Já foi lá?
Entra ano, sai ano, Feira de Caruaru ainda tem muito de tudo (e isso desde 1800)

Era ainda madrugada quando o sol decidiu espreguiçar-se por trás dos morros do Agreste. O galo cantava com o peito estufado, mas em Caruaru, naquela hora, já tinha gente acordada fazia tempo. A feira, meu amigo, não espera por ninguém.
Na beira da BR, o vai e vem de caminhões já anunciava que era dia de feira! E não era uma feira qualquer. Era a Feira de Caruaru, essa mesma que Luiz Gonzaga cantou e o povo nunca esqueceu. Ali, entre barracas de lona colorida, cheiro de tempero, café fresco e forró saindo das caixas de som, começava neste fim de semana mais um espetáculo nordestino.
Dona Mariquinha, com seu vestido florido e sorriso fácil, ajeitava seus queijos coalhos como quem organiza joias raras. “É de Garanhuns!”, dizia orgulhosa. Uns metros adiante, seu Zé do Couro fazia bainha em um chapéu de vaqueiro, enquanto contava vantagem de quando era rapaz e vendia mais que três feirantes juntos. Era mentira, claro, mas em feira vale mais a lábia que a conta.
E tinha de tudo, viu? De tudo mesmo. Roupas, ferramentas, discos de vinil, redes, brinquedos de madeira, ervas pra dor de cabeça e até simpatia pra arrumar casamento. Se não achou o que queria, é porque não procurou direito.
A feira de Caruaru é mais que comércio. É memória viva, é conversa boa, é o retrato falado do Nordeste. Surgiu devagarinho, lá no século XVIII, quando a vila ainda era pequena e o povo se juntava pra trocar o que tinha e contar causos. Cresceu com o tempo, ganhou fama, virou orgulho. Hoje, é patrimônio, é tradição, é poesia com cheiro de bode assado.
E quem pisa lá pela primeira vez, sai com alma lavada e coração remexido, como quem reencontra um pedaço perdido de si mesmo.
No fim do dia, quando o sol já despencava cansado, os feirantes começavam a guardar os trens, as conversas iam murchando, mas o espírito da feira continuava ali — pulsando entre os paralelepípedos, no batuque de um triângulo distante, no calor humano que só o povo nordestino sabe oferecer.
E assim segue a Feira de Caruaru: feita de gente, de suor, de sonho — e de uma alegria que não se vende, mas se compartilha.
