sido:
Tudo começa com você. Meu pensamento continua a evoluir, mesmo a partir do que pensei três semanas atrás. A menos que os líderes empresariais tornem isso pessoal, a mudança não acontecerá. Os líderes têm voz, plataforma e influência para iniciar o tipo de diálogo que leva a mudanças significativas. O racismo estrutural é um dos problemas mais complicados e complexos imagináveis, mas ainda requer um plano de ação que começa com compromisso e ação de cima.
Revisite o propósito que vem a seguir. Para cada um de nós, isso significa a citação: “O propósito da vida é uma vida com propósito”. Para as organizações, é:
Por que existimos?
Por que estamos nesse negócio?
Coloque os valores em ação, eles precisam guiar cada decisão e nosso comportamento, em especial quando ninguém está olhando. O problema, entretanto, é que as pessoas muitas vezes não têm clareza sobre os valores, eles são iguais à missão, ao propósito, à cultura.
Lembro-me de participar de uma reunião do conselho de uma empresa em que um executivo sênior foi convidado a explicar os valores de sua empresa, e ele não conseguiu. Os valores não são apenas palavras; eles são a base de uma organização. Hoje apresenta uma oportunidade perfeita para reavaliar como os valores e propósito ganham vida em uma organização.
Pise no vidro, a diferença entre escutar e ouvir é a compreensão. Precisamos ser vulneráveis e empáticos. Não reaja apenas à emoção das palavras, concentre-se, em vez disso, em compreender e dominar o contexto e a intenção por trás delas. O fato é que, quando se trata de conversas sobre raça, as pessoas sentem que estão pisando em vidro. Minha opinião é que o vidro já foi quebrado, então pise nele e converse diretamente. Se suas intenções forem boas e você quiser causar um impacto positivo, mesmo que não use a palavra certa, confie que os outros irão corrigi-lo, e aceite esse feedback quando o fizerem. Melhor dizer algo e correr o risco de errar do que calar, o que implica cumplicidade.
Ouça com empatia, a ação começa com empatia um pelo outro e por nossas experiências.
Conectar, começa com nossas redes e vidas pessoais. Pergunte a si mesmo, quem são nossos amigos?
Quem são as pessoas em nosso círculo de interação e apoio?
Contratar, desenvolver, promover, patrocinar. Não é nenhum segredo o que ajudará a melhorar a igualdade de gênero e igualdade racial na força de trabalho. Para líderes de cor em particular, o que é necessário são mais funções operacionais de P&L. Ninguém conhece seu verdadeiro potencial, entretanto, a menos que tenham oportunidades.
Temos controle sobre quem contratamos, quem desenvolvemos e quem promovemos. Para fornecer igualdade de oportunidades, os líderes devem ativar o patrocínio real e tangível. Patrocinadores são diferentes de mentores, que são mais bem vistos como alguém que leva os outros sob suas asas e os ajuda a aprender. Patrocinadores são alguém de alto escalão na organização que pode defender outras pessoas para explicar por que essa pessoa deve ser a pessoa que recebe a designação ou promoção.
Enfim, para onde quer que olhemos, há perguntas, mas poucas respostas. No entanto, sabemos que falar não resolverá nada sem ação. Isso nos traz de volta à linha final da citação de Hale, ou seja:
Não vou me recusar a fazer o que posso fazer.
Há algo que podemos fazer?
Pense nisso.